O documento discute a situação econômica do Brasil em 2015 e as alternativas disponíveis para construir as bases de um crescimento mais robusto e equilibrado. O autor argumenta que o Brasil enfrenta um dilema entre aumentar a intervenção do Estado ou apoiar mais a iniciativa privada, e que é necessário encontrar um equilíbrio entre essas opções.
2. 2
EDITORIAL
O Brasil é inevitável.
POR Thais Heredia
O ano de 2014 caminha para um desfecho melancólico para a
economia brasileira mas, ao mesmo tempo, desafiante. O país
está pronto para desempenhar seu papel por vocação: destino
de forte investimento e um mercado consumidor atuante e
sedento por novas conquistas sociais. Desde a estabilização
da moeda, há 20 anos, o Brasil não enfrentava um dilema tão
ardiloso quanto o que se impõe agora. De qual fonte devemos
buscar as melhores ferramentas para construir as bases de um
crescimento mais robusto e equilibrado?
Como na vida, há sempre duas escolhas - pelo menos. As
alternativas disponíveis colocam em lados opostos aqueles que
enxergam o Estado como provedor inesgotável de recursos para
estimular a economia e os que acreditam no papel regulador
do poder público, mas apontam a eficiência da iniciativa
privada como melhor instrumento para o desenvolvimento. Os
movimentos nas economias internacionais pós-crise de 2008
indicam que pender a balança para um lado só pode causar
estragos mais difíceis de serem contornados no curto e médio
prazo.
No Brasil, nos últimos quatro anos, forçamos um sério
desequilíbrio na economia ao aumentarmos a intervenção
do Estado e asfixiarmos a iniciativa privada. O desempenho
pífio da indústria nos últimos anos é prova irrefutável dessa
configuração. A contra prova aparece na queda expressiva
do volume de investimentos para melhorar a capacidade de
produção e reduzir o custo país - via infraestrutura. O nível de
endividamento das famílias brasileiras, financiado pelo aumento
de renda dos últimos anos e por taxas subsidiadas pelo governo,
deixa claro que nem a disparada do consumo foi capaz de
alimentar o Produto Interno Bruto. A queda abissal da taxa de
desemprego, que deve fechar 2014 próxima a 5%, completa
o cenário de distorções e consequente ineficiência na relação
entre todos aqueles que contribuem para pavimentar o caminho
para o crescimento. Empregamos mais e produzimos menos.
Nos bastidores do dia a dia dos brasileiros, trabalhadores e
empresários, o governo assumiu o papel de provedor absoluto
dos meios e soluções para nossos gargalos, numa atuação
quase utópica diante de resultados tão discrepantes. O aumento
de gastos públicos financiou toda sorte de atalhos para o
crescimento do PIB sem que nada tenha se tornado sustentável.
O volume de recursos destinados ao crédito para investimento
foi recorde na história nacional e provocou efeito contrário: o
investimento caiu nos últimos anos. As iniciativas tributárias
do governo federal reduzindo impostos, desonerando taxas de
setores produtivos e adiando reajustes de tarifas sustentaram
uma bolha de consumo em setores como automobilístico, bens
duráveis e serviços. A bolha já se desfez e deixou de herança
uma conta bem salgada para os brasileiros pagarem.
A teoria explica que os ciclos econômicos são inevitáveis
na história mundial: crescimento, retração, estagnação e
recuperação. A diferença entre o tempo e a intensidade de cada
um deles vai depender dos exageros cometidos na bonança. A
crise financeira internacional de 2008 foi a maior experiência
global da ilusão do crescimento infindável através do consumo.
No Brasil, experimentamos do mesmo elixir mas com uma
diferença da dose dos países ricos: lá fora, a poupança privada
bancou o deslumbramento; aqui, foi o dinheiro público. Lá fora,
os cidadãos perderam patrimônio, reservas e muitos sonhos.
Aqui, ninguém perdeu patrimônio (ainda), mas perdemos a
confiança na capacidade do governo de gerir o país e promover
o desenvolvimento. Também herdamos uma inflação mais alta
e o enfraquecimento das instituições.
Aqui o enigma da economia brasileira dá uma dica de como
decifrá-lo. No Brasil, tudo (ou quase tudo) está por fazer:
estradas, portos, aeroportos, ferrovias, geração de energia,
tratamento da água, serviços para educação e saúde, entre
tantos outros buracos abertos na trajetória do país. Onde mais
alguém oferece tantas oportunidades num mundo em que
os ricos já estão prontos, mas estão “pobres” e fracos, e os
emergentes estão “ menos pobres”, mas “inacabados”?
Alguém pode logo dizer: a concorrência com nossos parceiros
no BRICS - Rússia, Índia, China e África do Sul - está muito
forte. Ainda tem o México, a Austrália, podem também citar. Nós
ganhamos de todos eles porque o Brasil é inevitável. Esta é
a nossa vocação: somos inevitáveis, imperdíveis, inescapáveis.
Quem conhece e reconhece esses poderes, aguarda apenas
um sinal de que as distorções serão sanadas, o equilíbrio entre
Estado e iniciativa privada será retomado para que o país possa
exercer seu papel a pleno vapor. Nos contentarmos com menos
do que isso será tirar do Brasil um destino que a ninguém mais
pertence.
