SlideShare a Scribd company logo
1 of 3
Download to read offline
http://www.mikesfractals.fsnet.co.uk/cactus%20flower.jpg



Cacto de Fl or Enc arnada vers us Espírito de ser Benfi quista


“Benfica , Campeão! Vivó Benfica! O Benfi ca é o mai or! Vamos todos ao Marquês!”


Não fui, mas tenho pena! G ostari a de ter tido a coragem de ir para a r ua ness a noite, c om os meus dois fil hos pela mão!


Meu pai, Benfi quista, logo tel efonou aos netos todos, finalmente celebrando, c om enorme alegria, a conquista do título de C ampeão!
Não per de r elato. Sempre preferiu ouvir os “GOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOLLLOOOO
DO BENFFFICAAAAAAAHHHHHHH!!!!!!!!!!” no rádio despertador colocado estratégicamente ao lado da cabeceir a, sempre pr onto a
ecoar pela c asa toda. Par a el e, ver a “B ol a” na televisão não é a mesma c oisa: perde-se a magia, para não fal ar da emoç ão. Ganha
outr a express ão o alí vio dos nerv os entesados dos maus passes ou de bol as per didas por cima da trav e, especialmente quando o golo
frustrado é dos “outr os”…Do fundo dos pul mões, o ar s ai libertado pel o sus piro, retido por aqueles i nstantes de incerteza agoniante.


Não basta ver o gol o, há que ouvir alguém libertar a “l adai nha” intermi nável de palavras, umas atr ás das outr as, em cascata,
construí do fr ases que relatam acontecimentos numa sucess ão em crescendo de nomes de estrel as do clube do cor ação, dando conta de
todos os pass es, que quanto mais inesperados, mais ins pirado e aceler ado o discurso sai. O clímax s urge com a bol a entr ar, ou melhor
quando “encontra o caminho par a o fundo da r ede da bali za da equi pa advers ária, descrevendo um arco i nacreditavel mente
espectacular !” Gol os assim vividos, é outr a loiça!


Melhor, só no Estádio da Luz! Aquilo é que é! O meu pai nunca s e esquecer á da única vez que lá foi na companhi a de um jov em amigo
benfiquista, de lug ar cativo. Impressionou-o o voo alto, sobr anc eiro e maj estos o, da Águia descrev endo o tradicional arc o em espiral
sobre as bancadas cor escarlate! Verde, só o relvado viçoso. Bandeiras ondulantes, cortando o vento pela força de braç os ritmados e
pelo bater de palmas e vozes uníssonas. Nesse dia, o cheiro de vi tórias ganhou intensi dade e fulgor, com o s oar do apito fi nal.


Ultimamente tem sido muitas as vezes que tem ido à Luz, mas do outr o lado da segunda circular. Deitado na cama articul ada do
hos pital ( da Luz) ol ha pela vidr aça g enerosa vislumbrando os arcos e treliças da estrutur a metálica encar nada. Voltam as memórias
que guar da do dia em que entr ou no Estádi o, assim como as emoções vividas à cabeceira da cama, no conforto do lar e na companhia
do r ádi o despertador . Invade-o, i nevitavel mente, o s entimento de orgulho, fazendo-o por ins tantes, esquecer a raz ão de estar ali,
naquele lug ar.


Pouc os dias antes, deitado noutr a cama articulada, mas na unidade de cuidados intensivos, ligado à vida por emaranhado de fi os e ao
som de múltiplos bips dos monitor es debi tando s em interr upç ão, dados de números , gráficos e luzes multicolores avisadores, em
permanente alerta, ainda meio anestesiado… mais do que o resultado da intervenç ão cirúrgica a que ti nha sido submeti do, queria
saber se nessa noite já se podi a comemor ar. “Traz-me o meu telemóv el e liga-me o rádio! Não se pode? Mas eu pr eciso de s aber a
quantos ficamos!“ Não soube, que ness a noite, o resultado s eria de mão chei a. Mas a festa fic aria remeti da par a a s emana s eg uinte, e
a certez a definitiv a do títul o adiada.


