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FUNDAMENTOS E
 DIDÁTICA DA
ALFABETIZAÇÃO I




                  1
Fundamentos e                                                   SOMESB
     Didática da      Sociedade Mantenedora de Educação Superior da Bahia S/C Ltda.
 Alfabetização I


                                             Presidente ♦                      Gervásio Meneses de Oliveira
                                        Vice-Presidente ♦                      William Oliveira
             Superintendente Administrativo e Financeiro ♦                     Samuel Soares
          Superintendente de Ensino, Pesquisa e Extensão ♦                     Germano Tabacof
                     Superintendente de Desenvolvimento e>>
                                 Planejamento Acadêmico ♦ Pedro Daltro Gusmão da Silva

                                                                     FTC - EaD
                               Faculdade de Tecnologia e Ciências - Ensino a Distância
                                           Diretor Geral   ♦                   Waldeck Ornelas
                                    Diretor Acadêmico      ♦                   Roberto Frederico Merhy
                                 Diretor de Tecnologia     ♦                   Reinaldo de Oliveira Borba
                    Diretor Administrativo e Financeiro    ♦                   André portnoi
                                   Gerente Acadêmico       ♦                   Ronaldo Costa
                                    Gerente de Ensino      ♦                   Jane Freire
                       Gerente de Suporte Tecnológico      ♦                   Jean Carlo Nerone
                          Coord. de Softwares e Sistemas ♦                     Romulo Augusto Merhy
                   Coord. de Telecomunicações e Hardware ♦                     Osmane Chaves
                   Coord. de Produção de Material Didático ♦                   João Jacomel




                            EQUIPE DE ELABORAÇÃO/PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO:

                           ♦ PRODUÇÃO ACADÊMICA ♦
                           Gerente de Ensino ♦ Jane Freire
                           Autor (a) ♦ Maria das Graças Cardoso Moura
                           Supervisão ♦ Ana Paula Amorim
                           Coordenação de Curso ♦ Tatiane Lucena

                           ♦ PRODUÇÃO TÉCNICA ♦
                           Revisão Final ♦ Carlos Magno

                           Equipe ♦ Ana Carolina Alves, Cefas Gomes, Delmara Brito,
                           Ederson Paixão, Fabio Gonçalves, Francisco França Júnior,
                           Israel Dantas, Lucas do Vale e Marcus Bacelar
                           Editoração ♦ Fabio José Pereira Gonçalves
                           Ilustração ♦ Fabio José Pereira Gonçalves, Francisco
                           França Júnior
                           Imagens ♦ Corbis/Image100/Imagemsource


                                                         copyright    ©   FTC EaD
                                   Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/98.
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                                  da FTC EaD - Faculdade de Tecnologia e Ciências - Ensino a Distância.
                                                              www.ftc.br/ead




   2
Sumário

     AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO                                                                                                                                                                   ○           ○           ○       ○       ○       ○   ○   ○   07



     O ESTUDO DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS LINGÜÍSTICO,
     PSICOLÓGICO, PSICOLINGÜÍSTICO E SOCIAL

A Produção Social e a Caracterização da Língua Escrita                                                                                                                   ○       ○       ○       ○       ○           ○           ○           ○   ○       ○       ○   ○   ○   07

O Nosso Sistema de Escrita: sua Natureza e a Aquisição da Língua
Materna pela Criança ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○   ○       ○       ○       ○       ○           ○           ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○           ○       ○           ○       ○   ○       ○   ○   ○   11

Alfabetização e Letramento: Refletindo Conceitos                                                                     ○           ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○           ○           ○       ○       ○       ○   ○   ○   ○   13

Os Estudos de Emília Ferreiro: a Psicogênese da Língua Escrita                                                                                                                                                       ○           ○           ○       ○   ○       ○   ○   ○   15



     OS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: ANÁLISE NUMA PERSPECTIVA
     CRÍTICA E REFLEXIVA

(Re) visitando os Métodos de Alfabetização                                           ○       ○       ○       ○       ○               ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○           ○       ○           ○       ○       ○       ○   ○   ○   21

Método Sintético e Método Analítico: da Parte para o Todo                                                                                                                    ○       ○       ○       ○       ○           ○       ○           ○       ○   ○       ○   ○   ○   23

Estimulando a Compreensão da Base Alfabética                                                                 ○           ○           ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○           ○           ○           ○   ○       ○       ○   ○   ○   27

Por que as Crianças Trocam Letras ao Escrever?                                                                           ○           ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○           ○           ○           ○   ○       ○       ○   ○   ○   29




      ANÁLISE REFLEXIVA DA LEITURA, ESCRITA E
      CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO NO PROCESSO
      INICIAL DE ESCOLARIZAÇÃO: A ALFABETIZAÇÃO                                                                                                                                              ○       ○       ○           ○           ○       ○       ○       ○   ○   ○   ○   31


     PRÁTICAS DISCURSIVAS NAS CLASSES DE ALFABETIZAÇÃO

O Processo de Alfabetização: Apropriação de Muitas Linguagens                                                                                                                                                    ○           ○           ○       ○       ○       ○   ○   ○   31

Alfabetização e Produção de Textos: Construindo Saberes                                                                                                                                  ○       ○       ○           ○           ○           ○   ○       ○       ○   ○   ○   33




                                                                                                                                                                                                                                                                             3
A Escolha dos Textos para Classe de Alfabetização: a Pesquisa
                   do Professor        ○       ○       ○       ○       ○      35   ○       ○       ○       ○       ○       ○           ○       ○       ○           ○           ○           ○           ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○   ○       ○   ○       ○       ○   ○   ○   ○




Fundamentos e      O Universo da Sala de Aula de Alfabetização: o Ambiente
     Didática da   Alfabetizador       ○       ○       ○       ○       ○37     ○       ○       ○       ○       ○       ○           ○       ○       ○           ○           ○           ○           ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○   ○   ○       ○       ○   ○       ○   ○   ○   ○

 Alfabetização I


                        ATIVIDADES DIDÁTICO-PEDAGÓGICAS NA ALFABETIZAÇÃO:
                        ENSINAR A LER E A ESCREVER

                   Alfabetização: Pensando nos Textos de Uso Diário                                                                                                                                                                                                        ○       ○       ○       ○   ○   ○   ○   40

                   Sugestões Didáticas para Melhorar a Competência
                   Textual e a Expressão Oral: a Prática Pedagógica                                                                                                                                                                                                        ○       ○       ○       ○   ○   ○   ○   41

                   O Processo de Alfabetização e as Intervenções do
                   Professor: o Trabalho com a Produção de Texto Escrito                                                                                                                                                                                                                               ○       ○   42

                   Aprender a Gostar de Ler                                                            ○       ○           ○           ○       ○       ○           ○           ○           ○           ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○   ○   ○       ○       ○       ○   ○   ○   ○   48

                   Atividade Orientada                                             ○       ○       ○       ○       ○       ○           ○       ○           ○           ○           ○       ○           ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○   ○       ○       ○       ○   ○   ○   ○   ○   52

                   Glossário   ○   ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○           ○       ○       ○           ○           ○           ○           ○           ○           ○   ○       ○       ○       ○       ○       ○   ○       ○       ○       ○   ○   ○   ○   ○   57

                   Referências Bibliográficas                                                                          ○           ○       ○           ○           ○           ○           ○           ○           ○       ○       ○       ○       ○       ○       ○   ○   ○       ○       ○       ○   ○   ○   ○   58




   4
Apresentação da disciplina
             Caro (a) aluno (a):

                                                         “Quem me chamou,
                                                    Quem vai querer voltar pro ninho
                                                       Redescobrir seu lugar” 1

         É com satisfação que apresento este Módulo Impresso, acolhendo reflexões
voltadas para a disciplina Fundamentos e Didática da Alfabetização aos meus futuros
colegas de profissão, ávidos em “redescobrir seu lugar” na história da educação, nossa
história.
         Mudam os tempos, mudam as pessoas. Diversifica-se, também, o tipo de leitor
projetado pela sociedade e cultivado pela escola. Reconhece-se que até o final da Segunda
Guerra Mundial, mais da metade da população brasileira era não escolarizada (analfabeta)
e vivia predominantemente na zona rural. Estes cidadãos, embora não tivessem direito a
voto, apenas o fato de saber assinar o nome dava-lhe o direito de tirar o título de eleitor.
         A partir dos anos 50, observou-se o crescimento das taxas de urbanização e
industrialização, o que gerou aumento da matrícula de crianças nas escolas. No entanto,
os índices de analfabetismo permaneceram elevados, principalmente nas áreas rurais.
Ações do governo federal viabilizaram várias campanhas de alfabetização para crianças e
jovens adultos, cujo objetivo maior era simplesmente ensinar a decifrar palavras e frases
simples, mas a produção contínua de analfabetos, causada por sistemas escolares
inadequados e condições sociais de extrema desigualdade, não cessou. Onde fica, então,
o convite de reaprender a sonhar? Será que esta “história não tem fim?”
         Chegamos ao século XXI com cerca de vinte milhões de analfabetos. Outros
tantos cidadãos também são acolhidos neste número, aqueles que possuem apenas
rudimentos de leitura e escrita. É possível garantir que os trabalhadores que exercem as
funções mais modestas tenham condições de ler e entender avisos, ordens e instruções?
Quem se responsabiliza pelas funções qualificadas? Quem é o trabalhador capaz de usar
a leitura e a escrita para obter e transmitir informações, para comunicar-se, para registrar
fatos? Precisamos começar pela criança para que não tenhamos mais adultos nesta
situação.
         Alfabetizar uma criança só é possível quando o educador penetra em sua alma. E
a porta de entrada da alma da criança é a fantasia. É preciso desenvolver a pedagogia da
imaginação, possibilitando à criança o gosto de aprender através do “brincar de viver”.
         Eis, então, um convite para você, aluno (a): é preciso “reaprender a sonhar”,
acreditando em nossa capacidade de educar, de formar leitores críticos. Isto só é possível
quando ainda temos esperança, quando dizemos sim, “cada vez que o mundo diz não”.
         Seja bem vindo (a)! Os textos apresentados neste Material Impresso não podem
ser vistos como “Cartilha”: trata-se de um plano de trabalho que o (a) auxiliará a compreender
o processo de alfabetização, valorizando a experiência da criança, apresentando a leitura
e a escrita como práticas culturais cotidianas, processo que não pode ser mecânico.
         O que posso dizer para finalizar esta mensagem? Retornar para Guilherme Arantes
e lhe informar
                                                          “... Hoje eu sou feliz
                                                            E quero ver feliz
                                                         Quem andar comigo
                                                                   Vem!
                                                       Agora é brincar de viver...”


                                                               Professora Maria das Graças Cardoso Moura
  1
      Guilherme Arantes, Música Brincar de Viver.




                                                                                                           5
Fundamentos e
     Didática da
 Alfabetização I




   6
AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE
                                ALFABETIZAÇÃO

                  O ESTUDO DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS LINGÜÍSTICO,
                       PSICOLÓGICO, PSICOLINGÜÍSTICO E SOCIAL


      A Produção Social e a Caracterização da Língua Escrita

       Finalidade: compreender os aspectos básicos do sistema de escrita da língua
portuguesa relacionados à alfabetização, quais sejam: relação entre as letras e os sons da
fala e regularidades relacionadas à morfologia das palavras e as origens e convenções
ortográficas.


            A partir dos meados da década de 1980, a prática pedagógica na alfabetização
    sofreu a influência da abordagem construtivista na psicologia cognitiva. Informações acerca
    do desenvolvimento da língua escrita pela criança têm chegado aos professores
    alfabetizadores, deixando-os, muitas vezes, confusos e ansiosos em relação à sua própria
    prática. Será que não posso mais ensinar porque a criança e o jovem adulto têm condições
    de descobrirem a escrita sozinhos? Devo corrigir o aluno? Como planejar atividades para
    alfabetização? São comuns hoje entre os professores estes questionamentos. Neste texto,
    adaptado de Lúcia Lins Browne Rego (1998), partiremos da análise do conhecimento da
    Língua a ser compreendido pelo alfabetizando, considerando as pesquisas e experiências
    bem sucedidas sobre a construção da base alfabética e observando as suas implicações
    pedagógicas.




      Aspectos Lingüísticos

      Língua Escrita: Como Caracterizá-la?

      Para caracterizar a língua escrita, é necessário apontar três aspectos considerados
essenciais:
                           1º É preciso refletir sobre a natureza da Língua Portuguesa,
                   nosso sistema de escrita, isto é, o que representam as marcas
                   registradas no papel;
                           2º É necessário considerar que a língua escrita se manifesta
                   através de seus usos, envolvendo diferentes convenções lingüísticas.
                           3º É preciso compreender que a língua que lemos é diferente
                   daquela que ouvimos e falamos e temos que levar sempre em conta
                   um interlocutor ausente e, por vezes, imaginário.



      Vamos compreender cada um desses aspectos:



                                                                                                  7
A Natureza do Nosso Sistema de Escrita. Qual é?

Fundamentos e
     Didática da
 Alfabetização I




         É alfabética a nossa escrita, isto é: cada letra representa as unidades mínimas de
  som identificadas nas palavras. Por exemplo, para escrever a palavra “casa” precisamos
  de quatro letras porque nesta palavra são identificados quatro sons [k-a-z-a]. Hoje, para as
  pessoas alfabetizadas, tudo isso parece óbvio. No entanto, a história conta que foram
  necessários muitos anos para que surgisse na Grécia o sistema de escrita alfabética.
         Para entender em que consiste a natureza deste sistema de escrita, é necessário
  compará-lo a outros sistemas.
         Existia uma forma muito antiga de escrita cujos sinais gráficos representam objetos.
  A forma mais primitiva é a escrita pictográfica, ou seja, os caracteres são os pictogramas,
  espécies de desenhos dos objetos representados. Como exemplo, na antiga escrita egípcia,
  o pictograma para o peixe era o seguinte:




                                                Pictograma peixe




          A Língua Escrita Manifesta-se Através de Seus Usos

         É possível reconhecer na escrita acima o desenho do peixe, o que lhe poderia ser
  considerado universal. Este caráter universal da escrita pictográfica, no entanto, foi muito
  passageiro. Logo começaram a produzir sinais gráficos mais estabilizados e arbitrários
  que não tinham semelhança com o que se pretendia representar. Assim, surgiu as chamadas
  escritas ideográficas, isto é, representavam a idéia de quem queria registrar uma
  mensagem. Na medida em que os símbolos gráficos deixavam de ser uma imitação mais
  próxima do objeto representado, estes símbolos tornaram-se convenções. Na escrita egípcia
  convencionou-se, por exemplo, que peixe passaria a ser representado pelo seguinte
  ideograma:

                                                                   Ideograma
                                                                   egípcio do
                                                                   peixe




   8
É possível observar uma simplificação do traçado, tornando-se necessário pertencer
à cultura egípcia para saber o que esta representação visual significa.


                        Saiba mais...
                       Esta escrita ideográfica persiste até os
                 dias atuais entre chineses e japoneses.

        Nos dedicamos, até agora, aos sistemas de escrita que se preocuparam em registrar
o significado das palavras e não ao aspecto sonoro da mesma. O primeiro passo no sentido
de uma escrita representativa dos aspectos sonoros da palavra foi a utilização de ideogramas
ou logogramas com valor fonético. Se a escrita tivesse os seguintes ideogramas,




      poderíamos combiná-los para a escrita de uma terceira palavra:




        Observe que nessa combinação, estes ideogramas não estão representando
significados, mas dois segmentos sonoros dentro da palavra soldado. Partindo deste
enfoque (forma sonora das palavras) o homem inventou a escrita silábica.



                             ☺

                       A língua que lemos é diferente daquela que ouvimos e falamos

                                 Vimos que cada ideograma representa o valor sonoro da
                               consoante. Estes ideogramas correspondiam a significados
                               de palavras iniciadas com as consoantes cujos valores
                                sonoros passaram a representar. Desta escrita lexical/
                                 silábica dos egípcios, os fenícios, povo a que se atribui a
                                     origem do alfabeto, extraíram os símbolos que
                                     formaram um silabário constituído por grafias que
                                      correspondem às consoantes, cabendo aos gregos
                                      (herdeiros do alfabeto dos fenícios), introduzir,
                                     também, a representação das vogais.




                                                                                          9
Podemos afirmar que, numa escrita alfabética, as letras
                          representam as unidades mínimas da palavra, os FONEMAS. A palavra
                          “casa” que numa escrita silábica se comporia apenas de duas unidades
Fundamentos e             gráficas, numa escrita alfabética passa a possuir quatro.
     Didática da
 Alfabetização I
                       As escritas alfabéticas são complexas. A idéia de cada letra
                representando um determinado som sofre uma série de restrições ortográficas.
                Em muitos contextos, percebe-se que uma letra pode passar a adquirir um
  valor sonoro diferente.

                                        Saiba mais...
                                      Por exemplo, a letra “s” tem o valor sonoro
                               regularmente atribuído à letra “z” quando se encontra
                               entre duas vogais (a palavra “casa”). Para recuperar o
                               seu valor sonoro original, teríamos que utilizar a grafia
                               “ss”. Algumas pessoas não sabem quando devem usar
                               ç, ss, c ou sc para representar o som [s], a não ser que
                               estejam familiarizados com a grafia da palavra que
                               querem escrever.

         Pode-se concluir que a compreensão da natureza do sistema de escrita e o domínio
  da ortografia não constituem tarefas simples. Um sistema de escrita pode ser de diversas
  naturezas e estas formas de representação não são fiéis ao princípio que deu origem.


                    Para refletir...
               Após a leitura do texto, indique três (03) aspectos dos
         sistemas de escrita da Língua Portuguesa que você compreende
         que são importantes para o processo de alfabetização de crianças.
               _______________________________________________________________
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                   Para Ler e Compreender

                   Desenvolvimento da Língua Escrita2

                   Sabe-se, que para aprender a escrever, a criança terá de lidar com dois processos de
         aprendizagem paralelos: o da natureza do sistema de escrita da língua – o que a escrita
         representa e como – e o das características da linguagem que se usa para escrever. A
         aprendizagem da linguagem escrita está intrinsecamente associada ao contato com os textos
         diversos, para que as crianças possam construir sua capacidade de ler, e às práticas de
         escrita, para que possam desenvolver a capacidade de escrever autonomamente.
                   A observação e a análise das produções escritas das crianças revelam que elas
         tomam consciência, gradativamente, das características formais dessa linguagem. Constata-
         se que, desde muito pequenas, as crianças podem usar o lápis e o papel para imprimir
         marcas, imitando a escrita dos mais velhos, assim como utilizam-se de livros, revistas, jornais,
         gibis, rótulos etc. para “ler” o que está escrito. Não é raro observar-se crianças muito pequenos,
         que têm contato com material escrito, folhear um livro e emitir sons e fazer gestos como se
         estivesse lendo.