Thais Heredia é jornalista e assina a coluna de economia do
G1 (Portal da TV Globo).
3. 3
BRASIL OUTLOOK 2015
SUMÁRIO
04
O SOL DA MEIA NOITE
Estratégia e gestão integrada da Sustentabilidade Corporativa
06
O desafio da lucratividade
08
Crescimento por Fusões e Aquisições
10
Estar ou não em Compliance?
12
Aliança do Pacífico: O nascimento de uma nova potência na América Latina?
14
Mercado de Capitais Brasileiro – A um passo do futuro!
16
EMPREENDEDORISMO E INOVAÇÃO
18
Real EState: A construção de um novo Brasil precisa de iniciativa privada
Talento x Custo: Como Gerir este conflito no mercado altamente competitivo
O novo relato corporativo: integrando informações financeiras e não-financeiras
para gerar valor
20
22
24
4. 4
O Sol da Meia-Noite
Por Luis ReSende
Por mais que diversas previsões e análises sustentem que o
Brasil viverá um cenário absolutamente difícil em 2015, eu me
recuso a aceitar que o motor da América Latina seja entregue a
um longo processo recessivo.
Vimos investindo sucessivamente no país, projetando um 2015
de reassentamento dos ativos e dos setores da economia.
Felizmente, conseguimos enxergar um país com um sem
número de microambientes e microeconomias que crescem a
taxas absolutamente relevantes.
A economia primária deve ter um belo ano em função de
um quadro, mesmo que lento, de recuperação das principais
economias do mundo. A mesma característica da relevância
da indústria primária brasileira, que para tantos é uma
vulnerabilidade, em momentos de crise e incerteza é um sólido
pilar de sustentação das bases do Brasil.
A demanda de consumo não secou nem secará, ela será
movimentada lateralmente. Uma economia estratificada como
a nossa, com tantas camadas e maneiras de fomentar seu
5. 5
BRASIL OUTLOOK 2015
giro, criará por si só uma forma de circular os ativos reais,
trocando-os de mão, fazendo com que os princípios básicos
da manutenção da arrecadação e geração de riqueza sejam
mantidos.
Embora possa ser caracterizada como uma posição otimista,
e de fato é, ela não é baseada em nenhuma euforia ideológica
ou com qualquer viés político. Essa análise é decorrente
da percepção de uma relação direta entre produção,
desenvolvimento tecnológico, comportamento do setor primário
e no conceito de que as economias sempre operam em ciclos.
John Maynard Keynes tratou de uma maneira muito certeira a
forma como as flutuações acontecem baseadas nas variações da
demanda efetiva na economia. A relação direta entre o mercado
financeiro e o investimento público sustenta ainda mais a tese
de que o crescimento multisetorial brasileiro retornará a partir
do equilíbrio entre as demandas e ofertas público e privadas.
Cada uma das camadas sociais terá suas próprias dificuldades.
Cada um dos setores terá seus desafios. Felizmente, há uma
inequívoca retenção de liquidez do sistema financeiro nacional
através de medidas como o depósito compulsório dos bancos.
Essa foi uma das principais, se não a principal razão de termos
suportado a escassez de liquidez mundial na crise pós-Lehman
Brothers. Se passamos por aquele momento, financiaremos, da
mesma origem, a volta do crescimento.
Segundo estudo do The Institute of International Finance “IIF”,
o fluxo de investimentos para os chamados países emergentes
somente caiu drasticamente exatamente em 2009, e claramente
não por falta de motivação para tal, mas por absoluta falta de
capacidade de acessar capital para investir.
400
300
200
100
0
-100
-200
A entrada de capitais de mercados emergentes
$ bilhões, dados trimestrais, IIF EM 7 = BRIC, Turquia, Mexico e Indonésia, IIF EM 30 = exemplo completo IIF
IIF EM 30
IIF EM 7
2005 Q1 2007 Q1 2009 Q1 2011 Q1
IIF Forecast
2013 Q1
IIF.com - 2013
CONCLUSÃO
O dinheiro VAI VOLTAR. E vai porque temos uma economia
efetivamente apoiada na criação de valor e geração de riqueza.
Nosso mercado de capitais transaciona na sua grande maioria
ativos reais e menos operações de “vapor”, aquelas chamadas
de derivativos. A alavancagem do mercado de capitais vista nos
EUA em um passado recente não acontece por aqui. Não temos
créditos securitizados passíveis de refinanciamento. Nossos
financiamentos habitacionais são lastreados pelos verdadeiros
valores dos ativos, não importando as flutuações livres que o
mercado faça.
Um eventual grau elevado de inadimplência não vem de uma
disfunção orgânica das premissas econômicas, mas sim
de um processo de aculturamento de um povo que jamais
soube poupar porque nunca teve como fazê-lo. Aqui não há
absolutamente nenhuma menção a classe social ou faixa de
renda. A falta de cultura do investimento e poupança vem de
um histórico de hiperinflação, depreciação colossal do valor real
das moedas e da subtração sumária do poder de compra dos
cidadãos e empresas nacionais.
