Conferência SC 24 | Gestão logística para redução de custos e fidelização
Reformas previdenciárias na América Latina enfrentam desafios demográficos
1. ESPECIAL
PENSÕES
Bomba-relógio
Os modelos de previdência social na região precisam de reformas diante do
aumento demográfico esperado. As receitas são múltiplas
David Cornejo, de Santiago
E
m janeiro, o ministro de Finan- ca Latina seja ainda jovem se compara- versível. A América Latina conta com
ças do Japão, Taro Aso, surpre- da com o Japão, os níveis esperados de múltiplos modelos de pensões, com o Es-
endeu o público durante uma crescimento demográfico dão sinais da- tado e a iniciativa privada participando
reunião do Conselho Nacio- quilo que nos espera, se não implemen- de diferentes medidas e coberturas. Mas
nal sobre Reformas na Previdência So- tarmos sistemas de pensões universais e as reformas necessárias não estão sendo
cial. “Não desejo a ninguém ser obri- sustentáveis no tempo. discutidas em todos os países. “Debate-
gado a viver quando se quer morrer. Eu Por décadas, a região caracterizou- -se mais em países envelhecidos, como
acordaria me sentindo mal se soubesse -se por altas taxas de natalidade, famí- Uruguai ou Argentina, do que em na-
que meus tratamentos são pagos pelo go- lias numerosas e um excedente de mão ções como Guatemala ou Nicarágua, nas
verno”, afirmou na ocasião. “O proble- de obra. No entanto, está transformando quais a população ainda tem uma compo-
ma não se resolverá a menos que eles te- sua demografia, com uma taxa de natali- sição jovem”, comenta o diretor da Divi-
nham pressa para morrer”, acrescentou, dade que cai a cada ano e um aumento da são de Desenvolvimento Social da Cepal
referindo-se aos idosos japoneses. expectativa de vida. Segundo números (Comissão Econômica para a América
As frias palavras do ministro não fo- da ONU (Organização das Nações Uni- Latina e o Caribe), Martín Hopenhayn.
ram bem recebidas em um país onde das), a percentagem da população acima Uma ampla capacidade fiscal, a per-
25% da população tem mais de 60 anos. de 65 anos triplicará até meados deste sé- centagem de população urbana e a de
Na verdade, Aso (que tem 72 anos) ex- culo, superando 20% do total. trabalhadores com emprego formal são
pressou de maneira pouco hábil sua pre- Enquanto nossos países continuam jo- fatores que também incidem na impor-
ocupação com a elevação dos gastos em vens, estamos em tempo de implemen- tância que se dá às pensões. “No Méxi-
pensões e saúde pública, que levaram o tar sistemas de pensões que consigam co, em estados rurais ou indígenas como
governo a aumentar em 10% os impos- sustentar um processo que não pode ser Chiapas, a cobertura é de 20% de pessoas
tos sobre o consumo. Embora a Améri- arrumado na última hora – e que é irre- no sistema de pensões obrigatório, dife-
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2. rente da Baja California e outros estados O Brasil conta com um sistema estati- Quem coloca o dinheiro
mais industrializados, que contam com zado, ainda que com a possibilidade de Além das características de cada siste-
60% ou 70% de cobertura”, afirma o se- acesso a um sistema privado de poupan- ma, o grande problema na América La-
cretário-geral da Ciss (Conferência Inte- ça como complemento. “Estas pensões tina é a ampla margem de trabalhado-
ramericana de Previdência Social, na si- privadas complementam a previdência res informais, que não estão inseridos
gla em espanhol), José Gabriel Martínez. social, que é muito pequena. Por isso o em nenhum sistema de pensões. “A lu-
Brasil vai adiante, onde até as empresas ta contra as altas taxas de informalidade
Idoso público-privado têm sistemas próprios de apoio previden- que se dão em muitos países deveria ser
Enquanto o relógio continua correndo, ciário”, afirma o responsável pela área a primeira e principal forma de aumen-
cada país testa sua receita. Há tanto os de Aposentadoria, Risco e Finanças da tar o número de contribuintes”, comen-
modelos de capitalização individual e Mercer, Cristian Miranda. A consulto- ta o vice-secretário-geral da Oiss (Orga-
gestão privada, aplicados no Chile, Mé- ria publicou, em outubro passado, o Índi- nização Ibero-americana de Previdência
xico, Colômbia e Peru, quanto aqueles de ce Global de Pensões 2012, um ranking Social, na sigla em espanhol), Jacob Sán-
distribuição e gestão pública, como nos dos 18 melhores modelos de aposentado- chez. A falta de registro profissional for-
casos do Brasil e da Argentina. ria, que tem o objetivo de revelar as defi- mal produz uma grande parte dos idosos
Tradicionalmente, a América Lati- ciências dos sistemas e suas oportunida- sem pensão ou, no melhor dos casos, com
na contou com sistemas de pensões de des de melhoria. O primeiro lugar ficou pensões solidárias de valores muito bai-
distribuição, com grande participação com a Dinamarca; da América do Sul, a xos, financiadas pelo Estado.