Passada ess a semana intermináv el, felizmente de regr esso à cabeceir a, apes ar de corpo debilitado, voltou de alma fortal ecida,
ganhando ainda mai or fôlego com a conquista do tão ansiado momento. A reboque da eufori a, o seu es pírito ganhador amar rou-o
novamente à vida. Hoje, esperançadamente em estado “rec uperado”, v ai afiando as facas par a os novos duelos que se aproximam…


Sonho em ir com ele à bol a. Talvez numa tarde de Domingo, de cachecol aos ombros, vibrar com os golos, suspirar com ele de alívio
com as defes as dos g uar diões e voltar par a casa de “papo chei o”. Quem sabe s e no final do campeonato, não irei buscá-l o a casa,
resgatando-o à ditadura das pantufas e do r ádi o mal sintonizado, par a ir dar umas valentes buzi nadel as, Av. da Liber dade acima até ao
Marquês.


Na noite em que o B enfica voltou a sagr ar-se Campeão, os onze anos do meu David, i nscrito como s ócio do clube de Alval ade desde os
três dias de idade por um tio fervoros o adepto, fizer am trans bor dar dos seus ensonados olhos, grossas lágrimas de chor o compul sivo.
Nessa noite quis mudar de clube! Queri a poder partilhar, como o primo Rui Miguel, a al egria eufórica do avô Américo. Enquanto se
esforç ava por adormecer ao som das buzinadelas persistentes que se ouvi am pel as ruas e avenidas da cidade, apenas pode adivinhar a
folia e sonhar com a festa até ao nascer do Sol.


A minha Mari ana, com os seus quas e dez anos, quando jog a é par a ganhar! Para el a, a per dedor es resta pouco cons olo e,
solidari amente c ontr ariada, acha que nunca irá celebrar ao “Mar quês”, mas lá s e vai r esignando um pouco c ontr afeita, mas
contagiando-se pel as alegrias do avô. Desconcertantemente pr agmática, pergunta:
- Ó mãe, não se pode ser do Benfica e do Sporti ng ao mesmo tempo?
Levantando pesar osamente a c abeça da fr onha ensopada, responde o irmão, de voz impaciente:
- Ó Mariana, cl aro que não! Par a o avô ficar feliz, o ti o Dudu fica zangado! É el e que paga as cotas!
A hor a tar dia; desperta-me de volta à r otina: é hora de pôr fim àquela tr agédi a greg a!
- Mas nós é que pagamos as favas! Amanhã é di a de trabal ho! Toca a dormir! Até amanhã! Good night, sleep well! Desligo as luz es!


A minha Mariana l ogo adormeceu, por que j á percebe que os s eus pequenos amigos “Lampiões ” deliciam-se ainda mais em celebrar suas
vitórias quando ela s e apr esenta como “Lagarta”. Log o se lançam na sua conquista, tentando ang ariar mai s um adepto; aliciando com
vitórias certas, clamando pel as suas mag nitudes. Pequena sedutor a, nega o inter esse, mantendo picardias aces as fazendo s ubir a
fasquia, mas o quanto baste, deixando-se, aos pouc os seduzir, em segredo, a ning uém c onfessado, pelo clube ganhador …


Estes meus lindos Sporti nguistas ( de costel as Benfi quistas ) fazem de mim uma ave “r ara”, bastante exótica; fr equentemente
depenada de emoç ões , mas com garr as bem afiadas e cor ação de leão…Do alto do ninho, dou r ugidos! Mas sorrateiros…


Ao meu David restará o ensinamento de um taxista de convicções pr ofundas, que certo di a me levou do Campo Pequeno ao Alto d a
Faia. Indicando-l he o meu destino, digo “…i r pela Padr e Cruz e a seguir ao Estádio do Sporti ng , virar par a Telheir as…Já não ouviu mais
nada! C om a r eferência ao Clube de Alvalade, a conv ersa foi dar invariavelmente no mesmo…Os taxistas s ão todos Benfiquistas ?! Pelo
menos, eu nunc a enc ontr ei um que não tiv esse essa condiç ão “desde que nasc eu, até morrer!”. Fico sempr e a saber por quem s ofrem
ao pass ar ao lado do Alvaláxia. N ão r esistem a partilhar o s eu amor à camis ola. Eis o que nessa tarde tive a oportunidade de regi star:


- Coitados …Como é possível viver nesta miséria… Isto não se faz a ning uém!...Sabe, não l hes foi dado a escol her ; mal nascem
inscrevem-nos log o como s ócios! Não se faz! Um homem tem de poder escolher o s eu clube, porque pode-se mudar-se de emprego,
carro, cas a, mulher e até r eligião, mas de fi lhos e clube, nunca. É par a a vida toda! (lembrei-me logo do meu David).
- Veja bem o s ofrimento em que andam es tes coitados…E mais, se o B enfic a não for este ano campeão, alguma c oisa vai ter de mudar;
como não posso mudar de clube… Olhe…lá terá de ser outr a coisa! Mudo de vida! Mudo de cas a! Mudo de carro! E já agor a de mulher !
Clube é que não!”
Interrompo por breves instantes seu discur so infl amado: “Parece-me que este ano ess e problema não s e vai pôr, não é?” Não tar dou a
resposta pronta:


- Ah pois não! A noss a economia pr ecisa que o Benfica g anhe! A ndamos todos mais c ontentes, as noss as mulher es mais satis feitas, os
noss os filhos mais tranquilos, os trabal hadores trabal ham com mais força, os patr ões contam mais lucros, os jornais vendem-se mais,
vendem-se mais televisões, vende-s e mai s cerveja, há mais empregos! E portanto os cofres do Estado ficam mais recheados e os
políticos chateiam menos! É uma alegria pegada! Portugal e o Mundo precisam que o Benfica ganhe! Mas, não se eng ane! Há lug ar para
todos nesta alegria, neste Portugal Benfi quista , neste Benfica Portug uês! N ós aqui na capital precisamos uns dos outros : quando uns
ficam madr ugada for a a comemor ar as vitórias, a cidade no di a segui nte não pode par ar… tem haver “s angue v erde” para manter a
máquina, não sei se me entende?! A ntes verde do que azul! E viva ó Benfica! Ora j á cá cheg amos, são então € 5,50 …Deseja recibo?
Muito obrigado e continuação de uma muito boa tar de!


Foi quanto me custou este el ucidar do v er dadeir o espírito do B enfica. T alvez este ano volte a s er campeão! Oxalá que sim! A nossa
economia precisa! Mas desta vez não s eria melhor ir forr ando o “Mar quês” de uma rel vinha viços a de fácil manutenção, em vez de um
lindo ros eiral …As últi mas lindas ros eiras floridas que lá estiver em, ag uar dav am apr umadas a vinda do Papa Bento, mas nem mesmo
com espinhos sobrevi veram à noite histórica de comemoraç ão do títul o. Desta vez por que não recorr er a flores mais persistentes;
talvez uns cactos mai s robustos …de fl or encarnada cl aro!

More Related Content

What's hot

Capítulo do Livro Escrito na Cal
Capítulo do Livro Escrito na CalCapítulo do Livro Escrito na Cal
Capítulo do Livro Escrito na CalJosé Movilha
 
20 músicas-fáceis-para-cavaquinho
20 músicas-fáceis-para-cavaquinho20 músicas-fáceis-para-cavaquinho
20 músicas-fáceis-para-cavaquinhoSaulo Gomes
 
Meu avô e eu _Livro ampliado para aluna baixa visão
Meu avô e eu _Livro ampliado para aluna baixa visãoMeu avô e eu _Livro ampliado para aluna baixa visão
Meu avô e eu _Livro ampliado para aluna baixa visãoIsa ...
 
Fabula Distinta 8524
Fabula Distinta 8524Fabula Distinta 8524
Fabula Distinta 8524VVCX
 

What's hot (11)

Dois dedos de leitura
Dois dedos de leituraDois dedos de leitura
Dois dedos de leitura
 
Vergonha ..
Vergonha ..Vergonha ..
Vergonha ..
 