O brasileiro, pessoa física ou jurídica, hoje zela muito mais
pelo “seu nome”. Ele compreende a responsabilidade de estar
adimplente com suas obrigações nas mais diversas áreas e das
mais diferentes origens. A dificuldade em honrar compromissos
assumidos por uma avalanche de crédito não tem, em si, um
processo infeccioso de nenhuma das faixas da nossa pirâmide
econômica. A repactuação dessa enorme quantidade de
dinheiro, mais uma vez lembrando que lastreada em ativos
reais, será forçosamente uma etapa de reeducação de todas as
partes do jogo econômico brasileiro.
Crescer dói. Sempre dói. Por tantas vezes nosso crescimento
não é tangível, por consequência, mensurável por indicadores
ou estatísticas. O Brasil vive um desses momentos.
O reassentamento da ordem social e econômica, a
interdependência dos mais diversos setores está nos forçando
a amadurecer.
Instituições mais sólidas em um ambiente mais seguro somente
poderão resultar em novos ciclos de desenvolvimento. Que
nossas dores do crescimento estejam diretamente ligadas
à percepção de corresponsabilidade de cada um de nós,
representando uma pequena peça do enorme quebra cabeça
da economia nacional. Se todos estivermos dispostos a nos
encaixar no espaço que a nós foi definido, viveremos em breve
as alegrias de um novo ciclo de desenvolvimento.
Para todos aqueles que se preocupam com a escuridão, posso
dizer com confiança que estamos preste a ver brilhar nos céus
do Brasil o Sol da Meia Noite.
Luis Resende é Presidente da Volvo Cars do Brasil. Economista
com especializações em BRGAAP, USGAAP, IAS, ROI. Carreira
marcante como Controller e CFO em multinacionais como
Volvo e Phillips.
6. 6
Estratégia e gestão
integrada da
Sustentabilidade
Corporativa
Por Isabela Domenici
7. 7
O debate sobre as mudanças na administração e gestão das
grandes, médias e até pequenas empresas é uma constante
que foi acentuada nos últimos anos: o maior foco e abertura nas
relações com as pessoas, com o mercado, com as organizações
de terceiro setor, com as comunidades, com o meio ambiente e
com outros públicos que fazem parte da cadeia do negócio da
companhia é uma necessidade visível e cada vez mais exigida
pelos investidores e consumidores.
Segundo César Souza, escritor do “Blog do Management”, da
revista EXAME, nesse momento “a alma é a propagada do
negócio”. Ou seja, importam os valores, a missão e a visão das
empresas, além de como ela atua diariamente para cumprir e
entregar essas promessas. Essa nova administração enxerga
que uma melhor relação interpessoal e com o planeta gera
maior lucro no longo prazo, garantindo assim a sustentabilidade
dos negócios. Além disso, uma atitude da empresa que não vá
ao encontro às suas promessas pode ser um perigo para sua
reputação, visto que ela “pega fogo como pólvora” dentro das
novas ferramentas de comunicação.
Diante deste cenário, o conceito de sustentabilidade corporativa
foi criado e desenvolveu práticas que mensuram o mercado,
facilitando a análise das ações e relações das empresas com seus
públicos de relacionamento e a consequente comparação entre
elas. Exemplos desses mecanismos de mercado são a criação
dos Relatórios de Sustentabilidade (que podem ou não seguir
diretrizes globais, como as da Global Reporting Initiative - GRI),
Índices de Sustentabilidade (como o Dow Jones Sustainability
Índex - DJSI e Índice de Sustentabilidade Empresarial - ISE da
BM&FBovespa, por exemplo) e metodologias de engajamento
de stakeholders (públicos de relacionamento), além de prêmios
para as melhores práticas, que ampliam a visibilidade das
empresas mais engajadas.
No entanto, todas as novas práticas exigem que a
sustentabilidade esteja presente na agenda da alta gestão
para que as empresas estejam preparadas para divulgar suas
ações e demonstrar que a sustentabilidade realmente faz parte
da sua estratégia de negócio e não é apenas um conceito que
passa por ações pontuais. Neste contexto, podemos citar as
novas diretrizes G4 da GRI como uma consequência dessa
necessidade, com indicadores que questionam o envolvimento
do Conselho de Administração nas decisões de grande impacto
e até a relação da remuneração da alta gestão com os temas
relevantes para a sustentabilidade da Companhia.
Como consequência direta dessa nova agenda têm sido criados
departamentos voltados à Sustentabilidade, cargos como Chief
Sustainability Officer (CSO) ou Diretores de Sustentabilidade,
comitês de Sustentabilidade que se relacionam diretamente
com a Diretoria Executiva ou com o Conselho de Administração
ou até mesmo grupos de trabalho específicos para participar de
cada mecanismo de mercado separadamente (o departamento
de RH, por exemplo, é muitas vezes o responsável pelo
questionário das Melhores Empresas para se Trabalhar da
Revista Você SA/ EXAME).
Essas equipes se apoiam na boa vontade de líderes de todas
as áreas da empresa para conseguir responder às perguntas
que cada prática do mercado solicita. Porém, como não há uma
visão integrada das iniciativas em que a empresa vai participar,
o tempo desses profissionais tem sido esgotado, na maioria
das vezes, preenchendo formulários e questionários com suas
ações dirigidas à sustentabilidade e tentando se enquadrar nos
mecanismo de avaliação das instituições do mercado. Ademais,
a participação em cada iniciativa como responsabilidade de
diferentes grupos de trabalho na organização pode fazer com
que a mesma informação seja pesquisada internamente e
divulgada de forma diversa, o que não gera credibilidade ao
conteúdo informado.