                                                                            2
                                                                              Texto extraído do RCN de Educação
                                                                            Infantil. Volume 3.



   10
Com base nestas informações, que tipo de atividade você
      considera adequada para alfabetizar crianças? Cite duas e justifique
      a sua resposta.
            _______________________________________________________________
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     O Nosso Sistema de Escrita: sua Natureza e a Aquisição da
Língua Materna pela Criança

      Finalidade: Compreender a natureza do sistema de escrita da Língua Portuguesa e
como a criança em processo alfabetizatório entende esta língua.

       Aspecto Psicolingüístico

       Os Sistemas de Escrita surgiram para servir a um objetivo específico: o de preservar
informações relativas à agricultura e ao comércio das sociedades primitivas. Nas sociedades
modernas, os usos da língua escrita se multiplicaram, tornando-se um
meio essencial de acumulação e de transmissão de informações e de
conhecimentos, desempenhando um papel central no processo de
educação formal do indivíduo.
       O homem é envolvido por uma escrita que serve a uma
multiplicidade de propósitos e que tem o seu léxico e a sua
estrutura gramatical afetados pelos fins a que serve e as
pessoas a que se destina. O estilo de um texto escrito muda em
função dos usos sociais que envolvem a língua escrita.



           Escrevemos uma carta e uma receita do mesmo jeito? Como escrevemos uma carta?
   Apresentamo-nos a uma pessoa específica, iniciando o texto com uma data, saudando a
   pessoa a quem destinamos a mensagem. Depois, relatamos as nossas notícias para, por
   fim, apresentamos as despedidas. Não podemos deixar de nos identificar.
           Como escrevemos uma receita? Começamos indicando o nome do prato, e não há
   menção ao destinatário da mensagem. Depois, enumeremos os ingredientes para, ao final,
   explicar o modo de fazer. Usamos a pessoa verbal “eu” neste tipo de texto? Não. Uma
   carta, no entanto, quando se destina a uma pessoa íntima, será escrita de maneira informal,
   mas se o destinatário é alguém que ocupa algum cargo importante, é preciso selecionar
   um estilo mais formal de escrita.




       Conclui-se que, se a língua escrita varia em função dos seus usos, de sua finalidade
e da pessoa a que se destina, então o domínio da língua escrita, por parte de um determinado
indivíduo, ser social, refletirá sempre as experiências deste indivíduo com o meio específico
de comunicação próprio da sociedade em que se vive.



                                                                                                 11
Observando situações de fala e escrita de um mesmo texto, é possível
                 verificar suas diferenças. Nestas situações tornam-se mais salientes aquelas
                 diferenças que resultam das distinções entre a modalidade oral e a escrita.
Fundamentos e Veja, por exemplo, uma história contada e observe a sua versão escrita,
     Didática da comparando-as. Esta história de Chapeuzinho Vermelho foi contada por uma
 Alfabetização I professora aos seus alunos:



                 “Era uma vez, assim vai começar a linda historinha que eu
          agora vou contar...
                 Era uma vez uma menina linda de olhos bem grandes e azuis.
          O nome dela era Chapeuzinho Vermelho. Bonito nome, não é? Vocês
          conhecem alguém que tenha este nome? Chapeuzinho tinha família,
          morava numa casa que ficava bem no meio da floresta.... Ela tinha
          pai, mãe, avó. Ela era muito pobre, e ajudava muito sua mãe em
          casa. Quem ajuda a mamãe em casa aqui? Pois é, aí esta menina
          ajudava... ela era muito boazinha e obediente. Um dia, quando seu
          pai saiu para caçar, a mãe chamou: Chapeuzinho? ...Por que será
          que ela tinha este nome? Será que era porque usava um capuz azul?
          Mas olhem... ela tem um chapeuzinho vermelho em sua cabeça... aí
          a mãe disse para ela: Chapeuzinho... vá na casa de sua vovó levar
          esta cesta com bastante comida porque ela está doente e não pode
          fazer nada para comer.”.




                        As expressões que identifiquem a presença do interlocutor como
                     “né” e “não é” marcam a presença da oralidade nesta história. Pode-se
                        salientar, ainda, a forma como os enunciados são fragmentados
                          através das pausas assinaladas no texto pelas reticências e através
                           das interrupções que mostram o curso do pensamento,
                            demonstrando que está em construção, em ação. Veja a repetição,
                             a redundância, recursos lexicais como “tá” em vez de “está” e o
                              uso do “aí”. São traços característicos de um texto produzido
                               oralmente na presença de um interlocutor, marcas eliminadas
                                quando o texto é escrito, que pressupõe um interlocutor ausente.
                                 O texto escrito é um texto mais cuidadoso do ponto de vista
                                 gramatical.
                                      O mesmo conteúdo transmitido no trecho acima, se
                              apresentado por escrito, teria a seguinte característica:

                                        Era uma vez uma menina tão doce e meiga que todos
                                gostavam dela. A avó, então, a adorava, e não sabia mais que
                                presente dar a criança para agradá-la. Um dia ela presenteou-a
                                com um chapeuzinho de veludo vermelho. O chapeuzinho agradou
                                tanto a menina e ficou tão bem nela, que ela queria ficar com ele
                                o tempo todo. Por causa disso, ficou conhecida como Chapeuzinho
                                Vermelho.


                                             A versão escrita do trecho da história de
                                Chapeuzinho Vermelho tem uma outra organização gramatical:
                              as interrupções e as repetições desnecessárias foram
                             eliminadas; os marcadores da presença do interlocutor e uso



  12
de palavras como “tá” e “aí” também desapareceram, dando lugar a um outro estilo de
linguagem.
       Não fizemos uma análise completa das diferenças existentes entre escrita e fala,
mas esperamos que tenha sido suficiente para você se dar conta de que a passagem da
oralidade para a escrita é uma tarefa complexa que envolve três aspectos fundamentais:

      1) a compreensão da natureza do nosso sistema de escrita;
      2) o entendimento da funcionalidade do sistema de escrita;
      3) a aquisição de um novo estilo de linguagem.



        Para refletir...
       Na Antiguidade grega, berço de alguns dos mais importantes textos
produzidos pela humanidade, o autor era quem compunha e ditava para ser
escrito pelo escriba; a colaboração do escriba era transformar os enunciados
em marcas gráficas que lhes davam a permanência, uma tarefa menor, e
esses artífices pouco contribuíram para a grandeza da filosofia ou do teatro
grego.
       A compreensão atual da relação entre a aquisição das capacidades de
redigir e grafar rompe com a crença arraigada de que o domínio do bê-á-bá
seja pré-requisito para o início do ensino de língua e nos mostra que esses
dois processos de aprendizagem podem e devem ocorrer de forma simultânea.
Um diz respeito à aprendizagem da escrita alfabética e o outro se refere à
aprendizagem da linguagem que se usa para escrever.
       Você concorda com esta afirmação? Que relação você estabelece com
este texto adaptado do PCN de Língua Portuguesa: Ensino de primeira à quarta
série (1999), e o texto do Conteúdo 2, A natureza do nosso sistema de escrita e a
aquisição da língua materna pela criança?

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      Alfabetização e Letramento: Refletindo Conceitos

      A ALFABETIZAÇÃO pode ser entendida:

                     1. Como um processo de aquisição individual de habilidades
              requeridas para a leitura e escrita;
                     2. Como um processo de representação de objetos diversos, de
              naturezas diferentes.


       A perspectiva é que a alfabetização é algo que chega a um fim, e pode, portanto, ser
descrita sob a forma de objetivos instrucionais.



                                                                                        13
O LETRAMENTO pode ser entendido:

                                 1. Como o ato de ler e escrever que deve começar
Fundamentos e                    a partir de uma compreensão muito abrangente do ato de ler o
     Didática da          mundo, coisa que os seres humanos fazem antes de ler a palavra. Até
 Alfabetização I          mesmo historicamente, os seres humanos primeiro mudaram o mundo,
                          depois revelaram o mundo e, a seguir, escreveram as palavras.
                                 2. Como um fenômeno de cunho social, salientando as
                          características sócio-históricas ao se adquirir um sistema de escrita
                          por um grupo social. Ele é o resultado da ação de ensinar e/ou de
                          aprender a ler e escrever, e denota estado ou condição em que um
                          indivíduo ou sociedade obtém como resultado de ter-se “apoderado”
                          de um sistema de grafia.


          Letramento é um fenômeno de cunho social e salienta as características sócio-
  históricas ao se adquirir um sistema de escrita por um grupo social. Ele é o resultado da
  ação de ensinar e/ou de aprender a ler e escrever, denota estado ou condição em que um
  indivíduo ou sociedade obtém como resultado de ter-se “apoderado” de um sistema de
  grafia.
                        Saiba mais...
                          A língua escrita é um sistema de
                    relações, com dois processos:
                           ler e escrever.
                          Na aprendizagem destes processos, a
                    criança percorre longo caminho, passando
                    por estágios evolutivos de elaboração,
                    descritos por Ferreiro e Teberosky (1991).

         O sucesso na alfabetização exige a
  transformação da escola em “ambiente
  alfabetizador”, rico em estímulos que provoquem
  atos de leitura e escrita, permitam compreender o
  funcionamento da língua escrita, possibilitem a
  apropriação de seu uso social e forneçam
  elementos que desafiam o sujeito a pensar sobre
  a língua escrita.



                   Dicas para construir uma situação significativa de aprendizagem
            nas classes de letramento:

                    1) investigar as práticas sociais que fazem parte do cotidiano da criança,
            adequando-as à sala de aula e aos conteúdos a serem trabalhados;
                    2) planejar suas ações visando ensinar para que serve a linguagem
            escrita e como a criança poderá utilizá-la;
                    3) desenvolver junto à criança, através da leitura, interpretação e
            produção de diferentes gêneros de textos, habilidades de leitura e escrita que
            funcionem dentro da sociedade;
                    4) incentivar a criança a praticar socialmente a leitura e a escrita, de
            forma criativa, descobridora, crítica, autônoma e ativa, já que a linguagem é




   14
interação e, como tal, requer a participação transformadora dos sujeitos sociais
          que a utilizam;
                  5) recognição, por parte do educador, implicando, assim, o
          reconhecimento daquilo que o educando já possui de conhecimento empírico,
          e respeitar, acima de tudo, esse conhecimento;
                  6) não ser julgativo, mas desenvolver uma metodologia avaliativa com
          certa sensibilidade, atentando-se para a pluralidade de vozes, a variedade
          de discursos e linguagens diferentes;
                  7) avaliar de forma individual, levando em consideração as
          peculiaridades de cada indivíduo;
                  8) trabalhar a percepção de seu próprio valor e promover a auto-estima
          e a alegria de conviver e cooperar;
                  9) ativar mais do que o intelecto em um ambiente de aprendizagem,
          ser professor-aprendiz tanto quanto os seus educandos;
                  10) reconhecer a importância do letramento, e abandonar os métodos
          de aprendizado repetitivo, baseados na descontextualização.

       As investigações no campo da psicologia e da psicolingüística têm contribuído para
demonstrar que a criança é um ser que pensa e que constrói ativamente o seu conhecimento
do mundo e da língua. Pode-se destacar que uma das contribuições mais importantes que
a pesquisa nesta área tem oferecido ao educador consiste em indicar os estágios
percorridos pela criança e as hipóteses que formula antes de atingir a concepção que o
adulto tem do mundo de objetos que o rodeiam.


       Os Estudos de Emília Ferreiro: a Psicogênese da Língua Escrita

       Aspectos Psicolingüístico, Psicológico e Social


       Na década de 80, a pesquisadora argentina Emília Ferreiro
contribuiu para que ocorresse o avanço científico no que diz respeito
à compreensão do processo de aquisição de escritas alfabéticas
pelas crianças, tomando por base os estudos desenvolvidos por
Jean Piaget. Ferreiro demonstrou, de forma contundente, que
as crianças constroem várias concepções de escrita antes
de atingirem a compreensão do adulto já alfabetizado acerca
do nosso sistema de escrita, comprovando que existem
formas simples de identificarmos as idéias da criança sobre
a escrita, necessitando, para tanto, interpretar os “erros” que
elas costumam fazer quando escrevem e lêem.
                                                                                Emília Ferreiro




             Saiba mais...
                No primeiro ano escolar, Emília Ferreiro identificou
          marcas da língua compreendida pela criança da seguinte
          forma: o primeiro “problema” que a criança precisa resolver
          ao ser apresentada ao nosso sistema é o de diferenciar a
          escrita do desenho, pois, para a criança, escrever e desenhar
          são semelhantes, para ela os objetos podem ser
          representados através do desenho. Veja a semelhança das
          escritas mais antigas (pictográficas), que utilizava como



                                                                                                  15
símbolos gráficos o desenho e a escrita da criança
                         que também considera a idéia de que podemos
                         “escrever desenhando”. O exemplo abaixo ilustra
Fundamentos e            como uma criança escreveu as palavras que foram
     Didática da         ditadas para ela:3
 Alfabetização I
                                                                          Escrita do nome da
                                                                          criança




                                                Escrita da palavra
                                                “bola”




         Para que a criança entenda a natureza da escrita alfabética, ela precisa compreender
  para que escrevemos e como utilizamos as letras. Usar letras significa que a criança entendeu
  o que elas letras representam? Claro que não!
         Segundo Rego (1996), as crianças consideram que para uma escrever uma palavra
  cuja imagem é grande, como “elefante”, é preciso escrever uma porção de letras porque o
  elefante é um animal grande. Já a palavra “formiga”, escrevem com poucas letras, já que a
  formiga é bem pequenininha. Este processo é chamado de Realismo Nominal( a criança vê
  o objeto e não a sua representação gráfica).Também nesta fase, a criança pensa em escrever
  palavras que significam coisas diferentes com números e combinações de letras
  diversificadas. A criança, do seu jeito, usa os aspectos formais da escrita, ou seja, busca a
  quantidade e a variedade de letras para mudar o significado sem se preocupar com a
  relação existente entre as letras e os aspectos sonoros das palavras. Nos dois exemplos
  seguintes estão caracterizados os recursos utilizados pela criança durante esta fase:

                           12CSHJR (escrita do nome próprio: ao diferenciar
                   letra de número, utiliza quantas letras achar necessário para
                   escrever, sem preocupação com a sua pauta sonora)

                                                             Utiliza desenhos ou
                                                      rabiscos, também chamados
                                                      de garatujas




                                                                             A criança, quando
                                                                      começa a compreender
                                                                      que a escrita busca
                                                                     relação com a seqüência
                                                                     de sons da fala, inicia-se
                                                       no estágio que Ferreiro concluiu como
                                                   o de fonetização da escrita. O que significa
  fonetizar a escrita? A fonetização da escrita começa de forma processual, quando a evolução
  da escrita da criança chega ao momento em que a quantidade de letras que ela utiliza para
  cada palavra coincide, sistematicamente, com o número de sílabas da palavra. A criança,
  nesta fase, pode escrever palavras com correspondências quantitativas e qualitativas. É
  quantitativa quando a criança utiliza o número de letras correspondentes ao número de

                                                                     3
                                                                      REGO, L. L. B. (1988)
                                                                     A Literatura Infantil: Uma Nova
                                                                     Perspectiva da Alfabetização a Pré-
                                                                     Escola, São Paulo: FTD
   16
sílabas de cada palavra (Silábico quantitativo
                                             ou sem valor sonoro). É qualitativa quando usa
                                             uma letra para cada sílaba, com
                                             correspondência sonora (silábico qualitativo ou
                                             com valor sonoro).
                                                    O que estas escritas silábicas significam,
                                             segundo Emília Ferreiro? Representam a
                                             mudança, a evolução da concepção que a
                                             criança tem em relação à escrita: concebe a
                                             escrita como representando sílabas.


                  MAO – para macaco (silábico qualitativo
          ou silábico com valor sonoro)
                  OEI – para macaco (silábico quantitativo
          ou silábico sem valor sonoro)




       Saiba mais...
         Vale lembrar que o alfabeto teve origem na
    invenção do silabário e é importante destacar que
    sobrevivem os sistemas de escrita silábico como, por
    exemplo, a escrita dos japoneses.

       Compreender a natureza alfabética do nosso
sistema de escrita envolve diversos aspectos. Entender
que apenas usa-se apenas uma letra para representar
cada sílaba não é suficiente. Esta compreensão acontece
gradualmente e na evolução da fase silábica para a fase
alfabética, a criança produz uma escrita ainda estranha
para os adultos, incompleta, pois ela é parte alfabética e
parte silábica como no exemplo abaixo:

                 PANLA (para panela)




                                                               BNCA ( para boneca)

        A pesquisa de Ferreiro e colaboradores contribuiu para compreender que as escritas
infantis compreendidas como indicadoras de “patologia”, são etapas de um processo
evolutivo próprio de cada criança, até conseguirem entender como funciona o nosso sistema
alfabético de escrita.


                                                                                           17
Fundamentos e                          Atenção!
     Didática da                       É preciso interpretar esse desenvolvimento da
 Alfabetização I                mesma forma que incentivamos e interpretamos as
                                primeiras tentativas das crianças quando começam a falar:
                                “aga”, ao invés de água; “mamã”, ao invés de mamãe etc.
                                Esta forma é aceita em determinada fases do
                                desenvolvimento da linguagem. Por que não compreender
                                que a escrita envolve também fase de desenvolvimento?