Capítulo do Livro Escrito na Cal
Capítulo do Livro Escrito na CalCapítulo do Livro Escrito na Cal
Capítulo do Livro Escrito na Cal
 
Gauchos
GauchosGauchos
Gauchos
 
Texto saltimbancos
Texto saltimbancosTexto saltimbancos
Texto saltimbancos
 
Vergonha que nao tenho
Vergonha que nao tenhoVergonha que nao tenho
Vergonha que nao tenho
 
Sapeca 6
Sapeca 6Sapeca 6
Sapeca 6
 
20 músicas-fáceis-para-cavaquinho
20 músicas-fáceis-para-cavaquinho20 músicas-fáceis-para-cavaquinho
20 músicas-fáceis-para-cavaquinho
 
Meu avô e eu _Livro ampliado para aluna baixa visão
Meu avô e eu _Livro ampliado para aluna baixa visãoMeu avô e eu _Livro ampliado para aluna baixa visão
Meu avô e eu _Livro ampliado para aluna baixa visão
 
Fabula Distinta 8524
Fabula Distinta 8524Fabula Distinta 8524
Fabula Distinta 8524
 
Fabula distinta
Fabula distintaFabula distinta
Fabula distinta
 

Viewers also liked

Presentation to San Francisco Executives Association - Double Your Sales Leads
Presentation to San Francisco Executives Association - Double Your Sales LeadsPresentation to San Francisco Executives Association - Double Your Sales Leads
Presentation to San Francisco Executives Association - Double Your Sales LeadsZoom Industries
 
Presentation To San Francisco Executives Association 4 8 2011 Double Your Sal...
Presentation To San Francisco Executives Association 4 8 2011 Double Your Sal...Presentation To San Francisco Executives Association 4 8 2011 Double Your Sal...
Presentation To San Francisco Executives Association 4 8 2011 Double Your Sal...Zoom Industries
 
EMMF - Sean campbell Competitive Intelligence presentation
EMMF - Sean campbell   Competitive Intelligence presentationEMMF - Sean campbell   Competitive Intelligence presentation
EMMF - Sean campbell Competitive Intelligence presentationZoom Industries
 
How Competitive Sales Battlecards and Silver Bullets Open the Door to Strateg...
How Competitive Sales Battlecards and Silver Bullets Open the Door to Strateg...How Competitive Sales Battlecards and Silver Bullets Open the Door to Strateg...
How Competitive Sales Battlecards and Silver Bullets Open the Door to Strateg...IntelCollab.com
 
How Competitive Rumors and Customer Insights Empower the Sales Force to Grow ...
How Competitive Rumors and Customer Insights Empower the Sales Force to Grow ...How Competitive Rumors and Customer Insights Empower the Sales Force to Grow ...
How Competitive Rumors and Customer Insights Empower the Sales Force to Grow ...IntelCollab.com
 

Viewers also liked (6)

Double Your Sales
Double Your Sales Double Your Sales
Double Your Sales
 
Presentation to San Francisco Executives Association - Double Your Sales Leads
Presentation to San Francisco Executives Association - Double Your Sales LeadsPresentation to San Francisco Executives Association - Double Your Sales Leads
Presentation to San Francisco Executives Association - Double Your Sales Leads
 
Presentation To San Francisco Executives Association 4 8 2011 Double Your Sal...
Presentation To San Francisco Executives Association 4 8 2011 Double Your Sal...Presentation To San Francisco Executives Association 4 8 2011 Double Your Sal...
Presentation To San Francisco Executives Association 4 8 2011 Double Your Sal...
 
EMMF - Sean campbell Competitive Intelligence presentation
EMMF - Sean campbell   Competitive Intelligence presentationEMMF - Sean campbell   Competitive Intelligence presentation
EMMF - Sean campbell Competitive Intelligence presentation
 
How Competitive Sales Battlecards and Silver Bullets Open the Door to Strateg...
How Competitive Sales Battlecards and Silver Bullets Open the Door to Strateg...How Competitive Sales Battlecards and Silver Bullets Open the Door to Strateg...
How Competitive Sales Battlecards and Silver Bullets Open the Door to Strateg...
 
How Competitive Rumors and Customer Insights Empower the Sales Force to Grow ...
How Competitive Rumors and Customer Insights Empower the Sales Force to Grow ...How Competitive Rumors and Customer Insights Empower the Sales Force to Grow ...
How Competitive Rumors and Customer Insights Empower the Sales Force to Grow ...
 