Mas será que esse é o papel verdadeiro desses profissionais?
Não deveriam eles estar focados em desenvolver caminhos
para que os impactos econômicos, sociais e ambientais sobre a
empresa sejam cada vez menores e mais lucrativos?
A jornalista Silvia Dias abordou, há algum tempo, esse tema
na Revista Sustentabilidade, descrevendo várias atividades
pertinentes para essa área. No entanto, o que se vê é que não
há tempo ou investimento para a criação e desenvolvimento de
oportunidades de melhoria das ações de sustentabilidade pelas
empresas, mas sim uma competição entre elas tentando correr
atrás do que os mecanismos impõem como práticas relevantes.
Diante desses pontos, é importante refletir sobre o papel
dessas novas áreas e profissionais, pensando como eles
podem, ao mesmo tempo, ser estratégicos e alcançar um
bom posicionamento junto aos mecanismos de mercado. Para
isso, é necessária uma maior conexão entre todas as áreas
da empresa, tanto para reunir informações sobre a atuação
da companhia e seus impactos como para decidir quais são
as melhores formas de divulgar suas ações que buscam o
desenvolvimento sustentável.
Dessa forma é possível afirmar que o papel dessa área é olhar
de maneira global para a empresa, avaliando seu impacto no
mercado, na sociedade e no planeta e, assim, desenvolver um
planejamento estratégico para que o negócio da companhia
se sustente ao longo do tempo, já que não há negócio de
sucesso em um macroambiente econômico, social e ambiental
degradado.
Isabela Domenici é Diretora de Conteúdo e Sustentabilidade
da Ricca RI. Jornalista especializada em comunicação
para o mercado de capitais, com MBA em Economia, Setor
Financeiro e Desenvolvimento Sustentado. Especialista na
aplicação de metodologias e consultoria para projetos de
sustentabilidade. ISABELA.DOMENICI@RICCARI.COM.BR
BRASIL OUTLOOK 2015
8. 8
Há que se ter em mente que essas são as bases para uma
boa tomada de decisão.
t aos olhos da matriz, precisam ser claras as diferenças
e particularidades de cada mercado. É fundamental
expor ao headquarter como se joga o jogo. Não significa
dizer que irá prevalecer a recomendação do mercado.
Consiste simplesmente em estabelecer uma relação de
transparência e confiança que, em último caso, objetiva
alcançar o melhor resultado para o negócio. Em resumo,
que as decisões sejam conscientes.
t buscar garantir que haja um balanço adequado entre
tomada de decisão local e central. Em um mercado como
o Brasil, em que o contexto de negócio pode mudar da
noite para o dia, a capacidade de reação rápida (tanto
para riscos como para oportunidades) muitas vezes pode
ser determinante. É extremamente conveniente que os
executivos tenham relativa autonomia para agir sob essas
circunstâncias.
t estar preparado para eventuais frustrações. O fato de
uma operação local ser bem sucedida não garante
necessariamente sua existência. Em momentos de
crise nas economias desenvolvidas por vezes prevalece
a decisão de proteger esses mercados, exigindo
desinvestimentos ou remessas maiores de recursos de
suas subsidiarias.
Em resumo, para os executivos financeiros de multinacionais no
Brasil é complexa a tarefa de balancear os papéis tradicionais
de preservar os ativos da companhia, minimizando os riscos
e garantindo a integridade dos livros da empresa, protegendo
os interesses dos acionistas (que no contexto abordado estão
lá fora), sempre agindo como estrategista, que é aquele que
dá o direcional e atua como catalisador das oportunidades
desempenhando papel ativo na instauração de uma mentalidade
de busca contínua pela melhoria dos resultados.
O desafio da
lucratividade
Por Thyana S. L. Otsuka
Ao longo das últimas décadas muitas organizações entraram
nos mercados emergentes atraídos por uma perspectiva de
crescimento por vezes substancial. A estratégia se tornou até
clichê na agenda estratégica das multinacionais. O que se
verifica, na prática, é que poucas empresas foram capazes de
refletir esse crescimento em retorno efetivo para o acionista.
Nesse contexto, as subsidiárias brasileiras também passaram
a disputar recursos internamente e a serem consideradas por
suas matrizes como alternativas concretas de crescimento,
sobretudo naqueles momentos em que os mercados maduros
encontravam-se estagnados ou mesmo em situação de crise.
A grande verdade é que com esses movimentos os
mercados foram se tornando cada vez mais competitivos, e
consequentemente cresceu o desafio da lucratividade. Além do
aumento da concorrência, podemos enumerar outros motivos
pelos quais nós, executivos, devemos estar atentos ao tomar
uma decisão de investimento no país:
t à medida que aumentam as participações das operações,
cresce a visibilidade do desempenho desses mercados
no resultado consolidado, bem como o impacto de um
resultado negativo ou abaixo do esperado.
t aumento dos custos. De maneira genérica refiro-me à
mão-de-obra, impacto dos preços das commodities,
custos logísticos muitas vezes decorrentes de uma
precária infraestrutura (o exemplo clássico é a rede de
transportes) e elevado custo de capital.
t carga tributária abusiva.
t outros fatores, nem sempre tangíveis ou quantificáveis,
tais como burocracia e complexidade do sistema legal e
tributário.