         O processo de desenvolvimento da escrita não se encerra com a compreensão de
  que a escrita alfabética representa as unidades mínimas de sons de uma palavra. Quando
  a criança escreve alfabeticamente, inicialmente, ela ainda comete muitos “erros” ortográficos,
  uma vez que escreve como fala e ignora todas as regras convencionais de uma suposta
  regularidade alfabética. Erros como “tumati” para a palavra “tomate” em crianças recém
  alfabetizadas demonstram que ainda desconhecem o princípio ortográfico segundo o qual
  “o” átono final tem som de “i”. Pode omitir, também, o “n” em palavras como “canto”, “tanto”
  e escrever “cato”, “tato”. Neste caso, ela atribui ao “n” apenas o valor sonoro que tem ao
  preceder a vogal (natal). Também escreve “sangue” como “sange”. Isso acontece porque a
  criança regulariza o princípio alfabético e ignora todas as regras que determinam exceções.


                   Saiba mais...
               Não é de se estranhar que a criança
         assim proceda, pois, enquanto ser
         pensante, ela busca gerar hipóteses
         para resolver seus problemas,
         mesmo que estas venham
         posteriormente        a    serem
         contrariadas pelos fatos. Se uma
         criança aprendesse a ler e a
         escrever        simplesmente
         memorizando a grafia de cada
         palavra, estes erros, que são muito
         freqüentes nas escritas iniciais das
         crianças, não ocorreriam. É preciso que
         o professor aprenda a perceber a
         lógica que está por trás do erro. O
         professor que percebe esta lógica
         começa a criar condições de desafios
         e de atividades de sala de aula que
         levem a criança a compreender os
         princípios que regem a nossa
         ortografia alfabética.




   18
Questão                    1
                                       [ ]    Agora é hora de
                                              TRABALHAR


          Um Novo ABC

        “... a preguiça é a chave da pobreza”, afirmava-se ali. Que
espécie de chave seria aquela? Aos 6 anos, eu e os meus companheiros
de infelicidade escolar, quase todos pobres, não conhecíamos a pobreza
pelo nome e tínhamos poucas chaves, de gavetas, de armários e de
portas. Chave de pobreza para uma criança de 6 anos é terrível.” 4

       Graciliano Ramos refere-se ao processo de alfabetização.
A partir dos textos lidos, qual a concepção que você tem sobre a
“chave” para abrir a porta do processo de reconhecimento da
palavra escrita na alfabetização?


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      4
       RAMOS, Gracilinao. Um novo ABC.
      In: Linhas Tortas. São Paulo: Martins
      Fontes, 1962.                                                       19
Fundamentos e
                         Questão       2
     Didática da           Nossas escolas, hoje, estão, de fato, alfabetizando ou letrando?
 Alfabetização I   Justifique a sua resposta.

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          Questão         3
          Escreva V para a alternativa verdadeira e F para a falsa:

        a) ( ) A escrita e a leitura são práticas sociais em que as crianças, ao imitarem os
  adultos, fazem uso dessa prática. Isto recebe o nome de letramento, ao contrário da
  alfabetização, que corresponde à aquisição da língua escrita de modo mecânico,
  desconsiderando as práticas sociais das quais os alunos fazem parte.

        b) ( ) Não estão em jogo, no processo de letramento, os conhecimentos relacionados
  ao uso e função da língua escrita.




   20
OS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: ANÁLISE
                           NUMA PERSPECTIVA CRÍTICA E REFLEXIVA




      (Re)visitando os Métodos de Alfabetização

       Finalidade: Relacionar as diversas concepções e métodos de alfabetização aos
seus pressupostos, aprofundando o conhecimento sobre a natureza das atividades de
alfabetização pautadas na reflexão sobre a língua e sobre propostas metodológicas de
resolução de problemas.

      Como você aprendeu a ler? Foi difícil? Lembra da professora? Lembra da cartilha?


          Saiba mais...
          Ana Maria Machado, em suas memórias, conta
    que aprendeu a ler muito cedo, decifrando jornais, com
    a ajuda de algum adulto que lhe ensinava os sons das
    letras, sem muita sistematização. Ia juntando
    pedaços de informação e, finalmente, leu, para
    espanto da sua professora do jardim. Seria um
    milagre?!
       No livro Infância, as recordações de Graciliano Ramos (1953) começam pela imagem
do pai, que tentou ensiná-lo ameaçando, gritando, apanhando. A cartilha que ele usava era
feia e mal impressa, um folheto de papel de qualidade ruim, que rasgava-se entre os seus
dedos. Observe o que ele informa quando conseguiu aprender as primeiras letras e descobriu
que o sofrimento não tinha acabado:

                      Enfim consegui familiarizar-me com as letras quase todas. Aí me
             exibiram outras vinte e cinco, diferentes das primeiras e com os mesmos
             nomes delas. Atordoamento, preguiça, desespero, vontade de acabar-
             me. Veio o terceiro alfabeto, veio o quarto, e a confusão se estabeleceu,
             um horror de qüiproquós. Quatro sinais com uma só denominação. Se
             me habituassem às maiúsculas, deixando as minúsculas para mais tarde,
             talvez não me embrutecesse. Jogaram-me simultaneamente maldades,
             grandes e pequenas, impressas e manuscritas. Um inferno... (Ramos, 1953,
             p. 102).


                       Saiba mais...
                                Boas memórias da alfabetização são as de
                           Bartolomeu Campos de Queirós, que mais de
                           uma vez, em encontros e seminários de
                           professores, falou com saudade sobre Lili,
                             personagem do livro em que aprendeu a ler.
                              Para ele “Lili foi a minha primeira namorada”.




                                                                                         21
Estes breves relatos nos fornecem pistas sobre o algumas crianças
                 pensam e sentem – o menino Graciliano e outras – que ficam sem compreender
                 os símbolos miúdos, impressos em preto e branco, marcas que os adultos
Fundamentos e pensam que contém palavras e histórias. Como
     Didática da acontece este processo? Como funciona?
 Alfabetização I Para as crianças, não faz sentido este
                 tipo de atividade, mas os pais, a
                 professora, a escola exigem que
  elas aprendam a ler com este processo baseado
  na cópia, na repetição, na soletração,
  adivinhação, até aprenderem a ler.
          Diversas teorias de aprendizagem
  preocupam-se em explicar como a criança
  aprende:

         a) por associação ( behaviorismo, estímulo-resposta);
         b) pela ação do sujeito sobre o objeto do conhecimento (construtivismo);
         c) pela interação do aprendiz com o objeto do conhecimento intermediado por outros sujeitos
 (sociointeracionismo).

         Essas teorias ora embasam, ora condenam certos métodos e técnicas de
 alfabetização. O fracasso escolar é um fenômeno social? Este fracasso, antigo e persistente
 no Brasil, é uma questão de métodos?
         Desde a década de 80, Carvalho (1987), através de suas pesquisas sobre
 alfabetização, observou um conjunto de fatores escolares e extra-escolares que podem ser
 indicadores do processo de evasão e repetência, afetando as classes de alfabetização e
 de primeira série.
         Fatores como as condições inadequadas de ensino; turmas numerosas; jornada
 escolar insuficiente, falta de formação continuada das professoras, métodos mal aplicados
 e interpretados, desinteressante, ausência de biblioteca e salas de leitura, dentre outros,
 podem ser determinantes desse fracasso.
         Os fatores extra-escolares, conhecidos como sociais, são decorrentes de questões
 familiares: ingresso na escola tardiamente, freqüência irregular, ausência de livros e jornais,
 pais analfabetos.
         Considerar esses fatores isoladamente não é adequado para justificar as dificuldades
 pelas quais o aluno passa, uma vez que existem fracassos sociologicamente previsíveis,
 assim como existem meninos e meninas pobres, de famílias não
 escolarizadas, estudando em escolas sem qualidade, que aprendem
 a ler e a escrever na primeira série.
         A questão da metodologia não é mais o ponto central ou mais
 importante na área da alfabetização, e sim quem se propõe a
 alfabetizar, qual a teoria respalda a prática. Percebe-se que não
 existe um método milagroso plenamente eficaz para todos. Não
 existe uma receita para isso. É importante destacar a importância
 do domínio da prática, por meio da qual as professoras
 alfabetizadoras modificam, enriquecem o que aprenderam no
 estudo teórico, valendo-se não só da experiência, mas,
 sobretudo, da observação.




  22
Saiba mais...
             Método (do latim methodu), significa caminho para chegar
       a um fim. Durante muito tempo, discutiu-se quais métodos seriam
       mais eficientes, se os sintéticos (que partem da letra, da relação
       letra-som, ou da sílaba, para chegar à palavra), ou os analíticos
       ou globais (que têm como ponto de partida unidades maiores da
       língua, como conto, a oração ou a frase).


      Método Sintético e Método Analítico: da Parte para o Todo

      Como escolher um método?


                     Saiba mais...
                               Magda Soares (1991), através de pesquisas
                         realizadas no Brasil, demonstrou que nas décadas
                         de ‘70 e ‘80 a produção de conhecimento voltado
                         para as metodologias de alfabetização foi
                         decrescendo. Segundo Borges (1998), pode-se
                          indicar duas explicações para justificar o
                          desinteresse científico em relação às
                             metodologias: a) os métodos tradicionais
                              (analíticos ou sintéticos) não alfabetizaram o
                              grande número de alunos que chegavam às
                             escolas; b) a intensa divulgação das idéias de
                         Emilia Ferreiro. O foco de como ensinar a ler e a
                         escrever saiu do foco de como o professor ensina
                         para questão de como a criança aprende, gerando
                         mudanças importantes nas pesquisas e nos temas
                         tratados pelos teóricos.
     Pode-se informar que pesquisas e publicações sobre métodos foram relegadas a
segundo plano, tornando-se ausentes da produção científica a partir dos anos 90.

     Nas condições concretas da escola brasileira, quando uma professora vai escolher
um método, Cardoso-Martins (2003) propõe que busque responder às seguintes questões:

                       · Qual é a concepção da leitura, de leitor que sustenta o
               método?
                       · Os objetivos de alfabetizar e letrar, a preocupação em
               ensinar o código alfabético é tão presente quanto o objetivo de
               desenvolver a compreensão da leitura?
                       · São sistematizados os conhecimentos sobre as relações
               entre letras e sons?
                       · Há motivação para gostar de ler?
                       · O método, a sua fundamentação, é conhecida e faz
               sentido?
                       · As etapas ou procedimentos de aplicação são coerentes?
                       · O material didático é adequado? Acessível?
                       · O método foi experimentado com êxito em um número
               significativo de turmas, em contextos escolares diferentes?




                                                                                   23
As repostas, sendo satisfatórias, possibilitam que o método escolhido
                   (se bem aplicado) proporcione bons resultados.
Fundamentos e
     Didática da
 Alfabetização I
                                       Atenção!
                                        Os métodos sintéticos são: soletração,
                                 silabação e métodos fônicos.
                                        Os métodos analíticos são: palavração,
                                 sentenciação e método de contos.



          Juntar as Letras: Soletração

          Quando daria por um daqueles duros bancos onde me sentava,
  nas mãos a Carta do ABC, a cartilha de soletrar, separar vogais e
  consoantes. Repassar folha por folha, gaguejando as lições num
  aprendizado demorado e tardio. Afinal, vencer é mudar de livro (Cora
  Coralina).
          A “Carta do ABC” apresentada a Cora Coralina, no começo
  no século XXI, ainda faz parte das lembranças de infância de muitos
  professores. São métodos que caracterizam um tempo em que
  grande parte da população era analfabeta e a soletração não buscava
  a compreensão do texto, nem formar leitores, uma vez que só
  trabalhava com palavras soltas. Parafraseando Cora Coralina, leitura
  compreensiva ficava para segundo plano, “afinal, vencer é mudar de
  livro”.
                         Saiba mais...
                        Há indícios de que o método continua em uso no início do
                   século XXI, pois o livreto Método ABC: Ensino prático para
                   aprender a ler (sem indicação de autor ou data) ainda pode ser
                   encontrado em papelarias do interior do Brasil.

          O Ba-be-bi-bo-bu : do Método Alfabético para o Método Silábico

          O método sintético de silabação ainda continua em uso, mesmo com as pesquisas
  realizadas por Emília Ferreiro, tanto nas cidades quanto no interior, por ser considerado
  fácil de aplicar. Porém, nem todos os alunos, jovens, adultos ou crianças, se mostram capazes
  de entender o mecanismo da combinatória das sílabas, o mecanismos de codificação e
  decodificação, o apelo excessivo à memória e não à compreensão, o que gera pouca
  capacidade de motivar os alunos para a leitura e a escrita. A ordem de apresentação dos
  conteúdos é, ainda, hoje seguida: primeiro, são apresentadas as cinco letras que
  representam as vogais, em seguida, os
  ditongos, as sílabas formadas com as
  letras v, p, b, f, d, t, l, j, m, n. As dificuldades
  ortográficas aparecerem do meio para o fim
  do processo alfabetizatório, incluindo os
  dígrafos, as sílabas terminadas por consoantes
  e as letras g, c, z, s e x.


   24
Assim como ocorre na soletração, o método silábico separa os processos de
alfabetização e letramento, assumindo o pressuposto de que a compreensão da leitura
vem depois da aprendizagem do processo de decodificação.

      Métodos Fônicos

        O método fônico, ao ser aplicado pelo professor, investe na dimensão sonora da
língua, isto é, para o fato de que as palavras, além de terem um ou mais significados, são
formadas por sons, denominados fonemas, unidades mínimas de sons da fala, representados
na escrita pelas letras do alfabeto.
        O método ensina o aluno a produzir oralmente os sons representados pelas letras e
uni-los para formar as palavras. O método inicia o processo com palavras curtas, formadas
por apenas dois sons representados por duas letras. Em seguida, estudam-se palavras de
três letras ou mais. A preocupação é ensinar a decodificar os sons da língua, na leitura; e a
codificá-los, na escrita.

      Método da Abelhinha

      Alzira S. Brasil da Silva, Lúcia Marques Pinheiro
e Risoleta Ferreira Cardoso, educadoras com ampla
experiência de ensino e de pesquisa, são as autoras este
método que foi experimentado na Escola Guatemala, na
cidade do Rio de Janeiro, em 1965. Essa escola foi criada
por Anísio Teixeira, vista como um centro de referência para
inovações pedagógicas e recebia apoio do Instituto Nacional
de Pesquisas Educacionais (Inep).




        O método da Abelhinha apresenta histórias cujos personagens estão associados a
letras e sons.
        Os sons são apresentados como “barulhos” que ocorrem, o mesmo acontecendo
com a reunião de dois sons em sílabas. Da reunião de dois sons, a criança passa a três, e
vai lendo palavras cada vez mais extensas; depois expressões, sentenças e historinhas
(SILVA et al., s/d, p. 7).

                                                          Saiba mais...
     A personagem abelhinha, nome do método, tem o corpo em forma de um
a (em letra cursiva) e apresenta o som aaaaa (a vogal é prolongada para facilitar
o reconhecimento); a letra i é representada pelo tronco de um índio, outro
personagem de histórias, e assim por diante. Os personagens são desenhados
para sugerir o todo ou partes das formas estilizadas das letras. Há, portanto,
uma associação de três elementos: personagem – forma da letra – som da letra
(fonema). Alfabetização se faz por síntese ou fusão dos sons para formar a
palavra.

                                                                                          25
A emissão correta e habilidade para distinguir sons parecidos são
                 preocupações das autoras, que recomendam:
                        Use recursos para levar as crianças a distinguirem sons parecidos:
Fundamentos e observar o movimento dos lábios e da língua para pronunciar esses sons;
     Didática da emiti-los isoladamente ou em palavras por eles iniciadas. Observe que o t
 Alfabetização I parece estalar; o p lembra a pipa batendo na árvore (pan); o b é o barulhinho
                 da água quando ferve (SILVA, s/d, p. 33).

          A Casinha Feliz

        O método Casinha Feliz foi criado pela pedagoga
 Iracema Meireles (1984), na década de 50. Tem uma longa
 trajetória de aplicação em escolas públicas e particulares
 e ainda está em uso.
        A autora acreditava na aprendizagem por meio do
 jogo, propondo que a sala de aula fosse um espaço para criatividade e a livre expressão
 das crianças e começou a “personalizar as letras” e associá-las a figuras do universo infantil.
         Iracema Meireles disse que ocorreu uma mudança importante quando:

         [...] observando as turmas que se alfabetizavam, notou que as crianças adoravam as histórias
 e as letras/personagens, e esqueciam frases e palavras se ficavam alguns dias sem vê-las. Passou
 a contar as histórias em função de apresentar as letras. Foi uma ousadia para a época (MEIRELES,
 2000, p. 258).

        Meireles (ibid) buscava facilitar a aprendizagem de novas combinações de letras,
 mas não comungava com as estratégias de memorização próprias da soletração e silabação.
 As letras são apresentadas como personagem de uma história: papai (p), mamãe (m),
 nenê (n) e ratinho (r). O recurso didático, de boa qualidade, agradava, mas não era funcional
 porque as crianças decoravam as combinações de consoantes com vogais, como se faz
 na soletração (MEIRELES, 2000). A base do método era associar a forma da letra a uma
 personagem o qual, por sua vez, representava determinado som.
        Segundo Iracema Meireles, a história central de A Casinha Feliz (1999) pode ser
 “modificada à vontade e até substituída”. O essencial é que conduza à figura-fonema capaz
 de fazer sempre, se for consoante, o imprescindível barulhinho. Tudo mais é jogo, é
 dramatização, atividade criadora (MEIRELES, 2000, p. 34).




               Atenção!
                Na aplicação dos métodos fônicos, a maior dificuldade técnica é tentar articular o
        som das consoantes isoladas, pois, de fato, elas só ganham sons quando estão
        acompanhadas de uma vogal. Existem algumas consoantes, como o /f/ e o /v/, que podem
        ser prolongadas com certa facilidade, dando a impressão que fundem som as vogais que
        as acompanham. Mas não é o caso da maioria das outras que só são ouvidas claramente
        quando acompanhadas das vogais.
                Um cuidado que deve ser observado na aplicação dos métodos fônicos decorre
        da própria natureza do Português, língua alfabética na qual uma letra pode representar
        diferentes sons conforme a posição que ocupa na palavra, assim como um som pode ser
        representado por mais de uma letra, segundo a posição. Assim, não basta ensinar o som
        da letra em posição inicial da palavra, mas é preciso mostrar os sons que as letras têm
        em posição inicial, medial (no meio) ou final da sílaba. (CARVALHO, 2005, p.122)




   26
Para refletir...
               A professora Taís planejou, para o início do ano letivo, na sua classe de
       alfabetização, o ensino do alfabeto. Para isso, resolveu apresentar uma letra por
       semana e sempre que ia revisar a letra da semana anterior, percebia que os alunos
       já haviam esquecido a letra estudada. Então, a professora Taís decidiu conversar
       com a colega Maria, também professora de alfabetização. Maria disse a Taís que ela
       trabalha com seus alunos apresentando todas as letras do alfabeto, de uma só vez, a
       fim de que as crianças possam relacioná-las, de modo significativo, e que surta efeito.
       As crianças, além de reconhecerem a representação gráfica das letras, também
       identificam o som que ela representa.