Similar to Treinador da Bancada

185254030 poesia-completa-manoel-de-barros (1)
185254030 poesia-completa-manoel-de-barros (1)185254030 poesia-completa-manoel-de-barros (1)
185254030 poesia-completa-manoel-de-barros (1)Airton Ferreira
 
LETRAS TAQUARENSES Nº 61 NOV/DEZ 2014 * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ
LETRAS TAQUARENSES Nº 61 NOV/DEZ 2014 * ANTONIO CABRAL FILHO - RJLETRAS TAQUARENSES Nº 61 NOV/DEZ 2014 * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ
LETRAS TAQUARENSES Nº 61 NOV/DEZ 2014 * ANTONIO CABRAL FILHO - RJAntonio Cabral Filho
 
Sou nordestina
Sou nordestinaSou nordestina
Sou nordestinaJose Rosa
 
A ceia-dos-mortos-salma-ferraz
A ceia-dos-mortos-salma-ferrazA ceia-dos-mortos-salma-ferraz
A ceia-dos-mortos-salma-ferrazLRede
 
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da PaixãoCenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixãowiyofog561
 
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da PaixãoCenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixãowiyofog561
 
Homenagem aos Gaúchos de Todas as Querências
Homenagem aos Gaúchos de Todas as QuerênciasHomenagem aos Gaúchos de Todas as Querências
Homenagem aos Gaúchos de Todas as QuerênciasEliazer Kosciuk
 
Slide aniversário de recife
Slide   aniversário de recifeSlide   aniversário de recife
Slide aniversário de recifeSandra Cavalcanti
 
Livro de contos e orações do meu avô
Livro de contos e orações do meu avôLivro de contos e orações do meu avô
Livro de contos e orações do meu avôRafael F. Buzon
 
Caderno poemas 7_8_e_9_ano
Caderno poemas 7_8_e_9_anoCaderno poemas 7_8_e_9_ano
Caderno poemas 7_8_e_9_anoAELPB
 
Folhetim Literário Desiderata n. 4 - Saudade
Folhetim Literário Desiderata n. 4  - SaudadeFolhetim Literário Desiderata n. 4  - Saudade
Folhetim Literário Desiderata n. 4 - SaudadeJosé Feldman
 
Poemas de gregório de matos guerra
Poemas de gregório de matos guerraPoemas de gregório de matos guerra
Poemas de gregório de matos guerraagnes2012
 
20120803 caderno poemas_ciclo_3
20120803 caderno poemas_ciclo_320120803 caderno poemas_ciclo_3
20120803 caderno poemas_ciclo_3bib2009
 
20120803 caderno poemas ciclo 3
20120803 caderno poemas ciclo 320120803 caderno poemas ciclo 3
20120803 caderno poemas ciclo 3crepalmela
 
Caderno poemas 7_8_e_9_ano
Caderno poemas 7_8_e_9_anoCaderno poemas 7_8_e_9_ano
Caderno poemas 7_8_e_9_anogracatremoco45
 

Similar to Treinador da Bancada (20)

Legenda Gianni Schicchi
Legenda Gianni SchicchiLegenda Gianni Schicchi
Legenda Gianni Schicchi
 
185254030 poesia-completa-manoel-de-barros (1)
185254030 poesia-completa-manoel-de-barros (1)185254030 poesia-completa-manoel-de-barros (1)
185254030 poesia-completa-manoel-de-barros (1)
 
LETRAS TAQUARENSES Nº 61 NOV/DEZ 2014 * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ
LETRAS TAQUARENSES Nº 61 NOV/DEZ 2014 * ANTONIO CABRAL FILHO - RJLETRAS TAQUARENSES Nº 61 NOV/DEZ 2014 * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ
LETRAS TAQUARENSES Nº 61 NOV/DEZ 2014 * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ
 
Sou nordestina
Sou nordestinaSou nordestina
Sou nordestina
 
A ceia-dos-mortos-salma-ferraz
A ceia-dos-mortos-salma-ferrazA ceia-dos-mortos-salma-ferraz
A ceia-dos-mortos-salma-ferraz
 
Poetas da I República
Poetas da I RepúblicaPoetas da I República
Poetas da I República
 
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da PaixãoCenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
 
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da PaixãoCenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
Cenas da Escravidão - Rodolfo Gustavo da Paixão - Rodolpho Gustavo da Paixão
 
Homenagem aos Gaúchos de Todas as Querências
Homenagem aos Gaúchos de Todas as QuerênciasHomenagem aos Gaúchos de Todas as Querências
Homenagem aos Gaúchos de Todas as Querências
 