Para ser bem sucedido hoje e amanhã é crucial entender todas
as forças que definem o contexto em que atuamos, desafiar
continuamente a maneira como estamos conduzindo os
negócios, revisando os modelos e processos tradicionais. A fim
de lidar com todos esses dilemas, destacaria como essencial
estar atento aos seguintes princípios:
t planejamento: embora no curto prazo amarguem-se
perdas, o ponto da virada (quando e como) precisa estar
bem definido nos planos.
t por vezes, especialmente em mercados como o brasileiro,
há uma dificuldade latente em obter informações acuradas.
9. 9
BRASIL OUTLOOK 2015
Tantas vezes as oportunidades de crescimento parecem tão
óbvias e certas, mas é preciso dar um passo para fora do contexto,
deixar as emoções de lado e analisar, sob a perspectiva global,
se a estratégia faz sentido ou não. O grande desafio, e talvez até
a chave do sucesso, seja saber declinar. É fundamental estar
preparado para acalmar os ânimos internamente, pois muitas
vezes a decisão acertada não é a mais popular, ou não é aquela
que a organização local quer e espera ouvir.
Thyana Otsuka é CFO da Volvo Cars do Brasil. Graduada em
administração de empresas pelo Insper - Instituto de Ensino
e Pesquisa em São Paulo, com MBA Executivo pela mesma
instituição. Traz passagens por empresas como Unilever
e American Express, nas quais acumulou experiência em
planejamento financeiro e controles operacionais. Entrega à
gestão das finanças corporativas da Volvo Cars do Brasil a
dinâmica necessária para combinar rentabilidade, liquidez e
apoio aos operadores do mercado.
11. 11
As operações de Fusões e Aquisições - FA, ou Merger and
Aquisitions - MA, em inglês, são considerados os mais eficazes
métodos de crescimento de empresas. Tais operações são
comumente empregados para captar investimentos, expandir
as atividades da companhia, absorver concorrentes, aumentar
o market-share, seja por conta de aumento do faturamento por
expansão regional ou base de clientes em nichos selecionados.
A aquisição de posição de mercado pode ser mais barata do
que enfrentar as barreiras de entrada, necessidade de inovação,
dentre outros.
Transações de FA são estrategicamente ferramentas de
globalização de empresas extremamente eficazes e largamente
utilizadas. Na medida em que facilitam o acesso ao know-how
dos mercados locais, os processos de consolidação permitem
que a empresa adquirente acesse as geografias-alvo com
celeridade e eficácia. Assim serão antecipadas condições
econômicas, políticas e culturais. Outra razão é a superação de
eventuais barreiras regulatórias, tais como licenças operacionais
e permissões governamentais das mais variadas, que advindas
da empresa adquirida, garantem um acesso diferente das vias
orgânicas.
Um dos mais recentes exemplos é o caso da Electrolux. A
gigante sueca, uma das maiores fabricantes mundiais de
eletrodomésticos, anunciou em setembro de 2014 a compra
da divisão de eletrodomésticos da GE. Uma estratégia de
expansão por aquisição que alavanca sua posição no mercado,
aumentando a capilaridade dos canais de venda e o alcance
global.
Segundo a Pesquisa de Fusões e Aquisições 2014 - 2º
trimestre, elaborada pela KPMG, apesar da baixa expectativa
de crescimento do Brasil, o número de operações de MA
confirmam que esse tipo de operação é o mais utilizado para
expansão de empresas.
BRASIL OUTLOOK 2015
Número de operações por tipo de negócio
1º SEMESTRE
2013 2014
Domésticas 184 165
Cross border 1 127 142
Cross border 2 25 19
Cross border 3 14 24
Cross border 4 32 50
Cross border 5 4 6
TOTAL 386 406
Grandes gestores e visionários aproveitaram-se de momentos
de incerteza e volatilidade para realizar movimentos arrojados
e com grandes resultados. Steve Kaufman, principal executivo
da Arrow no início da década de 90, e responsável pelas
aquisições que consolidaram a empresa como líder no mercado
de componentes eletrônicos à época, afirmou: “Adquirimos
em tempos difíceis”. A ideia é exatamente essa. Partindo do
princípio de que valha a pena manter e fazer crescer o negócio,
aquisições durante períodos recessivos reduzem o risco, ao
invés de aumentá-lo. Nesses cenários, companhias bem-sucedidas
fazem apostas que fogem ao senso comum para
alavancar suas posições de mercado.
Por diversas vezes no decorrer deste ano me deparei com
a seguinte pergunta: “Como você enxerga o mercado de
Setores em destaque no semestre (nº de transações)
Companhias energéticas
Empresas de internet
Outros
MA em meio ao instável cenário econômico no Brasil, e a
consequente baixa atratividade para investimentos?” Eis minha
resposta: Historicamente crises e recessões sempre trazem
oportunidades de aquisições e parcerias. O absoluto foco e
compromisso com o desenvolvimento permite que gestores
e empreendedores reconheçam que “o copo pode estar meio
cheio e não meio vazio”. Em cada momento de retração e
incerteza macroeconômica, a capacidade de reconhecer setores
da economia com espaços de crescimento pode ser o diferencial
entre acomodação e defesa ou ousadia e crescimento.
