Resumo
Não é raro observar a deterioração prematura das estruturas de concreto como pontes, viadutos, píeres e prédios devido à corrosão das armaduras. Muitas vezes, esta deterioração está relacionada à ausência de avaliações do estado de conservação das estruturas. A melhor maneira de avaliar periodicamente as estruturas é por meio do exame visual detalhado da superfície de seus elementos. Com base na gravidade das patologias observadas, bem como no conhecimento da agressividade ambiental, das características e do histórico da estrutura, outras técnicas são também aplicadas. Dentre elas, destaca-se a medida elétrica da resistividade do concreto. Essa medida é, usualmente, associada à medida eletroquímica do potencial de corrosão e/ou da taxa de corrosão das armaduras. Esta associação é muito importante para a avalição do risco de corrosão das armaduras das estruturas durante as inspeções em campo. Nesse artigo, a avaliação desse risco é discutida, com base na realização da medida da resistividade elétrica do concreto.
Abstract
It is not unusual to premature deterioration of concrete structures such as bridges, overpasses, piers and buildings due to reinforcement corrosion. Often, this deterioration is related to the lack of assessment of structures conservation status. The best way to the periodic evaluation of the structures is through detailed visual examination of the surface of its elements. Based on the severity of the observed pathologies, as well as knowledge of environmental aggression, the characteristics and history of the structure, other techniques are also applied. Among them, there is the electrical measurement of concrete resistivity. This measurement is usually associated with the electrochemical measurement of the corrosion potential and / or reinforcement corrosion rate. This association is very important for the evaluation of the risk of corrosion of the reinforcement of the structures during inspections in the field. In this Article, the assessment of this risk is discussed, based on the realization measuring the electrical resistivity of the concrete.
Aplicação de técnicas não destrutivas na determinação do teor de umidade inte...
Techne 2013 200_resistividade eletrica na avaliação do risco de corrosao
1. 66 Téchne 200 | NOVEMBRo de 2013
artigo
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Resistividade elétrica do concreto
na avaliação do risco de corrosão
nas estruturas atmosféricas
Adriana de Araujo
Pesquisadora do Laboratório de Corrosão
(LCP) e Proteção do Instituto de Pesquisas
Tecnológicas (IPT)
aaraujo@ipt.br
Zehbour Panossian
Diretora de Inovação do IPT
zep@ipt.br
Não é raro observar a deterioração
prematura das estruturas atmos-
féricasdeconcretoarmado,comopon-
tes, viadutos, píeres e prédios, devido à
corrosão das armaduras. Frequente-
mente, a corrosão é resultante da pre-
sença de teores críticos de íons cloreto
no concreto ou do abaixamento do seu
pH devido a reações com compostos
presentes no ar atmosférico, especial-
mente o dióxido de carbono (reações
de carbonatação) (Glass,2003).
Usualmente, o risco de corrosão é
avaliado quando da realização de inspe-
ções visuais periódicas que verificam o
estadodeconservaçãodasestruturas.Na
maioria das vezes,esta inspeção consiste
do exame visual detalhado da superfície
doconcreto.Combasenagravidadedas
patologiasobservadas,bemcomonoco-
nhecimento da agressividade ambiental,
das características e do histórico da es-
trutura, outras técnicas são também
aplicadas.Dentreelas,destaca-seamedi-
da elétrica da resistividade do concreto
que é associada à medida eletroquímica
dopotencialdecorrosãoe/oudataxade
corrosãodasarmadurasparaaavaliação
doriscodesuacorrosão.
Aresistividadeelétricaéoinversoda
condutividade elétrica,podendo ser de-
finida como uma propriedade física do
concreto que indica a sua resistência à
passagem de corrente elétrica (Zaccardi
etal.,2009).Alémdisto,éumparâmetro
importante para indicar o grau e a dis-
tribuição de umidade no concreto, a
presença de íons cloreto e a taxa de cor-
rosão da armadura (Bertolini et al.,
2004; Schiessl; Weydert, 1996). Sendo
assim, pode-se dizer que a resistividade
do concreto está relacionada com a vida
útildasestruturas.Naetapadeiniciação,
a sua medição, no decorrer do tempo,
pode indicar alteração da umidade do
concreto e, indiretamente, a penetração
de íons cloreto e, na etapa de propaga-
ção, a intensidade da corrosão da arma-
dura(Zaccardietal.,2009;Polder,2001).