do Estado e um fundo comum. O pri-
meiro país a romper este paradigma foi
o Chile, em 1982. Foi quando se imple- O sistema de capitalização individual ganhou
mentou um sistema de capitalização in- espaço nas economias da América latina
dividual com administradoras priva-
das, as AFPs. melhor colocação foi a do Chile (8º lu- Esses sistemas de pensões não con-
Uma década depois, outros nove paí- gar), seguido pelo Brasil (11º). O curio- tributivas vão desde as que correspon-
ses implementaram, ao menos de forma so é que essas duas primeiras colocações dem ao salário-mínimo do país, co-
parcial, sistemas de capitalização indi- na região correspondem a um sistema de mo na Colômbia, àquelas que são uma
vidual. A grande exceção é a Argentina, capitalização individual e a outro de dis- quarta parte desse valor, como no Méxi-
Ilustraçãos: Shutterstock
que voltou atrás em seu sistema de capi- tribuição estatal, o que demonstra não co. Lá, existe desde 2008 um programa
talização estatizando as pensões em um existirem receitas únicas. de pensões desse tipo para pessoas com
sistema de distribuição em 2010. E isso Por outro lado, a fusão de modelos 65 anos ou mais. Desde o mesmo ano, o
se deu em um contexto de estatizações põe em questão a classificação privado- Chile equilibra seu sistema privado com
dos governos Kirchner. -estatal. As sutilezas de cada um fazem pensões básicas solidárias para pesso-
com que hoje sejam classificadas prefe- as que nunca contribuíram, por um va-
rencialmente três variáveis: se contam lor que corresponde aproximadamen-
ou não com pensões não contributivas; te à metade do salário-mínimo chileno.
se dispõem de um sistema contributivo, São reformas complexas, considerando
público ou privado; e se preveem a pos- que, por um lado, os Estados buscam ga-
sibilidade de uma poupança voluntária rantir um mínimo para pessoas sem con-
que complemente o valor da pensão bá- tribuição previdenciária e, por outro, de-
sica. “Antes se contrapunham os siste- vem incentivar a inserção no sistema de
mas de distribuição com os de capitali- poupança. “Países como Bolívia, Peru ou
zação, mas hoje eles estão misturados”, Paraguai já têm programas de benefícios
afirma Martínez, da Ciss. Desde 2007 não contributivos. Contudo, para não de-
existe um convênio multilateral ibero- sestimular a inclusão em sistemas formais,
-americano de previdência social, que o valor desses benefícios é sempre menor”,
permite o entrecruzamento e reconhe- afirma Sánchez, da Oiss. Os fatos indicam
cimento das pensões entre países. Ele que devemos pensar no longo prazo. Em-
foi assinado por Argentina, Bolívia, bora previsíveis, as mudanças demográfi-
Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, cas não têm volta. Nenhum político latino-
Equador, El Salvador, Paraguai, Peru, -americano desejaria emitir declarações
Uruguai e Venezuela. como as do ministro japonês.
Março, 2013 AméricaEconomia 47
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