Patrícia Perinazzo Costa é sócia da OPP Brasil, advogada,
especialista em direito contratual, com larga experiência em
operações de MA, cross border transactions e contratos de
alta complexidade. PPC@OPPBRASIL.COM
Transações Domésticas: entre empresas de capital brasileiro
CB1: Empresa de capital majoritário estrangeiro adquirindo,
de brasileiros, capital de empresa estabelecida no Brasil.
CB2: Empresa de capital majoritário brasileiro adquirindo,
de estrangeiros, capital de empresa estabelecida no exterior.
CB3: Empresa de capital majoritário brasileiro adquirindo,
de estrangeiros, capital de empresa estabelecida no Brasil.
CB4: Empresa de capital majoritário estrangeiro adquirindo,
de estrangeiros, capital de empresa estabelecida no Brasil.
CB5: Empresa de capital majoritário brasileiro adquirindo,
de brasileiros, capital de empresa estabelecida no exterior.
205
54
43
27
24
21
Tecnologia da Informação
Serviços para empresas
Alimentos, bebidas fumo
Instituições financeiras
Telecomunicação e mídia
Fonte: Pesquisa de Fusões e Aquisições 2014 – 2º trimestre - KPMG
16
16
12. 12
Estar ou não em
Compliance?
Por Eduardo Rezende de Borba
Já se passaram 12 anos desde a aprovação da lei americana
Sarbanes-Oxley (SOX) e, dependendo da Organização, cerca de
uma década em que as empresas com ações listadas na New
York Stock Exchange (NYSE) foram obrigadas a cumprir com
os controles internos sobre suas demonstrações financeiras,
conforme estabelecido na seção 404 da SOX.
Porém, as empresas ainda sofrem constantes desafios neste
processo de “estar em compliance”, em função de seus
processos sofrerem alterações no decorrer dos períodos.
Em um ambiente globalmente competitivo, as constantes
mudanças nas atividades de uma empresa são normais. Da
mesma forma, os controles internos devem ser periodicamente
revisados e atualizados, para fazerem sentido às novas rotinas
dos processos.
Muitas companhias ainda possuem uma abordagem manual
para os testes de controles, o que gera maior demanda de tempo
e mão de obra, enquanto algumas poucas organizações já estão
utilizando procedimento de teste continuo automatizado. Este é
um importante passo para aquelas empresas que já possuem a
cultura de risco e controles, sendo de conhecimento e aplicação
por parte de seus funcionários, principalmente nos cargos de
gerência e diretoria.
Existem aquelas empresas que não têm ações listadas na NYSE,
ou seja, não têm a obrigatoriedade em estarem em compliance
com a SOX, mas que no entanto, adotam uma abordagem
de regulamentação e divulgação própria, inclusive seguindo
os requerimentos desta lei. Temos visto algumas empresas
de médio e grande porte trabalhando dentro desta filosofia e
estrutura.
No Brasil a própria Comissão de Valores Mobiliários (CVM),
que é o órgão regulador de nosso mercado de capitais, tem
trabalhado para harmonizar as regras de compliance brasileiras e
internacionais, com um esforço ainda maior para alinhar o Brasil
com as normas aplicadas nos mercados mais desenvolvidos.
Percebe-se que atualmente, a maioria dos conceitos básicos da
SOX já foram incorporados na legislação brasileira, havendo um
bom grau de alinhamento entre CVM e SOX.
Devido ao seu grau único de liquidez, a NYSE é a referência
mundial para listar as ações. As empresas que cumprem
as demandas e exigências dela, de certa forma, são
invariavelmente melhor preparadas ou até mesmo tem uma
vantagem competitiva para receber investimentos estrangeiros.
Mas o que isso tem a ver com empresas privadas e outras não
listadas na NYSE e obedecendo regras da SEC? No que isso
impacta as quais não possuem necessidade do cumprimento
à SOX? Essa é uma questão de boa estratégia de negócio
ao adotar os princípios da regulamentação e compliance,
fortalecendo o ambiente de controles internos.
13. 13
BRASIL OUTLOOK 2015
As companhias que possuem um forte sistema de controles
internos, revelam-se bem sucedidas em seus respectivos
segmentos de mercado. Controles internos fortes forçam a
empresa além de seus limites padrão, ajudando a implementar
melhores práticas de mercado, fortalecer a credibilidade, e
atender as necessidades de seus clientes de uma forma melhor
em relação a seus concorrentes.
Competindo em um mercado de capitais ainda restrito e com
poucas fontes de funding para desenvolvimento e capitalização,
estar em Compliance deixa de ser uma opção e passa a ser um
caminho inevitável para a solidificação de qualquer companhia.
Acionistas e “stakeholders” certamente vão agradecer esta
escolha, tanto quanto os responsáveis pela solidez da gestão
corporativa.
Eduardo Rezende de Borba é Sócio-Senior das Operações
OPP Brasil nos EUA. Graduado em Ciências Contábeis,
com MBA em Gestão de Tecnologia e Administração, tem
importantes passagens por Ernst Young, HSBC e Bunge.
Um dos melhores especialistas brasileiros em Compliance e
Lei Sarbanes-Oxley. ERB@OPPBRASIL.COM
14. 14
Aliança do Pacífico
O nascimento de uma nova
potência na América Latina?