As características físicas e químicas
do concreto têm grande influência na
resistividade elétrica do concreto. Ci-
ta-se a permeabilidade do concreto
que determina o transporte de dife-
rentes agentes na rede de poros inter-
conectados da matriz de cimento, em
destaque a mencionada penetração da
água (contaminada ou não com íons)
(Glass, 2003; Nagi; Whiting, 2004).
Quanto maior é a penetração da água,
maior será o grau de umidade do con-
creto (também descrito na literatura
como grau de saturação). Este grau
controla a resistividade elétrica do
concreto de cobrimento da armadura
(Enevoldsen et al., 1994). Quanto
maior é o grau de umidade do concre-
to, menor será a sua resistividade elé-
trica, ou seja, mais facilitado é o fluxo
da corrente elétrica no mesmo.
Cita-se que as estruturas atmosféri-
casestãoexpostasadiferentescondições
ambientais que propiciam a umidifica-
ção do concreto.O transporte da água e
de seus vapores sempre ocorre quando
há um gradiente de umidade entre o
ambienteeoconcretoecomasuaexpo-
sição à água pluvial. Quanto maior é a
duraçãodoperíododeexposiçãoàágua
pluvial, maior pode ser a quantidade de
águaquepenetraparaointeriordocon-
creto(Andradeet.al,1999).
Aintensidadedacorrosãodasarma-
duras está diretamente relacionada com
a umidade do concreto, ou seja, com a
sua resistividade elétrica (Andrade et al.,
1999; Gulikers, 2005). Um grau crítico
deumidadeéfundamentalparaoinício
da corrosão da armadura.As reações de
corrosão só ocorrem quando a superfí-
cie da armadura está em contato direto
com a fase líquida do concreto, ou seja,
com a solução aquosa eletrolítica que
preenche a rede de poros e capilares.
Além disto, o aumento da umidade re-
sulta no aumento da área de armadura
emcontatocomasoluçãoaquosaefavo-
rece a dispersão dos produtos de corro-
sãoformadosnasuperfíciedoaço,sendo
queambospodemacelerarataxadecor-
rosão(Feliuetal,1989).
Para a corrosão, também é funda
mentalapresençadeoxigêniodissolvido
na solução eletrolítica. Em geral, assu-
me-se que o oxigênio controla o proces-
so de corrosão em concreto, devido ao
seuacessolentoatéasuperfíciedaarma-
2. 67
Figura 1 – Esquema de célula de corrosão eletroquímica
dura. No entanto, em estruturas atmos-
féricas nem sempre isto é válido,
podendo o processo de corrosão ser
controlado pela resistividade elétrica do
concreto(Alonsoetal.,1988).
Como exemplo prático da influência
daáguaedooxigênio,cita-sequeataxade
corrosão da armadura é insignificante
quando o concreto está muito seco
(pouco eletrólito), mesmo havendo o
livreacessodooxigênionasuasuperfície.
Nocasodeumconcretosaturado(máxi-
movolumedeumidade),ataxadecorro-
são também é muito lenta, devido à res-
triçãodoacessodeoxigêniodissolvidono
eletrólito.Noentanto,casooconcretoes-
teja úmido, mas não saturado, espera-se
umprocessointensodecorrosão(Schies-
sl;Weydert,1996;Polder,2001).