Desgarrada em 2006
Desgarrada em 2006Desgarrada em 2006
Desgarrada em 2006
 
Slide aniversário de recife
Slide   aniversário de recifeSlide   aniversário de recife
Slide aniversário de recife
 
Livro de contos e orações do meu avô
Livro de contos e orações do meu avôLivro de contos e orações do meu avô
Livro de contos e orações do meu avô
 
Caderno poemas 7_8_e_9_ano
Caderno poemas 7_8_e_9_anoCaderno poemas 7_8_e_9_ano
Caderno poemas 7_8_e_9_ano
 
Folhetim Literário Desiderata n. 4 - Saudade
Folhetim Literário Desiderata n. 4  - SaudadeFolhetim Literário Desiderata n. 4  - Saudade
Folhetim Literário Desiderata n. 4 - Saudade
 
Poemas de gregório de matos guerra
Poemas de gregório de matos guerraPoemas de gregório de matos guerra
Poemas de gregório de matos guerra
 
20120803 caderno poemas_ciclo_3
20120803 caderno poemas_ciclo_320120803 caderno poemas_ciclo_3
20120803 caderno poemas_ciclo_3
 
20120803 caderno poemas ciclo 3
20120803 caderno poemas ciclo 320120803 caderno poemas ciclo 3
20120803 caderno poemas ciclo 3
 
Caderno poemas português
Caderno poemas portuguêsCaderno poemas português
Caderno poemas português
 
IEL- Caderno de Poemas 7º, 8º e 9º anos
IEL- Caderno de Poemas 7º, 8º e 9º anosIEL- Caderno de Poemas 7º, 8º e 9º anos
IEL- Caderno de Poemas 7º, 8º e 9º anos
 
Caderno poemas 7_8_e_9_ano
Caderno poemas 7_8_e_9_anoCaderno poemas 7_8_e_9_ano
Caderno poemas 7_8_e_9_ano
 