Por João Henrique Oliveira
A Aliança do Pacífico é uma iniciativa de integração regional
criada em 2011 por Chile, Colômbia, México e Peru.
Seus objetivos são:
t Construir, de forma participativa e consensual, um espaço
de profunda integração para avançar gradualmente para
a livre circulação de mercadorias, serviços, capitais e
pessoas;
t Impulsionar o crescimento, desenvolvimento e a
competitividade das economias das partes envolvidas
com vista a alcançar um maior bem-estar, superar a
desigualdade socioeconômica e promover a inclusão
social de seus habitantes;
t Tornar-se uma plataforma de articulação política,
integração econômica e comercial e de projeção para o
mundo, com destaque para a região da Ásia-Pacífico.
15. 15
BRASIL OUTLOOK 2015
BRASIL E ALIANÇA DO PACÍFICO SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS
Considerando os objetivos da Aliança, cabe avaliar como esse conjunto de países se compara ao Brasil e quais as possíveis
consequências deste novo bloco econômico para o comércio brasileiro e a nossa capacidade de liderança regional.
População
PIB Câmbio
Oficial (Bilhões
USD)
PIB PPP
(Bilhões USD)
Analisando o quadro acima, a primeira conclusão interessante
é que, do ponto de vista de população e economia, o Brasil
e o conjunto do bloco do Pacífico são muito similares. Ambos
possuem população ligeiramente acima de 200 milhões de
pessoas e suas economias movimentaram, em 2013, perto de
2,2 trilhões de dólares.
Porém, ainda sob esse aspecto, começam a aparecer as
primeiras diferenças entre o nosso país e o bloco do Pacífico.
Analisando-se o PIB corrigido pela Paridade de Poder de Compra
(PPP), observa-se que os países da Aliança do Pacífico possuem
custo de vida consideravelmente abaixo do custo brasileiro.
Além disso, verifica-se que, enquanto exportações e
importações somadas correspondem a aproximadamente
22% do PIB brasileiro, para o bloco do pacífico encontram-se
praticamente em 50%. Essa diferença demonstra que,
enquanto o Brasil concentra-se, devido a diversos fatores, em
seu mercado interno, os países da Aliança do Pacífico têm uma
vocação muito maior para a abertura de mercados e para o
comércio internacional.
Tal fato evidencia-se também quando lembramos que, ao
contrário do Brasil, todos os quatro países membro da Aliança
do Pacífico possuem tratado de livre comércio (TLC, ou FTA
segundo a sigla em inglês) tanto com os Estados Unidos quanto
com a União Europeia.
Ao mesmo tempo em que o Brasil busca restringir o
relacionamento comercial livre com europeus e americanos,
utilizando-se de diversas formas de barreiras comerciais, os
países do bloco do Pacífico buscam cada vez mais flexibilizar e
incentivar essas relações.
Por último, e não menos importante, cabe comparar a carga
burocrática a que estão expostos empresários e investidores
em cada um dos países, impactando diretamente o custo de
operação.
PIB PER CAPITA
(Milhares USD)
Exportações
(BUSD)
e vs PIB (%)
Importações
(BUSD)
e vs PIB (%)
BRASIL 202.656.788 2.190 2.416 12.100 245 241
11% 11%
MÉXICO 120.286.655 1.327 1.845 15.600 371 371
COLÔMBIA 46.245.297 369 527 11.100 59 54
PERU 30.147.935 210 344 11.100 42 42
CHILE 17.363.894 282 335 19.100 78 76
Total Aliança 214.043.781 2.188 3.051 14.278 549 542
25% 25%
Fonte: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook - População estimada em julho/2014 e demais dados estimados para 2013.
Facilidade de se fazer negócios
CHILE 34 (1)
PERU 42 (3)
COLÔMBIA 43 (4)
MÉXICO 53 (5)
BRASIL 116 (23)
Fonte: http://www.doingbusiness.org/rankings - Banco Mundial - Posição no
ranking Mundo (Posição no ranking América Latina)
A tabela acima mostra o ranking dos países avaliados
pela facilidade de se fazer negócios considerando prazos,
procedimentos e custos para abrir e encerrar empresas, entre
outros. Mais uma vez vemos que o Brasil ocupa uma posição
bem desfavorável em relação aos demais países da Aliança do
Pacífico.
CONCLUSÃO
A Aliança do Pacífico desponta como importante potência
econômica e política na América Latina, pautada nos ideais de
livre acesso aos mercados, segurança jurídica e funcionamento
eficiente e descomplicado de suas instituições.
O Brasil vive um momento da mais pura efervescência política,
coroado pelas eleições presidenciais mais competitivas da era
republicana. Independentemente da corrente política que sair
vencedora, o país definitivamente precisará escolher, em breve,
se seguirá o mesmo caminho dos nossos vizinhos do Pacífico,
abraçando verdadeiramente o livre comércio internacional e
tornando-se, portanto, um ator econômico e político da mais
alta relevância global ou se vai se fechar em torno de um Estado
cada vez mais protecionista, burocrático e interventor.
A resposta saberemos em breve!
João Henrique Oliveira é Diretor de Operações da Volvo
Cars para América Latina e Caribe. Engenheiro Mecânico,
com MBA em Marketing, Relações Internacionais e Direito.