Uma célula de corrosão eletroquími-
ca é esquematizada na figura 1.Nela,são
apresentadas, simplificadamente, as rea-
ções indicadas na literatura como repre-
sentativas do processo de corrosão do
aço-carbonoemconcreto.Naregiãoanó-
dica,ocorreoxidaçãodometal(Fe→Fe2+
+ 2e) e,na catódica,redução do oxigênio
dissolvidonoeletrólito(O2 +2H2O+4e-
→ 4OH-
).Entre estas regiões,há forma-
ção de um circuito elétrico: no metal há
conduçãodecorrenteelétricadenatureza
eletrônica e, na solução de água de poro
(eletrólito),conduçãodecorrenteelétrica
de natureza iônica e, na interface metal/
meio,corrente elétrica decorrente das re-
açõesdetransferênciadecargas.
Conforme mostra a figura, na solu-
ção, a condução de corrente elétrica
iônicaéfunçãodamovimentaçãodeíons
livres (partículas com carga elétrica). A
medida da resistividade elétrica indica
exatamente a resistência do concreto ao
fluxo da corrente elétrica iônica gerada
porestamovimentação.Quantomenoré
a resistividade elétrica do concreto, mais
facilitado será este fluxo e, assim, mais
propensas as armaduras estão à corrosão
(Sadowshi,2010).Naprática,diz-sequea
corrosãoéquasecertaquandoaresistivi-
dade elétrica do concreto é baixa e a ar-
maduraestádespassivada.
Diferentes fatores interferem no
fluxo da corrente elétrica iônica. Como
exemplo, cita-se a temperatura da solu-
ção de água de poro.O seu aumento fa-
cilita a mobilidade dos íons (Polder,
2001; Nagi; Whiting, 2004). Segundo
estudodeSchiessleWeydert(1996),um
aumento em torno de 10 °C é suficiente
para reduzir a resistividade elétrica do
concretoem50 %,enquantoumadimi-
nuição da mesma ordem de grandeza
(-10 °C)dobraaresistividade(100 %).
O tipo de íon presente na solução
também interfere no fluxo de corrente
elétricanoconcreto.Osíonsdealtamo-
bilidade,como é o caso dos íons cloreto,
intensifica a corrente iônica, acelerando
acorrosãodoaço-carbono(Broomfield;
Millard, 2002). Por outro lado, a carbo-
natação do concreto tem efeito inverso
ao dos íons cloreto, pois as suas reações
resultam na formação de sais de carbo-
natodecálcioinsolúveisqueaumentam
adensidadedoconcretoetornamaágua
de poro mais diluída (Bertolini et al.,
2004).Consequentemente,aresistivida-
deelétricadoconcretoaumenta.
Resistividade elétrica do concreto e
medidas eletroquímicas de corrosão
Alonso e colaboradores (1988,
1989) mostraram,há décadas,que a re-
sistividade elétrica do concreto está re-
lacionada com a taxa de corrosão da
armadura. Uma série de ensaios apon-
tou um aumento expressivo da taxa de
corrosãoquandoaresistividadeelétrica
do concreto era baixa. Outros estudos
(González et al.,2004;Glass et al.,1991;
Schiessl; Weydert, 1996, Enevoldsen et
al., 1994, Hunkeler, 1996) apontaram a
mesma correlação.
Broomfield e Millard (2002) ressal-
tam que a correlação da taxa de corrosão
com a resistividade elétrica do concreto
somenteévalidaseamedidadestaúltima
for feita com exatidão. Outra ressalva é
para o caso de concreto muito úmido ou
muitoseco,condiçãoemqueacorrelação
entreastécnicasnãoseaplica.Enevoldsen
etal.(1994)mostraram,pormeiodoem-
butimento no concreto de aparato espe-
cífico de medição do grau de sua umida-
de,queataxadecorrosãodiminuiquan-
doaumidadedoconcretoémuitoeleva-
da, maior do que 80%. A partir deste
valor, Hunkeler (1996) observou uma
drásticaquedadaresistividadeelétricado
concreto.Nestacondição,ataxadecorro-
sãoégovernadapelajámencionadacon-
centração do oxigênio dissolvido que é
menor em concreto muito úmido. No
caso do concreto muito seco, a taxa de
corrosão cai drasticamente devido à
mencionadaausênciadeágua.