Treinador da Bancada

  • 1. http://www.mikesfractals.fsnet.co.uk/cactus%20flower.jpg Cacto de Fl or Enc arnada vers us Espírito de ser Benfi quista “Benfica , Campeão! Vivó Benfica! O Benfi ca é o mai or! Vamos todos ao Marquês!” Não fui, mas tenho pena! G ostari a de ter tido a coragem de ir para a r ua ness a noite, c om os meus dois fil hos pela mão! Meu pai, Benfi quista, logo tel efonou aos netos todos, finalmente celebrando, c om enorme alegria, a conquista do título de C ampeão! Não per de r elato. Sempre preferiu ouvir os “GOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOLLLOOOO DO BENFFFICAAAAAAAHHHHHHH!!!!!!!!!!” no rádio despertador colocado estratégicamente ao lado da cabeceir a, sempre pr onto a ecoar pela c asa toda. Par a el e, ver a “B ol a” na televisão não é a mesma c oisa: perde-se a magia, para não fal ar da emoç ão. Ganha outr a express ão o alí vio dos nerv os entesados dos maus passes ou de bol as per didas por cima da trav e, especialmente quando o golo frustrado é dos “outr os”…Do fundo dos pul mões, o ar s ai libertado pel o sus piro, retido por aqueles i nstantes de incerteza agoniante. Não basta ver o gol o, há que ouvir alguém libertar a “l adai nha” intermi nável de palavras, umas atr ás das outr as, em cascata, construí do fr ases que relatam acontecimentos numa sucess ão em crescendo de nomes de estrel as do clube do cor ação, dando conta de todos os pass es, que quanto mais inesperados, mais ins pirado e aceler ado o discurso sai. O clímax s urge com a bol a entr ar, ou melhor quando “encontra o caminho par a o fundo da r ede da bali za da equi pa advers ária, descrevendo um arco i nacreditavel mente espectacular !” Gol os assim vividos, é outr a loiça! Melhor, só no Estádio da Luz! Aquilo é que é! O meu pai nunca s e esquecer á da única vez que lá foi na companhi a de um jov em amigo benfiquista, de lug ar cativo. Impressionou-o o voo alto, sobr anc eiro e maj estos o, da Águia descrev endo o tradicional arc o em espiral sobre as bancadas cor escarlate! Verde, só o relvado viçoso. Bandeiras ondulantes, cortando o vento pela força de braç os ritmados e pelo bater de palmas e vozes uníssonas. Nesse dia, o cheiro de vi tórias ganhou intensi dade e fulgor, com o s oar do apito fi nal. Ultimamente tem sido muitas as vezes que tem ido à Luz, mas do outr o lado da segunda circular. Deitado na cama articul ada do hos pital ( da Luz) ol ha pela vidr aça g enerosa vislumbrando os arcos e treliças da estrutur a metálica encar nada. Voltam as memórias
  • 2. que guar da do dia em que entr ou no Estádi o, assim como as emoções vividas à cabeceira da cama, no conforto do lar e na companhia do r ádi o despertador . Invade-o, i nevitavel mente, o s entimento de orgulho, fazendo-o por ins tantes, esquecer a raz ão de estar ali, naquele lug ar. Pouc os dias antes, deitado noutr a cama articulada, mas na unidade de cuidados intensivos, ligado à vida por emaranhado de fi os e ao som de múltiplos bips dos monitor es debi tando s em interr upç ão, dados de números , gráficos e luzes multicolores avisadores, em permanente alerta, ainda meio anestesiado… mais do que o resultado da intervenç ão cirúrgica a que ti nha sido submeti do, queria saber se nessa noite já se podi a comemor ar. “Traz-me o meu telemóv el e liga-me o rádio! Não se pode? Mas eu pr eciso de s aber a quantos ficamos!“ Não soube, que ness a noite, o resultado s eria de mão chei a. Mas a festa fic aria remeti da par a a s emana s eg uinte, e a certez a definitiv a do títul o adiada. Passada ess a semana intermináv el, felizmente de regr esso à cabeceir a, apes ar de corpo debilitado, voltou de alma fortal ecida, ganhando ainda mai or fôlego com a conquista do tão ansiado momento. A reboque da eufori a, o seu es pírito ganhador amar rou-o novamente à vida. Hoje, esperançadamente em estado “rec uperado”, v ai afiando as facas par a os novos duelos que se aproximam… Sonho em ir com ele à bol a. Talvez numa tarde de Domingo, de cachecol aos ombros, vibrar com os golos, suspirar com ele de alívio com as defes as dos g uar diões e voltar par a casa de “papo chei o”. Quem sabe s e no final do campeonato, não irei buscá-l o a casa, resgatando-o à ditadura das pantufas e do r ádi o mal sintonizado, par a ir dar umas valentes buzi nadel as, Av. da Liber dade acima até ao Marquês. Na noite em que o B enfica voltou a sagr ar-se Campeão, os onze anos do meu David, i nscrito como s ócio do clube de Alval ade desde os três dias de idade por um tio fervoros o adepto, fizer am trans bor dar dos seus ensonados olhos, grossas lágrimas de chor o compul sivo. Nessa noite quis mudar de clube! Queri a poder partilhar, como o primo Rui Miguel, a al egria eufórica do avô Américo. Enquanto se esforç ava por adormecer ao som das buzinadelas persistentes que se ouvi