             :: Avalie a prática das duas professoras. Qual é a que você
       considera mais adequada? Como você ensinaria o alfabeto aos seus
       alunos?

            :: Pontue, após a leitura do texto, aspectos que você considera
       importantes para o processo de alfabetização de crianças.
            _______________________________________________________________
            _______________________________________________________________
            _______________________________________________________________
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            _______________________________________________________________
            _______________________________________________________________



      Estimulando a Compreensão da Base Alfabética

       Já sabemos o longo caminho a ser percorrido pela criança quando tenta compreender
a natureza do sistema de escrita que lhe estamos ensinando. Como respeitar o modo de
pensar do aluno e contribuir para que ele caminhe na direção da compreensão do nosso
sistema de escrita?
       É óbvio que, se a criança pensa que a escrita representa diretamente o significado
das palavras, precisamos reconhecer formas de estimulá-la, desafiando-a para descobrir a
natureza alfabética do nosso sistema de escrita.
       Reconhece-se que a criança que vive em ambientes letrados, normalmente se
interessa pela escrita e chega à escola com idéias bastante avançadas em relação ao
processo alfabetizatório: a escrita do seu próprio nome, o nome do pai, da mãe, do irmão,
até dos amigos que dão grande impulso para as descobertas infantis.
       Será que está faltando alguma coisa? Em situações informais, os adultos são muito
sensíveis às dificuldades motoras das crianças, preferindo inicialmente usar as letras
maiúsculas de imprensa, pois estas são de traçados mais fácil que as cursivas.
       Esta prática é interessante para que o professor estruture situações de sala de aula,
em que as crianças sejam encorajadas, desafiadas a escrever os nomes de seu interesse
e compare as suas escritas com as dos adultos e com as escritas de outras crianças.
       Além desta pratica informal, algum tipo de sistematização que chame a atenção das
crianças para a natureza do nosso sistema de escrita é de grande ajuda, num momento em
que se está querendo que a criança deixe de pensar na escrita como representação direta




                                                                                                 27
de significados e passe a perceber a relação que existe entre as letras e as
                   cadeia sonora das palavras.

Fundamentos e
     Didática da
 Alfabetização I




                  Pode-se demonstrar isto de uma forma mais direta para a criança quando
          categorizamos as palavras através de suas sílabas ou de seus sons. Perceber que as
          palavras “pato, papel e parafuso” compartilham entre si o mesmo segmento sonoro
          -pa- pode não ser tão óbvio para uma criança que está que está começando a aprender
          a ler. As crianças tendem inicialmente a perceber as relações entre significados.
          Assim, uma criança pode pensar que a palavra “pato” parece com a palavra “bico”
          porque pato tem bico não se aperceber para a semelhança entre “pato, papel e
          parafuso” simplesmente porque estas palavras apenas estão relacionadas a que se
          refere ao som e esse é um aspecto da relação entre palavras para o qual uma boa
          parte das crianças não está atenta de início. No entanto, esta é uma habilidade
          crucial quando se trata de compreender escritas alfabéticas e que pode ser
          estimuladas no dia-a-dia da sala de aula. (CARVALHO, 2005, p. 123)

         É preciso descobrir formas mais provocativas de levar as crianças também a perceber
  que existem as inconsistências ortográficas, gerando situações atividades que mostrem,
  por exemplo, o valor sonoro do “s” e do “r” intervocálicos e de outras regras ortográficas.
         Entender o princípio alfabético e das suas convenções ortográficas constitui uma
  das dimensões envolvidas nesta complexa aquisição. A língua escrita tem várias funções
  relacionadas a determinadas convenções. É necessário considerar o que as crianças podem
  conhecer sobre esta funcionalidade e sobre as convenções lingüísticas dela decorrentes.
         Reduzir o ensino da leitura e da escrita apenas à compreensão do sistema alfabético
  de escrita significa deixar de lado informações igualmente relevantes para a criança, pois
  que sentido faz escrevermos palavras e frases se esta escrita não encerra em si um valor
  comunicativo? A criança aprende a falar porque a fala tem funções comunicativas vitais
  para ela, mas nem sempre estamos alerta para isto quando ensinamos as crianças a
  escrever.
         Alguns estudos têm demonstrado que as crianças expostas a atividade de leitura e
  escrita no seu dia-a-dia tornam-se sensíveis às variações lingüísticas envolvidas no uso da
  escrita.
         Estudos desenvolvidos por Carvalho (2005, p. 126) demonstram que

         Numa classe de pré-alfabetização de uma escola particular observamos que algumas
  crianças já conseguem antecipar o conteúdo de vários tipos de texto. Ao perguntar para uma
  criança o que estava escrito no jornal ela respondeu:
         “Aumentou o preço do feijão, macarrão, arroz, do leite, do pão e de muitas outras coisas”.

          Embora não seja leitora, esta criança já demonstra uma noção do tipo de informação que
  aparece escrita no jornal. Esta mesma criança, diante de um envelope contendo uma carta, fingiu
  ler o seguinte:
          “Querido papai, eu quero lhe ver amanhã porque eu vou viajar e eu vou mandar um beijão
  para você”.




   28
Temos também observado que crianças pequenas produzem rabiscos aos quais atribuem o
valor de uma carta fazendo de conta que estão lendo estes rabiscos e produzindo textos como:
       “Querida mamãe um beijo bem grande para você, minha querida, meu amor da minha vida.
Mamãe tem um desenho para você em cima da carta”.

       Já diante de livros de história, esta mesma criança tenta reproduzir o texto da história.
Tudo isto nos mostra que algumas crianças, mesmo antes de aprender a ler e escrever, já estão
aptas a produzir textos que refletem um domínio rudimentar das características da linguagem que
usamos para diferentes tipos de texto.

        Percebe-se que se a alfabetização ficar apenas restrita aos textos artificiais das
cartilhas, o alfabetizando que não tem oportunidade de interagir com textos em seu ambiente
de família, termina apenas por aprender a utilizar uma escrita totalmente alheia aos seus
usos na sociedade. Muitas crianças que são alfabetizadas desta maneira reproduzem as
frases típicas de cartilha quando são solicitadas a produzir uma história.



                        Atenção!
                    A leitura e a escrita precisam ter significado funcional na vida
            das crianças. Necessário se faz transformar o processo alfabetizatório,
            baseado no treinamento perceptual e motor, período que precede a
            alfabetização e ao treinamento de correspondências grafo-fônicas, num
            ambiente letrado no sentido funcional do termo.




       Por que as Crianças Trocam Letras ao Escrever?5

        Quando os alunos estão aprendendo as convenções do sistema alfabético, é comum
alguns cometerem trocas entre P e B, T e D, F e V. Essas trocas ocorrem devido ao fato
desses sons serem muito parecidos em sua realização no aparelho fonador e, por isso, ao
escrever, surgem dificuldades em diferenciá-los. Tecnicamente, esse grupo de letras (P/B,
V/F, T/D) é chamado de “pares mínimos”. Esses sons são produzidos expelindo-se o ar do
mesmo modo, do mesmo ponto de articulação, diferindo apenas porque em um (exemplo,
o/b/), as cordas vocais vibram, enquanto no outro som (exemplo, o/p/) elas não vibram.
        A maioria dos alunos que apresenta tal dificuldade na escrita, não tem problemas
em compreender ou falar as palavras com esses mesmos sons. Isto é, ao ouvirem, por


            5
              Texto elaborado por Patrícia Waltiack,
            assessora pedagógica da Editora
            Positivo. Material impresso.                                                     29
exemplo, alguém falar “pote”, não a confundem com “bote”, assim como, ao
                 se expressarem oralmente, articulam bem uma e outra palavra.
                       Para a maioria desses alunos, a questão parece residir na dificuldade
Fundamentos e de analisar fonologicamente os segmentos sonoros na hora em que estão
     Didática da escrevendo.
 Alfabetização I       Assim, pode-se oportunizar ao aluno atividades que o ajudem a realizar
                 essa análise. Ao fazer comparações com as diferentes formas de escrita
                 (FACA e VACA, por exemplo) e ao evidenciar as correspondências letra-som,
  o aluno se dará conta de que, em nosso sistema de escrita, existe uma única e definida letra
  para notar o som em questão.
          Desta forma, fica evidente a necessidade de promoção do desenvolvimento da
  consciência fonológica, ou seja, o aluno deve aprimorar sua capacidade para distinguir o
  fonema na cadeia da fala (o som) para poder escrever ou para transformar as combinações
  dos sinais gráficos em seus correspondentes significados.




        Questão        1
                         [ ]         Agora é hora de
                                     TRABALHAR



       Consideramos uma criança alfabetizada quando reconstrói o sistema lingüístico de
 maneira a representar a língua a partir de relações grafema-fonema. O que o professor
 alfabetizador pode planejar como atividade que funcione como boa situação de
 aprendizagem referentes à relação da língua falada com a escrita?
       __________________________________________________________________
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   30
ANÁLISE REFLEXIVA DA LEITURA,
                              ESCRITA E CONSTRUÇÃO DO
                          PENSAMENTO NO PROCESSO INICIAL DE
                           ESCOLARIZAÇÃO: A ALFABETIZAÇÃO

                          PRÁTICAS DISCURSIVAS NAS CLASSES DE
                                     ALFABETIZAÇÃO

     O Processo de Alfabetização: Apropriação de Muitas
Linguagens

                  Para refletir...
               A leitura e a escrita fazem parte do dia-a-dia da sala de aula
         a partir da pré-escola. Se as crianças ainda não são leitoras, é
         possível que a própria professora leia para elas e que escute as
         leituras de faz-de-conta das crianças. Caso as crianças ainda não
         escrevam, é interessante que aceitemos as interpretações que elas
         dão aos seus próprios rabiscos. Estas pseudos-leituras e estas
         pseudos-escritas são processos iniciais naturais das futuras leituras
         e das futuras escritas.

       Quando a professora descobre quais são os tipos de texto que mais interessam às
crianças, lendo estes textos e estimulando-as a lerem e a escreverem, ela está contribuindo
não só para motivar o aluno para aprender a ler e a escrever, mas também fornecendo-lhes
os modelos dos estilos de linguagens peculiares a vários tipos de texto. Recentemente, a
reescrita e a releitura de textos lidos previamente em sala de aula pelo professor tem sido
uma atividade amplamente utilizada em escolas que seguem uma orientação construtivista.

        Sabemos que muitas crianças que vão para o exterior terminam por aprender a se comunicar
numa segunda língua, simplesmente porque têm oportunidade de usar esta língua em contexto
comunicativos. Um fato que tem chamado a nossa atenção, como a de outros pesquisadores, é que
crianças regularmente expostas à leitura de certos tipos de texto podem possuir idéias bastante
avançadas em relação à língua que aparece em determinados textos. Os nossos estudos têm
enfocado principalmente as histórias infantis, mas nada impede que esse fenômeno também ocorra
em relação a outros tipos de texto. O nosso primeiro exemplo envolve duas crianças que estão
fazendo de conta que lêem um livro. O livro pretensamente lido é O Fogo no Céu (de Mary França
e Eliardo França, Editora Ática) e o texto contido no livro é o seguinte:

       “O bode falou para o rato: O céu pegou fogo!
       O rato falou para a pata: O céu pegou fogo!
       A pata falou para o galo: O céu pegou fogo!
       Fugiu o rato, fugiu o galo, fugiu a pata. Fugiu o bode.
       O bode viu a coruja e falou: Foge coruja! O céu pegou fogo e o fogo vai cair na mata!
       A coruja viu o céu e falou: O fogo é um balão de São João!




                                                                                               31
O bode falou: um balão de São João? Vamos apagar o balão?
                          O fogo não pode pegar na mata.
                          O balão caiu, O bode apagou o fogo e pendurou o balão. E todos deram viva a
                   São João”..
Fundamentos e
     Didática da           O texto produzido pela primeira criança, Lucilene, ao fazer de conta que lia
 Alfabetização I   o livro “O Fogo no Céu” foi o seguinte;

                          “O bode disse para o rato: O céu pegou fogo!
                          O rato disse para a pata: O céu pegou fogo!
          A pata disse para o galo: O céu pegou fogo!
          O rato fugiu, O galo fugiu, O bode fugiu.
          O bode encontrou a coruja e disse: Foge coruja! O céu pegou fogo!
          A coruja disse: É um balão de São João!
          Vamos apagar o balão?
          Apagaram o fogo e deram viva a São João”.

        Já a reprodução do texto do livro “O Fogo no Céu” feita por uma outra criança, Fernanda,
  da mesma classe de Lucilene, foi a seguinte:

          “Aí o rato viu o bode e falou com o bode. Aí o rato falou para a pata: O céu pegou fogo!
          Correu o rato, correu a pata, correu o bode.
          Aí o bode falou para a pata: o céu pegou fogo.
          Bora apagar o fogo de São João ? Aí deu viva a São João.”
          (BAJARD, 2002, p. 35)




          Lucilene conhece o texto do livro, ela faz uma reprodução mais fiel ao estilo do livro.
  Já Fernanda reproduz o texto num estilo mais próximo da linguagem oral usando expressão
  “Aí” e outras também coloquiais como “bora”. Lucilene demonstra maior familiaridade com
  o estilo de linguagem do livro exemplificado.
          Exemplos como estes sevem para ilustrar um fenômeno já explorado por alguns
  pesquisadores: crianças que desde cedo são expostas e exploram textos escritos têm
  desempenho superior em leitura e produção de textos. Uma exposição precoce à leitura e
  à escrita na escola é, sobretudo, importante para aquelas crianças que, em casa, têm pouca
  oportunidade de interagir com estes tipos de texto.
          A alfabetização não é apenas um processo de aquisição de leitura e escrita, discussão
  já superada. A compreensão da alfabetização como processo de apropriação de diferentes
  linguagens (escrita, matemática, das ciências, das artes e do movimento - teatro e dança,
  sem esquecer as mídias interativas), terá como finalidade as concepções de conhecimento,
  de aprendizagem e do desenvolvimento pelo qual as crianças fazem as suas conquistas.
          A alfabetização constitui-se, então, numa atividade interativa, interdiscursiva de
  apropriação de diferentes linguagens produzidas culturalmente. Dentre elas, situa-se a escrita
  como um artefato presente em todas as atividades das sociedades letradas, e, portanto,
  buscada pelo escritor até mesmo como uma forma de inserção social, um posicionamento
  grupal ou ainda uma demarcação territorial. Segundo Braslavsky (2000, p. 34), é necessário,



   32
deste modo, compreender que , no processo de alfabetização, o convívio com a linguagem
escrita deve ser atividade real e significativa, na qual as crianças interagem com diferentes
conhecimentos, com o professor, sua intencionalidade e a linguagem escrita em suas
diferentes manifestações.
       Essas diferentes manifestações se referem ora aos estilos, ora às técnicas, ora às
possibilidades de ambas. Para aprender a ler e escrever, é necessário que o aluno sinta a
sala de aula como um lugar onde as razões para ler (e escrever) são intensamente
vivenciadas. A escrita só irá ganhar esses contornos se o professor, desde muito cedo,
começar a abordá-los. A escrita infantil tem sabor de utilidades:

      · para produzir uma receita, esta precisa se pautar em degustação;
      · para escrever uma carta ao prefeito da cidade, essa carta necessita ser endereçada a ele;




                   Atenção!
                   Com o crescimento da produção, cresce também o nível de
            cobrança em relação a ela. O que não é permitido aqui é deixar a criança,
            diante da impossibilidade de execução, traduzir essa como
            incompetência pessoal. Em relação à escrita, sempre há uma
            possibilidade de o escritor resolver o impasse, ou o problema encontrado,
            no entanto, da mesma maneira, isso acontecerá com o domínio e às
            possibilidades reais do aluno. Em relação ao aluno, a impossibilidade é
            momentânea. Lembramos que o nosso trabalho de ensino-aprendizagem
            é sempre com o possível e não com o limitado.




                           Para refletir...
                       Com base na leitura do texto, elabore duas
                  situações de aprendizagem na alfabetização,
                  contemplando os conteúdos abordados.


      Alfabetização e Produção de Textos: Construindo Saberes

        Como trabalhar com textos na alfabetização? Se a criança não sabe ainda ler palavras
simples, poderá ler uma história? E possível alfabetizar sem ensinar as letras uma a uma?
        A alfabetização a partir de histórias, orações ou frases tem sido praticada com êxito
há muitas décadas. Por acreditar que trabalhar com pequenos textos naturais - sejam
histórias, noticias, poemas etc., é uma possibilidade interessante, apresentaremos algumas
sugestões.


                             Atenção!
                             Para aprender a ler é preciso conhecer as letras e os
                     sons que representam, com sentido, compreender o que está
                     escrito. Os textos poderão ser favoráveis para enfocar estas
                     duas facetas da aprendizagem: a alfabetização e o
                     letramento.




                                                                                              33
O que é um texto?

                        A raiz da palavra texto é a mesma da palavra tecer. O texto é um “tecido”
Fundamentos e feito com palavras, assim como o pano é um tecido de fios. Sabemos que fios
     Didática da soltos não formam um tecido, assim como palavras soltas, desconexas, sem
 Alfabetização I um sentido que as aproxime, não formam um texto.
                        Um texto pode ser curto ou longo: uma frase ou uma oração que
                 expressa um significado completo podem ser um texto. Assim, um texto é
  mais do que a soma de palavras e frases. Então, uma lista de frases estereotipadas das
  cartilhas do tipo O boi baba, A baba bebe, O ovo é da ave, etc. não podem ser caracterizar
  como um texto.
          As pessoas que falam determinada língua reconhecem e produzem textos nessa
  língua, distinguem os que fazem dos que não fa-zem sentido. Uma passagem que é incoerente
  ou absurda causa um estranha-mento nos ouvintes ou nos leitores. Para compreender e
  saber produzir textos, as pessoas possuem uma competência lingüística denominada
  competência textual. As crianças pequenas possuem essa capacidade, que pode ser
  melhorada por meio de exercícios e atividades orais e escritas.