Broomfield e Millard (2002) tam-
bémdescrevemqueépossívelidentificar
locais de possível corrosão intensa (taxa
elevada) e,também,avaliar a severidade
dasituaçãoconstatadaemcampocoma
associação da medida da resistividade
com a do potencial de corrosão. Segun-
do estes autores, isto é válido tanto para
medições pontuais de potencial de cor-
rosão como para aquelas que abrangem
áreas maiores (mapeamento de poten-
cial).Além disto, ressalta-se que esta as-
sociaçãoéimportantedevidoàconheci-
da influência do grau de umidade do
concreto nos valores de potencial, con-
forme critérios da ASTM C876. Segun-
do estudos de González e colaboradores
(2004) múltiplos fatores condicionam
osvaloresdepotencial,sendoasuaasso-
ciação com outras medidas, como a da
resistividade elétrica do concreto,neces-
sáriaparaatotalcredibilidadedosresul-
tadosobtidosemcampo.
O exposto está de acordo com a vi-
Ca2+
Ca2+
Fe2+
Fe2+Fe
O2
O2
O2
O2
O2
H2O
2H2O + O2 + 4e-
2e-
4OH-
H2O
H2O
H2O
H+
H+
H+
OH-
OH-
H+
K+
K+
K+
Na+
Na+
SO2-
4
Anodo
Catodo
Condução
elétrica
Condução
iônica
Metal: aço carbono Eletrólito: face líquida do concreto
Interface: reações de transferência de cargas
3. 68 Téchne 200 | NOVEMBRo de 2013
a r t i go
vência em campo das autoras.A medida
da resistividade elétrica do concreto é
usualmente realizada para complemen-
tar a do potencial de corrosão das arma-
duras na avaliação do risco de corrosão.
Comoconhecimentodaresistividadedo
concreto é facilitada tanto a análise dos
resultados,comotambémaidentificação
dasregiõescomcorrosãoemcursoepo-
tencialmente propensas à corrosão seve-
ra (taxa de corrosão elevada). Com base
nosresultadosobtidosenoexamevisual
da armadura,outros ensaios são realiza-
dos em campo e em laboratório. Com
base nestes ensaios e nos obtidos na ins-
peçãovisualdoselementosdaestruturaé
possível não somente avaliar o risco de
corrosão, como também determinar o
seuestadodeconservação.
Outras aplicações da medida da
resistividade
Alémdaavaliaçãodoriscocorrosão,
outrosprocessosdedegradação,emque
o grau de umidade do concreto tem im-
pactosignificativo,comonareaçãoálca-
lis-agregado e no ataque de sulfatos ao
concreto, também podem fazer uso da
técnica de medição da resistividade elé-
tricadoconcreto(ACI,2010).
Além disso, esta técnica pode ser
aplicada para avaliar o desempenho de
estruturas recuperadas (Hunkeler,
1996), a eficiência da proteção catódica
ou do processo de dessalinização ou da
realcalinização do concreto (Nagi; Whi-
ting, 2004; Polder, 2001).Além disto, ci-
ta-seoseuusonacaracterizaçãodocon-
creto, inclusive na avaliação do ingresso
de íons cloreto (Nagi; Whiting, 2004;
Andrade;D´Andrea,2011).
Normalização
Conforme a literatura consultada,
há normalização (AASHTO TP95,
2011)paraavaliaroingressodeíonsclo-
reto no concreto com uso da técnica de
medição da resistividade do concreto.
Quanto ao seu uso na avaliação do risco
de corrosão das armaduras,somente foi
recuperada a recomendação técnica
RilemTC154-EMC(Polder,2000).
Sabendo-se da limitação de norma-
lizações,éimportantequeasmedidasde
resistividade elétrica sejam feitas com
base nessa recomendação e em estudos
disponíveis na literatura. Cita-se que as
principais técnicas e os critérios de ava-
liação dos resultados obtidos em medi-
ções em campo na avaliação do risco de
corrosãosãotemasdeartigoposterior.
Agradecimento
Andreza Milham eAna LúciaA.de
Souza pela recuperação de artigos e
Andrezza P. Correa pela elaboração de
desenho.
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