am pel as ruas e avenidas da cidade, apenas pode adivinhar a folia e sonhar com a festa até ao nascer do Sol. A minha Mari ana, com os seus quas e dez anos, quando jog a é par a ganhar! Para el a, a per dedor es resta pouco cons olo e, solidari amente c ontr ariada, acha que nunca irá celebrar ao “Mar quês”, mas lá s e vai r esignando um pouco c ontr afeita, mas contagiando-se pel as alegrias do avô. Desconcertantemente pr agmática, pergunta: - Ó mãe, não se pode ser do Benfica e do Sporti ng ao mesmo tempo? Levantando pesar osamente a c abeça da fr onha ensopada, responde o irmão, de voz impaciente: - Ó Mariana, cl aro que não! Par a o avô ficar feliz, o ti o Dudu fica zangado! É el e que paga as cotas! A hor a tar dia; desperta-me de volta à r otina: é hora de pôr fim àquela tr agédi a greg a! - Mas nós é que pagamos as favas! Amanhã é di a de trabal ho! Toca a dormir! Até amanhã! Good night, sleep well! Desligo as luz es! A minha Mariana l ogo adormeceu, por que j á percebe que os s eus pequenos amigos “Lampiões ” deliciam-se ainda mais em celebrar suas vitórias quando ela s e apr esenta como “Lagarta”. Log o se lançam na sua conquista, tentando ang ariar mai s um adepto; aliciando com vitórias certas, clamando pel as suas mag nitudes. Pequena sedutor a, nega o inter esse, mantendo picardias aces as fazendo s ubir a fasquia, mas o quanto baste, deixando-se, aos pouc os seduzir, em segredo, a ning uém c onfessado, pelo clube ganhador … Estes meus lindos Sporti nguistas ( de costel as Benfi quistas ) fazem de mim uma ave “r ara”, bastante exótica; fr equentemente depenada de emoç ões , mas com garr as bem afiadas e cor ação de leão…Do alto do ninho, dou r ugidos! Mas sorrateiros… Ao meu David restará o ensinamento de um taxista de convicções pr ofundas, que certo di a me levou do Campo Pequeno ao Alto d a Faia. Indicando-l he o meu destino, digo “…i r pela Padr e Cruz e a seguir ao Estádio do Sporti ng , virar par a Telheir as…Já não ouviu mais nada! C om a r eferência ao Clube de Alvalade, a conv ersa foi dar invariavelmente no mesmo…Os taxistas s ão todos Benfiquistas ?! Pelo menos, eu nunc a enc ontr ei um que não tiv esse essa condiç ão “desde que nasc eu, até morrer!”. Fico sempr e a saber por quem s ofrem ao pass ar ao lado do Alvaláxia. N ão r esistem a partilhar o s eu amor à camis ola. Eis o que nessa tarde tive a oportunidade de regi star: - Coitados …Como é possível viver nesta miséria… Isto não se faz a ning uém!...Sabe, não l hes foi dado a escol her ; mal nascem inscrevem-nos log o como s ócios! Não se faz! Um homem tem de poder escolher o s eu clube, porque pode-se mudar-se de emprego, carro, cas a, mulher e até r eligião, mas de fi lhos e clube, nunca. É par a a vida toda! (lembrei-me logo do meu David). - Veja bem o s ofrimento em que andam es tes coitados…E mais, se o B enfic a não for este ano campeão, alguma c oisa vai ter de mudar; como não posso mudar de clube… Olhe…lá terá de ser outr a coisa! Mudo de vida! Mudo de cas a! Mudo de carro! E já agor a de mulher ! Clube é que não!”
  • 3. Interrompo por breves instantes seu discur so infl amado: “Parece-me que este ano ess e problema não s e vai pôr, não é?” Não tar dou a resposta pronta: - Ah pois não! A noss a economia pr ecisa que o Benfica g anhe! A ndamos todos mais c ontentes, as noss as mulher es mais satis feitas, os noss os filhos mais tranquilos, os trabal hadores trabal ham com mais força, os patr ões contam mais lucros, os jornais vendem-se mais, vendem-se mais televisões, vende-s e mai s cerveja, há mais empregos! E portanto os cofres do Estado ficam mais recheados e os políticos chateiam menos! É uma alegria pegada! Portugal e o Mundo precisam que o Benfica ganhe! Mas, não se eng ane! Há lug ar para todos nesta alegria, neste Portugal Benfi quista , neste Benfica Portug uês! N ós aqui na capital precisamos uns dos outros : quando uns ficam madr ugada for a a comemor ar as vitórias, a cidade no di a segui nte não pode par ar… tem haver “s angue v erde” para manter a máquina, não sei se me entende?! A ntes verde do que azul! E viva ó Benfica! Ora j á cá cheg amos, são então € 5,50 …Deseja recibo? Muito obrigado e continuação de uma muito boa tar de! Foi quanto me custou este el ucidar do v er dadeir o espírito do B enfica. T alvez este ano volte a s er campeão! Oxalá que sim! A nossa economia precisa! Mas desta vez não s eria melhor ir forr ando o “Mar quês” de uma rel vinha viços a de fácil manutenção, em vez de um lindo ros eiral …As últi mas lindas ros eiras floridas que lá estiver em, ag uar dav am apr umadas a vinda do Papa Bento, mas nem mesmo com espinhos sobrevi veram à noite histórica de comemoraç ão do títul o. Desta vez por que não recorr er a flores mais persistentes; talvez uns cactos mai s robustos …de fl or encarnada cl aro!