         Trabalhando com Textos Escritos: Escrever para Aprender

          Observe estes dois textos. O primeiro retrata as lições encontradas nas cartilhas
  (frase isoladas, colocadas em seqüência, sem título). Não retrata língua viva que falamos ou
  escrevemos, tem o único o propósito de exercitar a criança, de treiná-la na aprendizagem
  de palavras com as letras z, m, b e i.

                        Texto n. 1
                        Zazá é uma menina.
                        Zazá é uma menina bonita.
                        Zazá mora na Ilha.


                               Texto n. 2
                               Chapeuzinho Vermelho
                               Era uma vez urna menina chamada Chapeuzinho
                        Vermelho. Um dia, sua mãe mandou que ela levasse uma
                        cesta cheia de coisas gostosas para a vovó. A garota foi e no
                        caminho encon-trou o lobo.


         O texto 2, apesar de simples, faz sentido, é compreensível, transmite uma idéia, está
  escrito de acordo com as convenções da escrita do Português, diferente do texto cartilhesco.
         Os recursos usados pelo autor para evitar repetições de palavras precisam ser
  destacados: o pronome ela e o substantivo garota referem-se a Chapeuzinho Vermelho. A
  mãe de Chapeuzinho, o texto diz sua mãe.
         Quanta coisa é preciso saber para compreender uma pequena história! Entendemos
  o sentido global do texto devido a nossa experiência anterior com a língua oral e escrita e
  também ao nosso conhecimento do mundo. Assim, aprendemos que nas histórias de fadas
  os animais falam e aceitamos essa convenção, por isso não nos surpreende que o lobo
  converse com Chapeuzinho.
         Oferecer situações significativas para a criança aprender a ler e, principalmente,
  despertar o desejo, a vontade de ler é o propósito de todo professor alfabetizador, alternativa



   34
melhor do que oferecer à criança desenhos prontos para colorir e/ou pontinhos para unir e
criar um clima de interesse e receptividade em relação a leitura e a escrita. Para isso, a
professora precisa ter à mão livros infantis, jornais, revistas, muito material escrito, de todo
tipo, para olhar, manipular, manusear, adivinhar. A criança que folheia livros e revistas acaba
se perguntando: o que isso quer dizer?




       Ao observar livros infantis, as crianças inventam histórias inspiradas nas ilustrações.
Criam narrativas para si mesmas e para os colegas. As histórias narradas pela professora
e pelos alunos também tem um grande papel na educação da criança: elas alimentam a
imaginação e o sonho, melhoram a expressão verbal, aguçam a curiosidade, criam amor
pelos personagens, pelas palavras, pelos livros.
       Ao ouvir as histórias em voz alta, as crianças aprendem aos poucos sobre sintaxe (a
forma pela qual as frases são organizadas para fazer sentido) e o léxico ou vocabulário da
língua escrita. Isso vai ajudá-las a aprender a reconhecer de ouvido as normas lingüísticas
que regem a escrita, mesmo que ainda não saibam empregá-las. O domínio da escrita é
um aprendizado de longa duração que começa na alfabetização e se estende por muitos
anos.

                         Para refletir...
                        A professora Joana acredita que para alfabetizar as crianças
                precisa fazer com que elas aprendessem as letras e seu som
                correspondente. Então, resolveu apresentar a família silábica ba-
                be-bi-bo-bu durante uma semana. Ao acabar este período, percebeu
                que as crianças não compreendiam que ao mudar uma letra da
                sílaba, necessariamente, o fonema alterava-se. Observou que as
                crianças não atribuíam significado às sílabas trabalhadas.

                      Reflita sobre a estratégia utilizada pela
                professora e proponha uma alternativa metodológica
                para o alcance da aprendizagem esperada.



    A escolha dos Textos para a Classe de Alfabetização: a Pesquisa
do(a) Professor(a)

       A escolha dos textos

       Qual texto escolher para as s crianças?

       O tema e os significados do texto escolhido são decisivos no momento de começar
o ensino sistemático da leitura.


                                                                                             35
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  • 1.
  • 2. FUNDAMENTOS E DIDÁTICA DA ALFABETIZAÇÃO I 1
  • 3. Fundamentos e SOMESB Didática da Sociedade Mantenedora de Educação Superior da Bahia S/C Ltda. Alfabetização I Presidente ♦ Gervásio Meneses de Oliveira Vice-Presidente ♦ William Oliveira Superintendente Administrativo e Financeiro ♦ Samuel Soares Superintendente de Ensino, Pesquisa e Extensão ♦ Germano Tabacof Superintendente de Desenvolvimento e>> Planejamento Acadêmico ♦ Pedro Daltro Gusmão da Silva FTC - EaD Faculdade de Tecnologia e Ciências - Ensino a Distância Diretor Geral ♦ Waldeck Ornelas Diretor Acadêmico ♦ Roberto Frederico Merhy Diretor de Tecnologia ♦ Reinaldo de Oliveira Borba Diretor Administrativo e Financeiro ♦ André portnoi Gerente Acadêmico ♦ Ronaldo Costa Gerente de Ensino ♦ Jane Freire Gerente de Suporte Tecnológico ♦ Jean Carlo Nerone Coord. de Softwares e Sistemas ♦ Romulo Augusto Merhy Coord. de Telecomunicações e Hardware ♦ Osmane Chaves Coord. de Produção de Material Didático ♦ João Jacomel EQUIPE DE ELABORAÇÃO/PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO: ♦ PRODUÇÃO ACADÊMICA ♦ Gerente de Ensino ♦ Jane Freire Autor (a) ♦ Maria das Graças Cardoso Moura Supervisão ♦ Ana Paula Amorim Coordenação de Curso ♦ Tatiane Lucena ♦ PRODUÇÃO TÉCNICA ♦ Revisão Final ♦ Carlos Magno Equipe ♦ Ana Carolina Alves, Cefas Gomes, Delmara Brito, Ederson Paixão, Fabio Gonçalves, Francisco França Júnior, Israel Dantas, Lucas do Vale e Marcus Bacelar Editoração ♦ Fabio José Pereira Gonçalves Ilustração ♦ Fabio José Pereira Gonçalves, Francisco França Júnior Imagens ♦ Corbis/Image100/Imagemsource copyright © FTC EaD Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/98. É proibida a reprodução total ou parcial, por quaisquer meios, sem autorização prévia, por escrito, da FTC EaD - Faculdade de Tecnologia e Ciências - Ensino a Distância. www.ftc.br/ead 2
  • 4. Sumário AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 07 O ESTUDO DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS LINGÜÍSTICO, PSICOLÓGICO, PSICOLINGÜÍSTICO E SOCIAL A Produção Social e a Caracterização da Língua Escrita ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 07 O Nosso Sistema de Escrita: sua Natureza e a Aquisição da Língua Materna pela Criança ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 11 Alfabetização e Letramento: Refletindo Conceitos ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 13 Os Estudos de Emília Ferreiro: a Psicogênese da Língua Escrita ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 15 OS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: ANÁLISE NUMA PERSPECTIVA CRÍTICA E REFLEXIVA (Re) visitando os Métodos de Alfabetização ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 21 Método Sintético e Método Analítico: da Parte para o Todo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 23 Estimulando a Compreensão da Base Alfabética ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 27 Por que as Crianças Trocam Letras ao Escrever? ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 29 ANÁLISE REFLEXIVA DA LEITURA, ESCRITA E CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO NO PROCESSO INICIAL DE ESCOLARIZAÇÃO: A ALFABETIZAÇÃO ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 31 PRÁTICAS DISCURSIVAS NAS CLASSES DE ALFABETIZAÇÃO O Processo de Alfabetização: Apropriação de Muitas Linguagens ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 31 Alfabetização e Produção de Textos: Construindo Saberes ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 33 3
  • 5. A Escolha dos Textos para Classe de Alfabetização: a Pesquisa do Professor ○ ○ ○ ○ ○ 35 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Fundamentos e O Universo da Sala de Aula de Alfabetização: o Ambiente Didática da Alfabetizador ○ ○ ○ ○ ○37 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Alfabetização I ATIVIDADES DIDÁTICO-PEDAGÓGICAS NA ALFABETIZAÇÃO: ENSINAR A LER E A ESCREVER Alfabetização: Pensando nos Textos de Uso Diário ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 40 Sugestões Didáticas para Melhorar a Competência Textual e a Expressão Oral: a Prática Pedagógica ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 41 O Processo de Alfabetização e as Intervenções do Professor: o Trabalho com a Produção de Texto Escrito ○ ○ 42 Aprender a Gostar de Ler ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 48 Atividade Orientada ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 52 Glossário ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 57 Referências Bibliográficas ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 58 4
  • 6. Apresentação da disciplina Caro (a) aluno (a): “Quem me chamou, Quem vai querer voltar pro ninho Redescobrir seu lugar” 1 É com satisfação que apresento este Módulo Impresso, acolhendo reflexões voltadas para a disciplina Fundamentos e Didática da Alfabetização aos meus futuros colegas de profissão, ávidos em “redescobrir seu lugar” na história da educação, nossa história. Mudam os tempos, mudam as pessoas. Diversifica-se, também, o tipo de leitor projetado pela sociedade e cultivado pela escola. Reconhece-se que até o final da Segunda Guerra Mundial, mais da metade da população brasileira era não escolarizada (analfabeta) e vivia predominantemente na zona rural. Estes cidadãos, embora não tivessem direito a voto, apenas o fato de saber assinar o nome dava-lhe o direito de tirar o título de eleitor. A partir dos anos 50, observou-se o crescimento das taxas de urbanização e industrialização, o que gerou aumento da matrícula de crianças nas escolas. No entanto, os índices de analfabetismo permaneceram elevados, principalmente nas áreas rurais. Ações do governo federal viabilizaram várias campanhas de alfabetização para crianças e jovens adultos, cujo objetivo maior era simplesmente ensinar a decifrar palavras e frases simples, mas a produção contínua de analfabetos, causada por sistemas escolares inadequados e condições sociais de extrema desigualdade, não cessou. Onde fica, então, o convite de reaprender a sonhar? Será que esta “história não tem fim?” Chegamos ao século XXI com cerca de vinte milhões de analfabetos. Outros tantos cidadãos também são acolhidos neste número, aqueles que possuem apenas rudimentos de leitura e escrita. É possível garantir que os trabalhadores que exercem as funções mais modestas tenham condições de ler e entender avisos, ordens e instruções? Quem se responsabiliza pelas funções qualificadas? Quem é o trabalhador capaz de usar a leitura e a escrita para obter e transmitir informações, para comunicar-se, para registrar fatos? Precisamos começar pela criança para que não tenhamos mais adultos nesta situação. Alfabetizar uma criança só é possível quando o educador penetra em sua alma. E a porta de entrada da alma da criança é a fantasia. É preciso desenvolver a pedagogia da imaginação, possibilitando à criança o gosto de aprender através do “brincar de viver”. Eis, então, um convite para você, aluno (a): é preciso “reaprender a sonhar”, acreditando em nossa capacidade de educar, de formar leitores críticos. Isto só é possível quando ainda temos esperança, quando dizemos sim, “cada vez que o mundo diz não”. Seja bem vindo (a)! Os textos apresentados neste Material Impresso não podem ser vistos como “Cartilha”: trata-se de um plano de trabalho que o (a) auxiliará a compreender o processo de alfabetização, valorizando a experiência da criança, apresentando a leitura e a escrita como práticas culturais cotidianas, processo que não pode ser mecânico. O que posso dizer para finalizar esta mensagem? Retornar para Guilherme Arantes e lhe informar “... Hoje eu sou feliz E quero ver feliz Quem andar comigo Vem! Agora é brincar de viver...” Professora Maria das Graças Cardoso Moura 1 Guilherme Arantes, Música Brincar de Viver. 5
  • 7. Fundamentos e Didática da Alfabetização I 6
  • 8. AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO O ESTUDO DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS LINGÜÍSTICO, PSICOLÓGICO, PSICOLINGÜÍSTICO E SOCIAL A Produção Social e a Caracterização da Língua Escrita Finalidade: compreender os aspectos básicos do sistema de escrita da língua portuguesa relacionados à alfabetização, quais sejam: relação entre as letras e os sons da fala e regularidades relacionadas à morfologia das palavras e as origens e convenções ortográficas. A partir dos meados da década de 1980, a prática pedagógica na alfabetização sofreu a influência da abordagem construtivista na psicologia cognitiva. Informações acerca do desenvolvimento da língua escrita pela criança têm chegado aos professores alfabetizadores, deixando-os, muitas vezes, confusos e ansiosos em relação à sua própria prática. Será que não posso mais ensinar porque a criança e o jovem adulto têm condições de descobrirem a escrita sozinhos? Devo corrigir o aluno? Como planejar atividades para alfabetização? São comuns hoje entre os professores estes questionamentos. Neste texto, adaptado de Lúcia Lins Browne Rego (1998), partiremos da análise do conhecimento da Língua a ser compreendido pelo alfabetizando, considerando as pesquisas e experiências bem sucedidas sobre a construção da base alfabética e observando as suas implicações pedagógicas. Aspectos Lingüísticos Língua Escrita: Como Caracterizá-la? Para caracterizar a língua escrita, é necessário apontar três aspectos considerados essenciais: 1º É preciso refletir sobre a natureza da Língua Portuguesa, nosso sistema de escrita, isto é, o que representam as marcas registradas no papel; 2º É necessário considerar que a língua escrita se manifesta através de seus usos, envolvendo diferentes convenções lingüísticas. 3º É preciso compreender que a língua que lemos é diferente daquela que ouvimos e falamos e temos que levar sempre em conta um interlocutor ausente e, por vezes, imaginário. Vamos compreender cada um desses aspectos: 7
  • 9. A Natureza do Nosso Sistema de Escrita. Qual é? Fundamentos e Didática da Alfabetização I É alfabética a nossa escrita, isto é: cada letra representa as unidades mínimas de som identificadas nas palavras. Por exemplo, para escrever a palavra “casa” precisamos de quatro letras porque nesta palavra são identificados quatro sons [k-a-z-a]. Hoje, para as pessoas alfabetizadas, tudo isso parece óbvio. No entanto, a história conta que foram necessários muitos anos para que surgisse na Grécia o sistema de escrita alfabética. Para entender em que consiste a natureza deste sistema de escrita, é necessário compará-lo a outros sistemas. Existia uma forma muito antiga de escrita cujos sinais gráficos representam objetos. A forma mais primitiva é a escrita pictográfica, ou seja, os caracteres são os pictogramas, espécies de desenhos dos objetos representados. Como exemplo, na antiga escrita egípcia, o pictograma para o peixe era o seguinte: Pictograma peixe A Língua Escrita Manifesta-se Através de Seus Usos É possível reconhecer na escrita acima o desenho do peixe, o que lhe poderia ser considerado universal. Este caráter universal da escrita pictográfica, no entanto, foi muito passageiro. Logo começaram a produzir sinais gráficos mais estabilizados e arbitrários que não tinham semelhança com o que se pretendia representar. Assim, surgiu as chamadas escritas ideográficas, isto é, representavam a idéia de quem queria registrar uma mensagem. Na medida em que os símbolos gráficos deixavam de ser uma imitação mais próxima do objeto representado, estes símbolos tornaram-se convenções. Na escrita egípcia convencionou-se, por exemplo, que peixe passaria a ser representado pelo seguinte ideograma: Ideograma egípcio do peixe 8
  • 10. É possível observar uma simplificação do traçado, tornando-se necessário pertencer à cultura egípcia para saber o que esta representação visual significa. Saiba mais... Esta escrita ideográfica persiste até os dias atuais entre chineses e japoneses. Nos dedicamos, até agora, aos sistemas de escrita que se preocuparam em registrar o significado das palavras e não ao aspecto sonoro da mesma. O primeiro passo no sentido de uma escrita representativa dos aspectos sonoros da palavra foi a utilização de ideogramas ou logogramas com valor fonético. Se a escrita tivesse os seguintes ideogramas, poderíamos combiná-los para a escrita de uma terceira palavra: Observe que nessa combinação, estes ideogramas não estão representando significados, mas dois segmentos sonoros dentro da palavra soldado. Partindo deste enfoque (forma sonora das palavras) o homem inventou a escrita silábica. ☺ A língua que lemos é diferente daquela que ouvimos e falamos Vimos que cada ideograma representa o valor sonoro da consoante. Estes ideogramas correspondiam a significados de palavras iniciadas com as consoantes cujos valores sonoros passaram a representar. Desta escrita lexical/ silábica dos egípcios, os fenícios, povo a que se atribui a origem do alfabeto, extraíram os símbolos que formaram um silabário constituído por grafias que correspondem às consoantes, cabendo aos gregos (herdeiros do alfabeto dos fenícios), introduzir, também, a representação das vogais. 9
  • 11. Podemos afirmar que, numa escrita alfabética, as letras representam as unidades mínimas da palavra, os FONEMAS. A palavra “casa” que numa escrita silábica se comporia apenas de duas unidades Fundamentos e gráficas, numa escrita alfabética passa a possuir quatro. Didática da Alfabetização I As escritas alfabéticas são complexas. A idéia de cada letra representando um determinado som sofre uma série de restrições ortográficas. Em muitos contextos, percebe-se que uma letra pode passar a adquirir um valor sonoro diferente. Saiba mais... Por exemplo, a letra “s” tem o valor sonoro regularmente atribuído à letra “z” quando se encontra entre duas vogais (a palavra “casa”). Para recuperar o seu valor sonoro original, teríamos que utilizar a grafia “ss”. Algumas pessoas não sabem quando devem usar ç, ss, c ou sc para representar o som [s], a não ser que estejam familiarizados com a grafia da palavra que querem escrever. Pode-se concluir que a compreensão da natureza do sistema de escrita e o domínio da ortografia não constituem tarefas simples. Um sistema de escrita pode ser de diversas naturezas e estas formas de representação não são fiéis ao princípio que deu origem. Para refletir... Após a leitura do texto, indique três (03) aspectos dos sistemas de escrita da Língua Portuguesa que você compreende que são importantes para o processo de alfabetização de crianças. _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Para Ler e Compreender Desenvolvimento da Língua Escrita2 Sabe-se, que para aprender a escrever, a criança terá de lidar com dois processos de aprendizagem paralelos: o da natureza do sistema de escrita da língua – o que a escrita representa e como – e o das características da linguagem que se usa para escrever. A aprendizagem da linguagem escrita está intrinsecamente associada ao contato com os textos diversos, para que as crianças possam construir sua capacidade de ler, e às práticas de escrita, para que possam desenvolver a capacidade de escrever autonomamente. A observação e a análise das produções escritas das crianças revelam que elas tomam consciência, gradativamente, das características formais dessa linguagem. Constata- se que, desde muito pequenas, as crianças podem usar o lápis e o papel para imprimir marcas, imitando a escrita dos mais velhos, assim como utilizam-se de livros, revistas, jornais, gibis, rótulos etc. para “ler” o que está escrito. Não é raro observar-se crianças muito pequenos, que têm contato com material escrito, folhear um livro e emitir sons e fazer gestos como se estivesse lendo. 2 Texto extraído do RCN de Educação Infantil. Volume 3. 10
  • 12. Com base nestas informações, que tipo de atividade você considera adequada para alfabetizar crianças? Cite duas e justifique a sua resposta. _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ O Nosso Sistema de Escrita: sua Natureza e a Aquisição da Língua Materna pela Criança Finalidade: Compreender a natureza do sistema de escrita da Língua Portuguesa e como a criança em processo alfabetizatório entende esta língua. Aspecto Psicolingüístico Os Sistemas de Escrita surgiram para servir a um objetivo específico: o de preservar informações relativas à agricultura e ao comércio das sociedades primitivas. Nas sociedades modernas, os usos da língua escrita se multiplicaram, tornando-se um meio essencial de acumulação e de transmissão de informações e de conhecimentos, desempenhando um papel central no processo de educação formal do indivíduo. O homem é envolvido por uma escrita que serve a uma multiplicidade de propósitos e que tem o seu léxico e a sua estrutura gramatical afetados pelos fins a que serve e as pessoas a que se destina. O estilo de um texto escrito muda em função dos usos sociais que envolvem a língua escrita. Escrevemos uma carta e uma receita do mesmo jeito? Como escrevemos uma carta? Apresentamo-nos a uma pessoa específica, iniciando o texto com uma data, saudando a pessoa a quem destinamos a mensagem. Depois, relatamos as nossas notícias para, por fim, apresentamos as despedidas. Não podemos deixar de nos identificar. Como escrevemos uma receita? Começamos indicando o nome do prato, e não há menção ao destinatário da mensagem. Depois, enumeremos os ingredientes para, ao final, explicar o modo de fazer. Usamos a pessoa verbal “eu” neste tipo de texto? Não. Uma carta, no entanto, quando se destina a uma pessoa íntima, será escrita de maneira informal, mas se o destinatário é alguém que ocupa algum cargo importante, é preciso selecionar um estilo mais formal de escrita. Conclui-se que, se a língua escrita varia em função dos seus usos, de sua finalidade e da pessoa a que se destina, então o domínio da língua escrita, por parte de um determinado indivíduo, ser social, refletirá sempre as experiências deste indivíduo com o meio específico de comunicação próprio da sociedade em que se vive. 11
  • 13. Observando situações de fala e escrita de um mesmo texto, é possível verificar suas diferenças. Nestas situações tornam-se mais salientes aquelas diferenças que resultam das distinções entre a modalidade oral e a escrita. Fundamentos e Veja, por exemplo, uma história contada e observe a sua versão escrita, Didática da comparando-as. Esta história de Chapeuzinho Vermelho foi contada por uma Alfabetização I professora aos seus alunos: “Era uma vez, assim vai começar a linda historinha que eu agora vou contar... Era uma vez uma menina linda de olhos bem grandes e azuis. O nome dela era Chapeuzinho Vermelho. Bonito nome, não é? Vocês conhecem alguém que tenha este nome? Chapeuzinho tinha família, morava numa casa que ficava bem no meio da floresta.... Ela tinha pai, mãe, avó. Ela era muito pobre, e ajudava muito sua mãe em casa. Quem ajuda a mamãe em casa aqui? Pois é, aí esta menina ajudava... ela era muito boazinha e obediente. Um dia, quando seu pai saiu para caçar, a mãe chamou: Chapeuzinho? ...Por que será que ela tinha este nome? Será que era porque usava um capuz azul? Mas olhem... ela tem um chapeuzinho vermelho em sua cabeça... aí a mãe disse para ela: Chapeuzinho... vá na casa de sua vovó levar esta cesta com bastante comida porque ela está doente e não pode fazer nada para comer.”. As expressões que identifiquem a presença do interlocutor como “né” e “não é” marcam a presença da oralidade nesta história. Pode-se salientar, ainda, a forma como os enunciados são fragmentados através das pausas assinaladas no texto pelas reticências e através das interrupções que mostram o curso do pensamento, demonstrando que está em construção, em ação. Veja a repetição, a redundância, recursos lexicais como “tá” em vez de “está” e o uso do “aí”. São traços característicos de um texto produzido oralmente na presença de um interlocutor, marcas eliminadas quando o texto é escrito, que pressupõe um interlocutor ausente. O texto escrito é um texto mais cuidadoso do ponto de vista gramatical. O mesmo conteúdo transmitido no trecho acima, se apresentado por escrito, teria a seguinte característica: Era uma vez uma menina tão doce e meiga que todos gostavam dela. A avó, então, a adorava, e não sabia mais que presente dar a criança para agradá-la. Um dia ela presenteou-a com um chapeuzinho de veludo vermelho. O chapeuzinho agradou tanto a menina e ficou tão bem nela, que ela queria ficar com ele o tempo todo. Por causa disso, ficou conhecida como Chapeuzinho Vermelho. A versão escrita do trecho da história de Chapeuzinho Vermelho tem uma outra organização gramatical: as interrupções e as repetições desnecessárias foram eliminadas; os marcadores da presença do interlocutor e uso 12
  • 14. de palavras como “tá” e “aí” também desapareceram, dando lugar a um outro estilo de linguagem. Não fizemos uma análise completa das diferenças existentes entre escrita e fala, mas esperamos que tenha sido suficiente para você se dar conta de que a passagem da oralidade para a escrita é uma tarefa complexa que envolve três aspectos fundamentais: 1) a compreensão da natureza do nosso sistema de escrita; 2) o entendimento da funcionalidade do sistema de escrita; 3) a aquisição de um novo estilo de linguagem. Para refletir... Na Antiguidade grega, berço de alguns dos mais importantes textos produzidos pela humanidade, o autor era quem compunha e ditava para ser escrito pelo escriba; a colaboração do escriba era transformar os enunciados em marcas gráficas que lhes davam a permanência, uma tarefa menor, e esses artífices pouco contribuíram para a grandeza da filosofia ou do teatro grego. A compreensão atual da relação entre a aquisição das capacidades de redigir e grafar rompe com a crença arraigada de que o domínio do bê-á-bá seja pré-requisito para o início do ensino de língua e nos mostra que esses dois processos de aprendizagem podem e devem ocorrer de forma simultânea. Um diz respeito à aprendizagem da escrita alfabética e o outro se refere à aprendizagem da linguagem que se usa para escrever. Você concorda com esta afirmação? Que relação você estabelece com este texto adaptado do PCN de Língua Portuguesa: Ensino de primeira à quarta série (1999), e o texto do Conteúdo 2, A natureza do nosso sistema de escrita e a aquisição da língua materna pela criança? _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Alfabetização e Letramento: Refletindo Conceitos A ALFABETIZAÇÃO pode ser entendida: 1. Como um processo de aquisição individual de habilidades requeridas para a leitura e escrita; 2. Como um processo de representação de objetos diversos, de naturezas diferentes. A perspectiva é que a alfabetização é algo que chega a um fim, e pode, portanto, ser descrita sob a forma de objetivos instrucionais. 13
  • 15. O LETRAMENTO pode ser entendido: 1. Como o ato de ler e escrever que deve começar Fundamentos e a partir de uma compreensão muito abrangente do ato de ler o Didática da mundo, coisa que os seres humanos fazem antes de ler a palavra. Até Alfabetização I mesmo historicamente, os seres humanos primeiro mudaram o mundo, depois revelaram o mundo e, a seguir, escreveram as palavras. 2. Como um fenômeno de cunho social, salientando as características sócio-históricas ao se adquirir um sistema de escrita por um grupo social. Ele é o resultado da ação de ensinar e/ou de aprender a ler e escrever, e denota estado ou condição em que um indivíduo ou sociedade obtém como resultado de ter-se “apoderado” de um sistema de grafia. Letramento é um fenômeno de cunho social e salienta as características sócio- históricas ao se adquirir um sistema de escrita por um grupo social. Ele é o resultado da ação de ensinar e/ou de aprender a ler e escrever, denota estado ou condição em que um indivíduo ou sociedade obtém como resultado de ter-se “apoderado” de um sistema de grafia. Saiba mais... A língua escrita é um sistema de relações, com dois processos: ler e escrever. Na aprendizagem destes processos, a criança percorre longo caminho, passando por estágios evolutivos de elaboração, descritos por Ferreiro e Teberosky (1991). O sucesso na alfabetização exige a transformação da escola em “ambiente alfabetizador”, rico em estímulos que provoquem atos de leitura e escrita, permitam compreender o funcionamento da língua escrita, possibilitem a apropriação de seu uso social e forneçam elementos que desafiam o sujeito a pensar sobre a língua escrita. Dicas para construir uma situação significativa de aprendizagem nas classes de letramento: 1) investigar as práticas sociais que fazem parte do cotidiano da criança, adequando-as à sala de aula e aos conteúdos a serem trabalhados; 2) planejar suas ações visando ensinar para que serve a linguagem escrita e como a criança poderá utilizá-la; 3) desenvolver junto à criança, através da leitura, interpretação e produção de diferentes gêneros de textos, habilidades de leitura e escrita que funcionem dentro da sociedade; 4) incentivar a criança a praticar socialmente a leitura e a escrita, de forma criativa, descobridora, crítica, autônoma e ativa, já que a linguagem é 14
  • 16. interação e, como tal, requer a participação transformadora dos sujeitos sociais que a utilizam; 5) recognição, por parte do educador, implicando, assim, o reconhecimento daquilo que o educando já possui de conhecimento empírico, e respeitar, acima de tudo, esse conhecimento; 6) não ser julgativo, mas desenvolver uma metodologia avaliativa com certa sensibilidade, atentando-se para a pluralidade de vozes, a variedade de discursos e linguagens diferentes; 7) avaliar de forma individual, levando em consideração as peculiaridades de cada indivíduo; 8) trabalhar a percepção de seu próprio valor e promover a auto-estima e a alegria de conviver e cooperar; 9) ativar mais do que o intelecto em um ambiente de aprendizagem, ser professor-aprendiz tanto quanto os seus educandos; 10) reconhecer a importância do letramento, e abandonar os métodos de aprendizado repetitivo, baseados na descontextualização. As investigações no campo da psicologia e da psicolingüística têm contribuído para demonstrar que a criança é um ser que pensa e que constrói ativamente o seu conhecimento do mundo e da língua. Pode-se destacar que uma das contribuições mais importantes que a pesquisa nesta área tem oferecido ao educador consiste em indicar os estágios percorridos pela criança e as hipóteses que formula antes de atingir a concepção que o adulto tem do mundo de objetos que o rodeiam. Os Estudos de Emília Ferreiro: a Psicogênese da Língua Escrita Aspectos Psicolingüístico, Psicológico e Social Na década de 80, a pesquisadora argentina Emília Ferreiro contribuiu para que ocorresse o avanço científico no que diz respeito à compreensão do processo de aquisição de escritas alfabéticas pelas crianças, tomando por base os estudos desenvolvidos por Jean Piaget. Ferreiro demonstrou, de forma contundente, que as crianças constroem várias concepções de escrita antes de atingirem a compreensão do adulto já alfabetizado acerca do nosso sistema de escrita, comprovando que existem formas simples de identificarmos as idéias da criança sobre a escrita, necessitando, para tanto, interpretar os “erros” que elas costumam fazer quando escrevem e lêem. Emília Ferreiro Saiba mais... No primeiro ano escolar, Emília Ferreiro identificou marcas da língua compreendida pela criança da seguinte forma: o primeiro “problema” que a criança precisa resolver ao ser apresentada ao nosso sistema é o de diferenciar a escrita do desenho, pois, para a criança, escrever e desenhar são semelhantes, para ela os objetos podem ser representados através do desenho. Veja a semelhança das escritas mais antigas (pictográficas), que utilizava como 15
  • 17. símbolos gráficos o desenho e a escrita da criança que também considera a idéia de que podemos “escrever desenhando”. O exemplo abaixo ilustra Fundamentos e como uma criança escreveu as palavras que foram Didática da ditadas para ela:3 Alfabetização I Escrita do nome da criança Escrita da palavra “bola” Para que a criança entenda a natureza da escrita alfabética, ela precisa compreender para que escrevemos e como utilizamos as letras. Usar letras significa que a criança entendeu o que elas letras representam? Claro que não! Segundo Rego (1996), as crianças consideram que para uma escrever uma palavra cuja imagem é grande, como “elefante”, é preciso escrever uma porção de letras porque o elefante é um animal grande. Já a palavra “formiga”, escrevem com poucas letras, já que a formiga é bem pequenininha. Este processo é chamado de Realismo Nominal( a criança vê o objeto e não a sua representação gráfica).Também nesta fase, a criança pensa em escrever palavras que significam coisas diferentes com números e combinações de letras diversificadas. A criança, do seu jeito, usa os aspectos formais da escrita, ou seja, busca a quantidade e a variedade de letras para mudar o significado sem se preocupar com a relação existente entre as letras e os aspectos sonoros das palavras. Nos dois exemplos seguintes estão caracterizados os recursos utilizados pela criança durante esta fase: 12CSHJR (escrita do nome próprio: ao diferenciar letra de número, utiliza quantas letras achar necessário para escrever, sem preocupação com a sua pauta sonora) Utiliza desenhos ou rabiscos, também chamados de garatujas A criança, quando começa a compreender que a escrita busca relação com a seqüência de sons da fala, inicia-se no estágio que Ferreiro concluiu como o de fonetização da escrita. O que significa fonetizar a escrita? A fonetização da escrita começa de forma processual, quando a evolução da escrita da criança chega ao momento em que a quantidade de letras que ela utiliza para cada palavra coincide, sistematicamente, com o número de sílabas da palavra. A criança, nesta fase, pode escrever palavras com correspondências quantitativas e qualitativas. É quantitativa quando a criança utiliza o número de letras correspondentes ao número de 3 REGO, L. L. B. (1988) A Literatura Infantil: Uma Nova Perspectiva da Alfabetização a Pré- Escola, São Paulo: FTD 16
  • 18. sílabas de cada palavra (Silábico quantitativo ou sem valor sonoro). É qualitativa quando usa uma letra para cada sílaba, com correspondência sonora (silábico qualitativo ou com valor sonoro). O que estas escritas silábicas significam, segundo Emília Ferreiro? Representam a mudança, a evolução da concepção que a criança tem em relação à escrita: concebe a escrita como representando sílabas. MAO – para macaco (silábico qualitativo ou silábico com valor sonoro) OEI – para macaco (silábico quantitativo ou silábico sem valor sonoro) Saiba mais... Vale lembrar que o alfabeto teve origem na invenção do silabário e é importante destacar que sobrevivem os sistemas de escrita silábico como, por exemplo, a escrita dos japoneses. Compreender a natureza alfabética do nosso sistema de escrita envolve diversos aspectos. Entender que apenas usa-se apenas uma letra para representar cada sílaba não é suficiente. Esta compreensão acontece gradualmente e na evolução da fase silábica para a fase alfabética, a criança produz uma escrita ainda estranha para os adultos, incompleta, pois ela é parte alfabética e parte silábica como no exemplo abaixo: PANLA (para panela) BNCA ( para boneca) A pesquisa de Ferreiro e colaboradores contribuiu para compreender que as escritas infantis compreendidas como indicadoras de “patologia”, são etapas de um processo evolutivo próprio de cada criança, até conseguirem entender como funciona o nosso sistema alfabético de escrita. 17
  • 19. Fundamentos e Atenção! Didática da É preciso interpretar esse desenvolvimento da Alfabetização I mesma forma que incentivamos e interpretamos as primeiras tentativas das crianças quando começam a falar: “aga”, ao invés de água; “mamã”, ao invés de mamãe etc. Esta forma é aceita em determinada fases do desenvolvimento da linguagem. Por que não compreender que a escrita envolve também fase de desenvolvimento? O processo de desenvolvimento da escrita não se encerra com a compreensão de que a escrita alfabética representa as unidades mínimas de sons de uma palavra. Quando a criança escreve alfabeticamente, inicialmente, ela ainda comete muitos “erros” ortográficos, uma vez que escreve como fala e ignora todas as regras convencionais de uma suposta regularidade alfabética. Erros como “tumati” para a palavra “tomate” em crianças recém alfabetizadas demonstram que ainda desconhecem o princípio ortográfico segundo o qual “o” átono final tem som de “i”. Pode omitir, também, o “n” em palavras como “canto”, “tanto” e escrever “cato”, “tato”. Neste caso, ela atribui ao “n” apenas o valor sonoro que tem ao preceder a vogal (natal). Também escreve “sangue” como “sange”. Isso acontece porque a criança regulariza o princípio alfabético e ignora todas as regras que determinam exceções. Saiba mais... Não é de se estranhar que a criança assim proceda, pois, enquanto ser pensante, ela busca gerar hipóteses para resolver seus problemas, mesmo que estas venham posteriormente a serem contrariadas pelos fatos. Se uma criança aprendesse a ler e a escrever simplesmente memorizando a grafia de cada palavra, estes erros, que são muito freqüentes nas escritas iniciais das crianças, não ocorreriam. É preciso que o professor aprenda a perceber a lógica que está por trás do erro. O professor que percebe esta lógica começa a criar condições de desafios e de atividades de sala de aula que levem a criança a compreender os princípios que regem a nossa ortografia alfabética. 18
  • 20. Questão 1 [ ] Agora é hora de TRABALHAR Um Novo ABC “... a preguiça é a chave da pobreza”, afirmava-se ali. Que espécie de chave seria aquela? Aos 6 anos, eu e os meus companheiros de infelicidade escolar, quase todos pobres, não conhecíamos a pobreza pelo nome e tínhamos poucas chaves, de gavetas, de armários e de portas. Chave de pobreza para uma criança de 6 anos é terrível.” 4 Graciliano Ramos refere-se ao processo de alfabetização. A partir dos textos lidos, qual a concepção que você tem sobre a “chave” para abrir a porta do processo de reconhecimento da palavra escrita na alfabetização? __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 4 RAMOS, Gracilinao. Um novo ABC. In: Linhas Tortas. São Paulo: Martins Fontes, 1962. 19
  • 21. Fundamentos e Questão 2 Didática da Nossas escolas, hoje, estão, de fato, alfabetizando ou letrando? Alfabetização I Justifique a sua resposta. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ Questão 3 Escreva V para a alternativa verdadeira e F para a falsa: a) ( ) A escrita e a leitura são práticas sociais em que as crianças, ao imitarem os adultos, fazem uso dessa prática. Isto recebe o nome de letramento, ao contrário da alfabetização, que corresponde à aquisição da língua escrita de modo mecânico, desconsiderando as práticas sociais das quais os alunos fazem parte. b) ( ) Não estão em jogo, no processo de letramento, os conhecimentos relacionados ao uso e função da língua escrita. 20
  • 22. OS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: ANÁLISE NUMA PERSPECTIVA CRÍTICA E REFLEXIVA (Re)visitando os Métodos de Alfabetização Finalidade: Relacionar as diversas concepções e métodos de alfabetização aos seus pressupostos, aprofundando o conhecimento sobre a natureza das atividades de alfabetização pautadas na reflexão sobre a língua e sobre propostas metodológicas de resolução de problemas. Como você aprendeu a ler? Foi difícil? Lembra da professora? Lembra da cartilha? Saiba mais... Ana Maria Machado, em suas memórias, conta que aprendeu a ler muito cedo, decifrando jornais, com a ajuda de algum adulto que lhe ensinava os sons das letras, sem muita sistematização. Ia juntando pedaços de informação e, finalmente, leu, para espanto da sua professora do jardim. Seria um milagre?! No livro Infância, as recordações de Graciliano Ramos (1953) começam pela imagem do pai, que tentou ensiná-lo ameaçando, gritando, apanhando. A cartilha que ele usava era feia e mal impressa, um folheto de papel de qualidade ruim, que rasgava-se entre os seus dedos. Observe o que ele informa quando conseguiu aprender as primeiras letras e descobriu que o sofrimento não tinha acabado: Enfim consegui familiarizar-me com as letras quase todas. Aí me exibiram outras vinte e cinco, diferentes das primeiras e com os mesmos nomes delas. Atordoamento, preguiça, desespero, vontade de acabar- me. Veio o terceiro alfabeto, veio o quarto, e a confusão se estabeleceu, um horror de qüiproquós. Quatro sinais com uma só denominação. Se me habituassem às maiúsculas, deixando as minúsculas para mais tarde, talvez não me embrutecesse. Jogaram-me simultaneamente maldades, grandes e pequenas, impressas e manuscritas. Um inferno... (Ramos, 1953, p. 102). Saiba mais... Boas memórias da alfabetização são as de Bartolomeu Campos de Queirós, que mais de uma vez, em encontros e seminários de professores, falou com saudade sobre Lili, personagem do livro em que aprendeu a ler. Para ele “Lili foi a minha primeira namorada”. 21
  • 23. Estes breves relatos nos fornecem pistas sobre o algumas crianças pensam e sentem – o menino Graciliano e outras – que ficam sem compreender os símbolos miúdos, impressos em preto e branco, marcas que os adultos Fundamentos e pensam que contém palavras e histórias. Como Didática da acontece este processo? Como funciona? Alfabetização I Para as crianças, não faz sentido este tipo de atividade, mas os pais, a professora, a escola exigem que elas aprendam a ler com este processo baseado na cópia, na repetição, na soletração, adivinhação, até aprenderem a ler. Diversas teorias de aprendizagem preocupam-se em explicar como a criança aprende: a) por associação ( behaviorismo, estímulo-resposta); b) pela ação do sujeito sobre o objeto do conhecimento (construtivismo); c) pela interação do aprendiz com o objeto do conhecimento intermediado por outros sujeitos (sociointeracionismo). Essas teorias ora embasam, ora condenam certos métodos e técnicas de alfabetização. O fracasso escolar é um fenômeno social? Este fracasso, antigo e persistente no Brasil, é uma questão de métodos? Desde a década de 80, Carvalho (1987), através de suas pesquisas sobre alfabetização, observou um conjunto de fatores escolares e extra-escolares que podem ser indicadores do processo de evasão e repetência, afetando as classes de alfabetização e de primeira série. Fatores como as condições inadequadas de ensino; turmas numerosas; jornada escolar insuficiente, falta de formação continuada das professoras, métodos mal aplicados e interpretados, desinteressante, ausência de biblioteca e salas de leitura, dentre outros, podem ser determinantes desse fracasso. Os fatores extra-escolares, conhecidos como sociais, são decorrentes de questões familiares: ingresso na escola tardiamente, freqüência irregular, ausência de livros e jornais, pais analfabetos. Considerar esses fatores isoladamente não é adequado para justificar as dificuldades pelas quais o aluno passa, uma vez que existem fracassos sociologicamente previsíveis, assim como existem meninos e meninas pobres, de famílias não escolarizadas, estudando em escolas sem qualidade, que aprendem a ler e a escrever na primeira série. A questão da metodologia não é mais o ponto central ou mais importante na área da alfabetização, e sim quem se propõe a alfabetizar, qual a teoria respalda a prática. Percebe-se que não existe um método milagroso plenamente eficaz para todos. Não existe uma receita para isso. É importante destacar a importância do domínio da prática, por meio da qual as professoras alfabetizadoras modificam, enriquecem o que aprenderam no estudo teórico, valendo-se não só da experiência, mas, sobretudo, da observação. 22
  • 24. Saiba mais... Método (do latim methodu), significa caminho para chegar a um fim. Durante muito tempo, discutiu-se quais métodos seriam mais eficientes, se os sintéticos (que partem da letra, da relação letra-som, ou da sílaba, para chegar à palavra), ou os analíticos ou globais (que têm como ponto de partida unidades maiores da língua, como conto, a oração ou a frase). Método Sintético e Método Analítico: da Parte para o Todo Como escolher um método? Saiba mais... Magda Soares (1991), através de pesquisas realizadas no Brasil, demonstrou que nas décadas de ‘70 e ‘80 a produção de conhecimento voltado para as metodologias de alfabetização foi decrescendo. Segundo Borges (1998), pode-se indicar duas explicações para justificar o desinteresse científico em relação às metodologias: a) os métodos tradicionais (analíticos ou sintéticos) não alfabetizaram o grande número de alunos que chegavam às escolas; b) a intensa divulgação das idéias de Emilia Ferreiro. O foco de como ensinar a ler e a escrever saiu do foco de como o professor ensina para questão de como a criança aprende, gerando mudanças importantes nas pesquisas e nos temas tratados pelos teóricos. Pode-se informar que pesquisas e publicações sobre métodos foram relegadas a segundo plano, tornando-se ausentes da produção científica a partir dos anos 90. Nas condições concretas da escola brasileira, quando uma professora vai escolher um método, Cardoso-Martins (2003) propõe que busque responder às seguintes questões: · Qual é a concepção da leitura, de leitor que sustenta o método? · Os objetivos de alfabetizar e letrar, a preocupação em ensinar o código alfabético é tão presente quanto o objetivo de desenvolver a compreensão da leitura? · São sistematizados os conhecimentos sobre as relações entre letras e sons? · Há motivação para gostar de ler? · O método, a sua fundamentação, é conhecida e faz sentido? · As etapas ou procedimentos de aplicação são coerentes? · O material didático é adequado? Acessível? · O método foi experimentado com êxito em um número significativo de turmas, em contextos escolares diferentes? 23
  • 25. As repostas, sendo satisfatórias, possibilitam que o método escolhido (se bem aplicado) proporcione bons resultados. Fundamentos e Didática da Alfabetização I Atenção! Os métodos sintéticos são: soletração, silabação e métodos fônicos. Os métodos analíticos são: palavração, sentenciação e método de contos. Juntar as Letras: Soletração Quando daria por um daqueles duros bancos onde me sentava, nas mãos a Carta do ABC, a cartilha de soletrar, separar vogais e consoantes. Repassar folha por folha, gaguejando as lições num aprendizado demorado e tardio. Afinal, vencer é mudar de livro (Cora Coralina). A “Carta do ABC” apresentada a Cora Coralina, no começo no século XXI, ainda faz parte das lembranças de infância de muitos professores. São métodos que caracterizam um tempo em que grande parte da população era analfabeta e a soletração não buscava a compreensão do texto, nem formar leitores, uma vez que só trabalhava com palavras soltas. Parafraseando Cora Coralina, leitura compreensiva ficava para segundo plano, “afinal, vencer é mudar de livro”. Saiba mais... Há indícios de que o método continua em uso no início do século XXI, pois o livreto Método ABC: Ensino prático para aprender a ler (sem indicação de autor ou data) ainda pode ser encontrado em papelarias do interior do Brasil. O Ba-be-bi-bo-bu : do Método Alfabético para o Método Silábico O método sintético de silabação ainda continua em uso, mesmo com as pesquisas realizadas por Emília Ferreiro, tanto nas cidades quanto no interior, por ser considerado fácil de aplicar. Porém, nem todos os alunos, jovens, adultos ou crianças, se mostram capazes de entender o mecanismo da combinatória das sílabas, o mecanismos de codificação e decodificação, o apelo excessivo à memória e não à compreensão, o que gera pouca capacidade de motivar os alunos para a leitura e a escrita. A ordem de apresentação dos conteúdos é, ainda, hoje seguida: primeiro, são apresentadas as cinco letras que representam as vogais, em seguida, os ditongos, as sílabas formadas com as letras v, p, b, f, d, t, l, j, m, n. As dificuldades ortográficas aparecerem do meio para o fim do processo alfabetizatório, incluindo os dígrafos, as sílabas terminadas por consoantes e as letras g, c, z, s e x. 24
  • 26. Assim como ocorre na soletração, o método silábico separa os processos de alfabetização e letramento, assumindo o pressuposto de que a compreensão da leitura vem depois da aprendizagem do processo de decodificação. Métodos Fônicos O método fônico, ao ser aplicado pelo professor, investe na dimensão sonora da língua, isto é, para o fato de que as palavras, além de terem um ou mais significados, são formadas por sons, denominados fonemas, unidades mínimas de sons da fala, representados na escrita pelas letras do alfabeto. O método ensina o aluno a produzir oralmente os sons representados pelas letras e uni-los para formar as palavras. O método inicia o processo com palavras curtas, formadas por apenas dois sons representados por duas letras. Em seguida, estudam-se palavras de três letras ou mais. A preocupação é ensinar a decodificar os sons da língua, na leitura; e a codificá-los, na escrita. Método da Abelhinha Alzira S. Brasil da Silva, Lúcia Marques Pinheiro e Risoleta Ferreira Cardoso, educadoras com ampla experiência de ensino e de pesquisa, são as autoras este método que foi experimentado na Escola Guatemala, na cidade do Rio de Janeiro, em 1965. Essa escola foi criada por Anísio Teixeira, vista como um centro de referência para inovações pedagógicas e recebia apoio do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep). O método da Abelhinha apresenta histórias cujos personagens estão associados a letras e sons. Os sons são apresentados como “barulhos” que ocorrem, o mesmo acontecendo com a reunião de dois sons em sílabas. Da reunião de dois sons, a criança passa a três, e vai lendo palavras cada vez mais extensas; depois expressões, sentenças e historinhas (SILVA et al., s/d, p. 7). Saiba mais... A personagem abelhinha, nome do método, tem o corpo em forma de um a (em letra cursiva) e apresenta o som aaaaa (a vogal é prolongada para facilitar o reconhecimento); a letra i é representada pelo tronco de um índio, outro personagem de histórias, e assim por diante. Os personagens são desenhados para sugerir o todo ou partes das formas estilizadas das letras. Há, portanto, uma associação de três elementos: personagem – forma da letra – som da letra (fonema). Alfabetização se faz por síntese ou fusão dos sons para formar a palavra. 25
  • 27. A emissão correta e habilidade para distinguir sons parecidos são preocupações das autoras, que recomendam: Use recursos para levar as crianças a distinguirem sons parecidos: Fundamentos e observar o movimento dos lábios e da língua para pronunciar esses sons; Didática da emiti-los isoladamente ou em palavras por eles iniciadas. Observe que o t Alfabetização I parece estalar; o p lembra a pipa batendo na árvore (pan); o b é o barulhinho da água quando ferve (SILVA, s/d, p. 33). A Casinha Feliz O método Casinha Feliz foi criado pela pedagoga Iracema Meireles (1984), na década de 50. Tem uma longa trajetória de aplicação em escolas públicas e particulares e ainda está em uso. A autora acreditava na aprendizagem por meio do jogo, propondo que a sala de aula fosse um espaço para criatividade e a livre expressão das crianças e começou a “personalizar as letras” e associá-las a figuras do universo infantil. Iracema Meireles disse que ocorreu uma mudança importante quando: [...] observando as turmas que se alfabetizavam, notou que as crianças adoravam as histórias e as letras/personagens, e esqueciam frases e palavras se ficavam alguns dias sem vê-las. Passou a contar as histórias em função de apresentar as letras. Foi uma ousadia para a época (MEIRELES, 2000, p. 258). Meireles (ibid) buscava facilitar a aprendizagem de novas combinações de letras, mas não comungava com as estratégias de memorização próprias da soletração e silabação. As letras são apresentadas como personagem de uma história: papai (p), mamãe (m), nenê (n) e ratinho (r). O recurso didático, de boa qualidade, agradava, mas não era funcional porque as crianças decoravam as combinações de consoantes com vogais, como se faz na soletração (MEIRELES, 2000). A base do método era associar a forma da letra a uma personagem o qual, por sua vez, representava determinado som. Segundo Iracema Meireles, a história central de A Casinha Feliz (1999) pode ser “modificada à vontade e até substituída”. O essencial é que conduza à figura-fonema capaz de fazer sempre, se for consoante, o imprescindível barulhinho. Tudo mais é jogo, é dramatização, atividade criadora (MEIRELES, 2000, p. 34). Atenção! Na aplicação dos métodos fônicos, a maior dificuldade técnica é tentar articular o som das consoantes isoladas, pois, de fato, elas só ganham sons quando estão acompanhadas de uma vogal. Existem algumas consoantes, como o /f/ e o /v/, que podem ser prolongadas com certa facilidade, dando a impressão que fundem som as vogais que as acompanham. Mas não é o caso da maioria das outras que só são ouvidas claramente quando acompanhadas das vogais. Um cuidado que deve ser observado na aplicação dos métodos fônicos decorre da própria natureza do Português, língua alfabética na qual uma letra pode representar diferentes sons conforme a posição que ocupa na palavra, assim como um som pode ser representado por mais de uma letra, segundo a posição. Assim, não basta ensinar o som da letra em posição inicial da palavra, mas é preciso mostrar os sons que as letras têm em posição inicial, medial (no meio) ou final da sílaba. (CARVALHO, 2005, p.122) 26
  • 28. Para refletir... A professora Taís planejou, para o início do ano letivo, na sua classe de alfabetização, o ensino do alfabeto. Para isso, resolveu apresentar uma letra por semana e sempre que ia revisar a letra da semana anterior, percebia que os alunos já haviam esquecido a letra estudada. Então, a professora Taís decidiu conversar com a colega Maria, também professora de alfabetização. Maria disse a Taís que ela trabalha com seus alunos apresentando todas as letras do alfabeto, de uma só vez, a fim de que as crianças possam relacioná-las, de modo significativo, e que surta efeito. As crianças, além de reconhecerem a representação gráfica das letras, também identificam o som que ela representa. :: Avalie a prática das duas professoras. Qual é a que você considera mais adequada? Como você ensinaria o alfabeto aos seus alunos? :: Pontue, após a leitura do texto, aspectos que você considera importantes para o processo de alfabetização de crianças. _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Estimulando a Compreensão da Base Alfabética Já sabemos o longo caminho a ser percorrido pela criança quando tenta compreender a natureza do sistema de escrita que lhe estamos ensinando. Como respeitar o modo de pensar do aluno e contribuir para que ele caminhe na direção da compreensão do nosso sistema de escrita? É óbvio que, se a criança pensa que a escrita representa diretamente o significado das palavras, precisamos reconhecer formas de estimulá-la, desafiando-a para descobrir a natureza alfabética do nosso sistema de escrita. Reconhece-se que a criança que vive em ambientes letrados, normalmente se interessa pela escrita e chega à escola com idéias bastante avançadas em relação ao processo alfabetizatório: a escrita do seu próprio nome, o nome do pai, da mãe, do irmão, até dos amigos que dão grande impulso para as descobertas infantis. Será que está faltando alguma coisa? Em situações informais, os adultos são muito sensíveis às dificuldades motoras das crianças, preferindo inicialmente usar as letras maiúsculas de imprensa, pois estas são de traçados mais fácil que as cursivas. Esta prática é interessante para que o professor estruture situações de sala de aula, em que as crianças sejam encorajadas, desafiadas a escrever os nomes de seu interesse e compare as suas escritas com as dos adultos e com as escritas de outras crianças. Além desta pratica informal, algum tipo de sistematização que chame a atenção das crianças para a natureza do nosso sistema de escrita é de grande ajuda, num momento em que se está querendo que a criança deixe de pensar na escrita como representação direta 27
  • 29. de significados e passe a perceber a relação que existe entre as letras e as cadeia sonora das palavras. Fundamentos e Didática da Alfabetização I Pode-se demonstrar isto de uma forma mais direta para a criança quando categorizamos as palavras através de suas sílabas ou de seus sons. Perceber que as palavras “pato, papel e parafuso” compartilham entre si o mesmo segmento sonoro -pa- pode não ser tão óbvio para uma criança que está que está começando a aprender a ler. As crianças tendem inicialmente a perceber as relações entre significados. Assim, uma criança pode pensar que a palavra “pato” parece com a palavra “bico” porque pato tem bico não se aperceber para a semelhança entre “pato, papel e parafuso” simplesmente porque estas palavras apenas estão relacionadas a que se refere ao som e esse é um aspecto da relação entre palavras para o qual uma boa parte das crianças não está atenta de início. No entanto, esta é uma habilidade crucial quando se trata de compreender escritas alfabéticas e que pode ser estimuladas no dia-a-dia da sala de aula. (CARVALHO, 2005, p. 123) É preciso descobrir formas mais provocativas de levar as crianças também a perceber que existem as inconsistências ortográficas, gerando situações atividades que mostrem, por exemplo, o valor sonoro do “s” e do “r” intervocálicos e de outras regras ortográficas. Entender o princípio alfabético e das suas convenções ortográficas constitui uma das dimensões envolvidas nesta complexa aquisição. A língua escrita tem várias funções relacionadas a determinadas convenções. É necessário considerar o que as crianças podem conhecer sobre esta funcionalidade e sobre as convenções lingüísticas dela decorrentes. Reduzir o ensino da leitura e da escrita apenas à compreensão do sistema alfabético de escrita significa deixar de lado informações igualmente relevantes para a criança, pois que sentido faz escrevermos palavras e frases se esta escrita não encerra em si um valor comunicativo? A criança aprende a falar porque a fala tem funções comunicativas vitais para ela, mas nem sempre estamos alerta para isto quando ensinamos as crianças a escrever. Alguns estudos têm demonstrado que as crianças expostas a atividade de leitura e escrita no seu dia-a-dia tornam-se sensíveis às variações lingüísticas envolvidas no uso da escrita. Estudos desenvolvidos por Carvalho (2005, p. 126) demonstram que Numa classe de pré-alfabetização de uma escola particular observamos que algumas crianças já conseguem antecipar o conteúdo de vários tipos de texto. Ao perguntar para uma criança o que estava escrito no jornal ela respondeu: “Aumentou o preço do feijão, macarrão, arroz, do leite, do pão e de muitas outras coisas”. Embora não seja leitora, esta criança já demonstra uma noção do tipo de informação que aparece escrita no jornal. Esta mesma criança, diante de um envelope contendo uma carta, fingiu ler o seguinte: “Querido papai, eu quero lhe ver amanhã porque eu vou viajar e eu vou mandar um beijão para você”. 28
  • 30. Temos também observado que crianças pequenas produzem rabiscos aos quais atribuem o valor de uma carta fazendo de conta que estão lendo estes rabiscos e produzindo textos como: “Querida mamãe um beijo bem grande para você, minha querida, meu amor da minha vida. Mamãe tem um desenho para você em cima da carta”. Já diante de livros de história, esta mesma criança tenta reproduzir o texto da história. Tudo isto nos mostra que algumas crianças, mesmo antes de aprender a ler e escrever, já estão aptas a produzir textos que refletem um domínio rudimentar das características da linguagem que usamos para diferentes tipos de texto. Percebe-se que se a alfabetização ficar apenas restrita aos textos artificiais das cartilhas, o alfabetizando que não tem oportunidade de interagir com textos em seu ambiente de família, termina apenas por aprender a utilizar uma escrita totalmente alheia aos seus usos na sociedade. Muitas crianças que são alfabetizadas desta maneira reproduzem as frases típicas de cartilha quando são solicitadas a produzir uma história. Atenção! A leitura e a escrita precisam ter significado funcional na vida das crianças. Necessário se faz transformar o processo alfabetizatório, baseado no treinamento perceptual e motor, período que precede a alfabetização e ao treinamento de correspondências grafo-fônicas, num ambiente letrado no sentido funcional do termo. Por que as Crianças Trocam Letras ao Escrever?5 Quando os alunos estão aprendendo as convenções do sistema alfabético, é comum alguns cometerem trocas entre P e B, T e D, F e V. Essas trocas ocorrem devido ao fato desses sons serem muito parecidos em sua realização no aparelho fonador e, por isso, ao escrever, surgem dificuldades em diferenciá-los. Tecnicamente, esse grupo de letras (P/B, V/F, T/D) é chamado de “pares mínimos”. Esses sons são produzidos expelindo-se o ar do mesmo modo, do mesmo ponto de articulação, diferindo apenas porque em um (exemplo, o/b/), as cordas vocais vibram, enquanto no outro som (exemplo, o/p/) elas não vibram. A maioria dos alunos que apresenta tal dificuldade na escrita, não tem problemas em compreender ou falar as palavras com esses mesmos sons. Isto é, ao ouvirem, por 5 Texto elaborado por Patrícia Waltiack, assessora pedagógica da Editora Positivo. Material impresso. 29
  • 31. exemplo, alguém falar “pote”, não a confundem com “bote”, assim como, ao se expressarem oralmente, articulam bem uma e outra palavra. Para a maioria desses alunos, a questão parece residir na dificuldade Fundamentos e de analisar fonologicamente os segmentos sonoros na hora em que estão Didática da escrevendo. Alfabetização I Assim, pode-se oportunizar ao aluno atividades que o ajudem a realizar essa análise. Ao fazer comparações com as diferentes formas de escrita (FACA e VACA, por exemplo) e ao evidenciar as correspondências letra-som, o aluno se dará conta de que, em nosso sistema de escrita, existe uma única e definida letra para notar o som em questão. Desta forma, fica evidente a necessidade de promoção do desenvolvimento da consciência fonológica, ou seja, o aluno deve aprimorar sua capacidade para distinguir o fonema na cadeia da fala (o som) para poder escrever ou para transformar as combinações dos sinais gráficos em seus correspondentes significados. Questão 1 [ ] Agora é hora de TRABALHAR Consideramos uma criança alfabetizada quando reconstrói o sistema lingüístico de maneira a representar a língua a partir de relações grafema-fonema. O que o professor alfabetizador pode planejar como atividade que funcione como boa situação de aprendizagem referentes à relação da língua falada com a escrita? __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 30
  • 32. ANÁLISE REFLEXIVA DA LEITURA, ESCRITA E CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO NO PROCESSO INICIAL DE ESCOLARIZAÇÃO: A ALFABETIZAÇÃO PRÁTICAS DISCURSIVAS NAS CLASSES DE ALFABETIZAÇÃO O Processo de Alfabetização: Apropriação de Muitas Linguagens Para refletir... A leitura e a escrita fazem parte do dia-a-dia da sala de aula a partir da pré-escola. Se as crianças ainda não são leitoras, é possível que a própria professora leia para elas e que escute as leituras de faz-de-conta das crianças. Caso as crianças ainda não escrevam, é interessante que aceitemos as interpretações que elas dão aos seus próprios rabiscos. Estas pseudos-leituras e estas pseudos-escritas são processos iniciais naturais das futuras leituras e das futuras escritas. Quando a professora descobre quais são os tipos de texto que mais interessam às crianças, lendo estes textos e estimulando-as a lerem e a escreverem, ela está contribuindo não só para motivar o aluno para aprender a ler e a escrever, mas também fornecendo-lhes os modelos dos estilos de linguagens peculiares a vários tipos de texto. Recentemente, a reescrita e a releitura de textos lidos previamente em sala de aula pelo professor tem sido uma atividade amplamente utilizada em escolas que seguem uma orientação construtivista. Sabemos que muitas crianças que vão para o exterior terminam por aprender a se comunicar numa segunda língua, simplesmente porque têm oportunidade de usar esta língua em contexto comunicativos. Um fato que tem chamado a nossa atenção, como a de outros pesquisadores, é que crianças regularmente expostas à leitura de certos tipos de texto podem possuir idéias bastante avançadas em relação à língua que aparece em determinados textos. Os nossos estudos têm enfocado principalmente as histórias infantis, mas nada impede que esse fenômeno também ocorra em relação a outros tipos de texto. O nosso primeiro exemplo envolve duas crianças que estão fazendo de conta que lêem um livro. O livro pretensamente lido é O Fogo no Céu (de Mary França e Eliardo França, Editora Ática) e o texto contido no livro é o seguinte: “O bode falou para o rato: O céu pegou fogo! O rato falou para a pata: O céu pegou fogo! A pata falou para o galo: O céu pegou fogo! Fugiu o rato, fugiu o galo, fugiu a pata. Fugiu o bode. O bode viu a coruja e falou: Foge coruja! O céu pegou fogo e o fogo vai cair na mata! A coruja viu o céu e falou: O fogo é um balão de São João! 31
  • 33. O bode falou: um balão de São João? Vamos apagar o balão? O fogo não pode pegar na mata. O balão caiu, O bode apagou o fogo e pendurou o balão. E todos deram viva a São João”.. Fundamentos e Didática da O texto produzido pela primeira criança, Lucilene, ao fazer de conta que lia Alfabetização I o livro “O Fogo no Céu” foi o seguinte; “O bode disse para o rato: O céu pegou fogo! O rato disse para a pata: O céu pegou fogo! A pata disse para o galo: O céu pegou fogo! O rato fugiu, O galo fugiu, O bode fugiu. O bode encontrou a coruja e disse: Foge coruja! O céu pegou fogo! A coruja disse: É um balão de São João! Vamos apagar o balão? Apagaram o fogo e deram viva a São João”. Já a reprodução do texto do livro “O Fogo no Céu” feita por uma outra criança, Fernanda, da mesma classe de Lucilene, foi a seguinte: “Aí o rato viu o bode e falou com o bode. Aí o rato falou para a pata: O céu pegou fogo! Correu o rato, correu a pata, correu o bode. Aí o bode falou para a pata: o céu pegou fogo. Bora apagar o fogo de São João ? Aí deu viva a São João.” (BAJARD, 2002, p. 35) Lucilene conhece o texto do livro, ela faz uma reprodução mais fiel ao estilo do livro. Já Fernanda reproduz o texto num estilo mais próximo da linguagem oral usando expressão “Aí” e outras também coloquiais como “bora”. Lucilene demonstra maior familiaridade com o estilo de linguagem do livro exemplificado. Exemplos como estes sevem para ilustrar um fenômeno já explorado por alguns pesquisadores: crianças que desde cedo são expostas e exploram textos escritos têm desempenho superior em leitura e produção de textos. Uma exposição precoce à leitura e à escrita na escola é, sobretudo, importante para aquelas crianças que, em casa, têm pouca oportunidade de interagir com estes tipos de texto. A alfabetização não é apenas um processo de aquisição de leitura e escrita, discussão já superada. A compreensão da alfabetização como processo de apropriação de diferentes linguagens (escrita, matemática, das ciências, das artes e do movimento - teatro e dança, sem esquecer as mídias interativas), terá como finalidade as concepções de conhecimento, de aprendizagem e do desenvolvimento pelo qual as crianças fazem as suas conquistas. A alfabetização constitui-se, então, numa atividade interativa, interdiscursiva de apropriação de diferentes linguagens produzidas culturalmente. Dentre elas, situa-se a escrita como um artefato presente em todas as atividades das sociedades letradas, e, portanto, buscada pelo escritor até mesmo como uma forma de inserção social, um posicionamento grupal ou ainda uma demarcação territorial. Segundo Braslavsky (2000, p. 34), é necessário, 32
  • 34. deste modo, compreender que , no processo de alfabetização, o convívio com a linguagem escrita deve ser atividade real e significativa, na qual as crianças interagem com diferentes conhecimentos, com o professor, sua intencionalidade e a linguagem escrita em suas diferentes manifestações. Essas diferentes manifestações se referem ora aos estilos, ora às técnicas, ora às possibilidades de ambas. Para aprender a ler e escrever, é necessário que o aluno sinta a sala de aula como um lugar onde as razões para ler (e escrever) são intensamente vivenciadas. A escrita só irá ganhar esses contornos se o professor, desde muito cedo, começar a abordá-los. A escrita infantil tem sabor de utilidades: · para produzir uma receita, esta precisa se pautar em degustação; · para escrever uma carta ao prefeito da cidade, essa carta necessita ser endereçada a ele; Atenção! Com o crescimento da produção, cresce também o nível de cobrança em relação a ela. O que não é permitido aqui é deixar a criança, diante da impossibilidade de execução, traduzir essa como incompetência pessoal. Em relação à escrita, sempre há uma possibilidade de o escritor resolver o impasse, ou o problema encontrado, no entanto, da mesma maneira, isso acontecerá com o domínio e às possibilidades reais do aluno. Em relação ao aluno, a impossibilidade é momentânea. Lembramos que o nosso trabalho de ensino-aprendizagem é sempre com o possível e não com o limitado. Para refletir... Com base na leitura do texto, elabore duas situações de aprendizagem na alfabetização, contemplando os conteúdos abordados. Alfabetização e Produção de Textos: Construindo Saberes Como trabalhar com textos na alfabetização? Se a criança não sabe ainda ler palavras simples, poderá ler uma história? E possível alfabetizar sem ensinar as letras uma a uma? A alfabetização a partir de histórias, orações ou frases tem sido praticada com êxito há muitas décadas. Por acreditar que trabalhar com pequenos textos naturais - sejam histórias, noticias, poemas etc., é uma possibilidade interessante, apresentaremos algumas sugestões. Atenção! Para aprender a ler é preciso conhecer as letras e os sons que representam, com sentido, compreender o que está escrito. Os textos poderão ser favoráveis para enfocar estas duas facetas da aprendizagem: a alfabetização e o letramento. 33
  • 35. O que é um texto? A raiz da palavra texto é a mesma da palavra tecer. O texto é um “tecido” Fundamentos e feito com palavras, assim como o pano é um tecido de fios. Sabemos que fios Didática da soltos não formam um tecido, assim como palavras soltas, desconexas, sem Alfabetização I um sentido que as aproxime, não formam um texto. Um texto pode ser curto ou longo: uma frase ou uma oração que expressa um significado completo podem ser um texto. Assim, um texto é mais do que a soma de palavras e frases. Então, uma lista de frases estereotipadas das cartilhas do tipo O boi baba, A baba bebe, O ovo é da ave, etc. não podem ser caracterizar como um texto. As pessoas que falam determinada língua reconhecem e produzem textos nessa língua, distinguem os que fazem dos que não fa-zem sentido. Uma passagem que é incoerente ou absurda causa um estranha-mento nos ouvintes ou nos leitores. Para compreender e saber produzir textos, as pessoas possuem uma competência lingüística denominada competência textual. As crianças pequenas possuem essa capacidade, que pode ser melhorada por meio de exercícios e atividades orais e escritas. Trabalhando com Textos Escritos: Escrever para Aprender Observe estes dois textos. O primeiro retrata as lições encontradas nas cartilhas (frase isoladas, colocadas em seqüência, sem título). Não retrata língua viva que falamos ou escrevemos, tem o único o propósito de exercitar a criança, de treiná-la na aprendizagem de palavras com as letras z, m, b e i. Texto n. 1 Zazá é uma menina. Zazá é uma menina bonita. Zazá mora na Ilha. Texto n. 2 Chapeuzinho Vermelho Era uma vez urna menina chamada Chapeuzinho Vermelho. Um dia, sua mãe mandou que ela levasse uma cesta cheia de coisas gostosas para a vovó. A garota foi e no caminho encon-trou o lobo. O texto 2, apesar de simples, faz sentido, é compreensível, transmite uma idéia, está escrito de acordo com as convenções da escrita do Português, diferente do texto cartilhesco. Os recursos usados pelo autor para evitar repetições de palavras precisam ser destacados: o pronome ela e o substantivo garota referem-se a Chapeuzinho Vermelho. A mãe de Chapeuzinho, o texto diz sua mãe. Quanta coisa é preciso saber para compreender uma pequena história! Entendemos o sentido global do texto devido a nossa experiência anterior com a língua oral e escrita e também ao nosso conhecimento do mundo. Assim, aprendemos que nas histórias de fadas os animais falam e aceitamos essa convenção, por isso não nos surpreende que o lobo converse com Chapeuzinho. Oferecer situações significativas para a criança aprender a ler e, principalmente, despertar o desejo, a vontade de ler é o propósito de todo professor alfabetizador, alternativa 34
  • 36. melhor do que oferecer à criança desenhos prontos para colorir e/ou pontinhos para unir e criar um clima de interesse e receptividade em relação a leitura e a escrita. Para isso, a professora precisa ter à mão livros infantis, jornais, revistas, muito material escrito, de todo tipo, para olhar, manipular, manusear, adivinhar. A criança que folheia livros e revistas acaba se perguntando: o que isso quer dizer? Ao observar livros infantis, as crianças inventam histórias inspiradas nas ilustrações. Criam narrativas para si mesmas e para os colegas. As histórias narradas pela professora e pelos alunos também tem um grande papel na educação da criança: elas alimentam a imaginação e o sonho, melhoram a expressão verbal, aguçam a curiosidade, criam amor pelos personagens, pelas palavras, pelos livros. Ao ouvir as histórias em voz alta, as crianças aprendem aos poucos sobre sintaxe (a forma pela qual as frases são organizadas para fazer sentido) e o léxico ou vocabulário da língua escrita. Isso vai ajudá-las a aprender a reconhecer de ouvido as normas lingüísticas que regem a escrita, mesmo que ainda não saibam empregá-las. O domínio da escrita é um aprendizado de longa duração que começa na alfabetização e se estende por muitos anos. Para refletir... A professora Joana acredita que para alfabetizar as crianças precisa fazer com que elas aprendessem as letras e seu som correspondente. Então, resolveu apresentar a família silábica ba- be-bi-bo-bu durante uma semana. Ao acabar este período, percebeu que as crianças não compreendiam que ao mudar uma letra da sílaba, necessariamente, o fonema alterava-se. Observou que as crianças não atribuíam significado às sílabas trabalhadas. Reflita sobre a estratégia utilizada pela professora e proponha uma alternativa metodológica para o alcance da aprendizagem esperada. A escolha dos Textos para a Classe de Alfabetização: a Pesquisa do(a) Professor(a) A escolha dos textos Qual texto escolher para as s crianças? O tema e os significados do texto escolhido são decisivos no momento de começar o ensino sistemático da leitura. 35