Mescla diferentes habilidades gerando um resultado de
altíssima qualidade na análise, compreensão e definição de
estratégias em mercados multi-culturais.
16. 16
Mercado de
Capitais Brasileiro
A um passo do futuro!
Por ADEODATO NETTO
17. 17
A transformação da BMFBovespa no que ela é hoje começou
em 2002, após a aquisição da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro.
Este parecia ser um definitivo movimento na solidificação de um
grande operador brasileiro no mercado de capitais.
Nos mais diversos contextos macro e micro e econômicos a
BMFBovespa refletiu movimentos internacionais, sempre
mantendo uma posição muito peculiar da realidade interna de
nosso país, por tantas vezes na contramão do mundo.
Se olharmos os momentos em que o Ibovespa atingiu os 70.000
pontos e vivemos basicamente uma euforia de fluxo de capital
ingressante e circulante, havia um olhar muito atento e otimista
para todo o ambiente de desenvolvimento do Brasil.
Curiosamente, nossos indicadores não foram capazes até hoje
de sobrepor as barreiras de entrada no mercado aberto de
capitais por companhias brasileiras. Ainda é caro, burocrático
e por consequência “incerto” demais para as PMEs brasileiras
terem a abertura de capital como estratégia de geração de
liquidez ou captação de recursos.
Nosso sistema financeiro tem uma das melhores regulações
do mundo no sentido de retenção de liquidez circulante e
integração tecnológica. Estas são algumas das boas heranças
do período de instabilidade econômica que tanto nos ensinou a
sobreviver em meio às tormentas da volatilidade.
Incrível como esta qualidade toda não foi capaz de trazer consigo
um universo relevante de empresas dispostas a se expor ao
mercado de ações. Não culpem-se somente os processos de
regulação, investimento necessário e burocracia citados acima.
As regras de transparência e gestão foram também muito
temidas pelo empresariado verde e amarelo.
Vivemos um círculo vicioso neste sentido. Quanto menos
empresas listadas, menos opções de investimento, menos
dinheiro circulando, maior a concentração das operações de
crédito nas mãos dos bancos de varejo. Desta maneira ficamos
suscetíveis aos spreads incríveis hoje praticados nas cessões
de crédito e ainda aos comitês de avaliação de risco altamente
conservadores e demandando garantias reais ou colaterais
que represam a capacidade das companhias de investir em
desenvolvimento seja ele orgânico ou não.
Vemos com grande esperança movimentos sólidos e
determinados do mercado em prol da aproximação de nossas
empresas do mercado de capitais. Novo Mercado, planos
de incentivo e racionalização das exigências para abertura
de capital são definitivamente um caminho para atração de
investimentos das mais diversas fontes.
Para ilustrar o tamanho do nosso universo de opções, a
BMFBovespa tem cerca de 360 empresas listadas. Somente
em outubro foi realizado o primeiro e provavelmente o único IPO
de 2014, já no início do último trimestre do ano com a chegada
da Ouro Fino. Traçando um paralelo com a Bolsa de Nova York,
a NYSE, lá são aproximadamente 3.000 empresas listadas e
somente em 2014, 188 empresas levantaram cerca de US$ 40
bilhões em IPOs nos EUA de acordo com estudo da Renaissance
Capital. Nos EUA há a expectativa que o último quartil do ano
movimente aproximadamente outros US$ 40 bilhões, em um
período sem precedentes deste a crise internacional de 2007.
BRASIL OUTLOOK 2015
Pedidos de Registro de IPOs nos EUA
50
40
30
20
10
0
4/13 7/13 10/13 1/14 4/14 7/14
Fonte: Renaissance Capital
Quanto dinheiro poderíamos estar trazendo para nossos
mercados, se tivéssemos uma gama de opções maior e mais
sólida? Quantos pequenos investidores não institucionais,
como as chamadas velhinhas de Wall Street poderiam estar
escolhendo seus ativos através de bons indicadores e operando
por meio de seus “home brokers”?
Este é um momento de muita discussão nacional sobre o
futuro do Brasil. O que fazer? Como fazer? Independentemente
de qualquer política pública, parafraseando o Editorial deste
material, o Brasil é inevitável. Representamos uma oportunidade
de investimento inegável para investidores internacionais.
Mas tão melhor seria fazermos a nossa lição de casa, e
compreendermos que temos aqui dentro uma força propulsora
colossal e atualmente ociosa. Permitir o acesso de PMEs
ao mercado de capitais naturalmente acelerará o processo
de desenvolvimento, de crescimento do país, oferecendo a
tantos milhões de brasileiros a possibilidade de investir suas
economias na bolsa.
A pulverização dos ativos e também da origem dos investidores
representa um salto quântico no grau de maturidade e
atratividade do nosso mercado. É fundamental que sejamos
capazes de dar ao mercado e aos brasileiros uma oportunidade
de crescimento e ganho proporcional à dimensão continental de
nosso território e da nossa economia.
Este será o definitivo passo na consolidação brasileira como
uma economia sólida e absolutamente relevante no contexto
desenvolvimentista e de sustentação do modelo integrado
macroeconômico global. Não é mais uma questão de “se”, é
uma questão de “quando” ... esperamos que logo!
Adeodato Netto é COO Head de Fusões e Aquisições da
OPP Brasil. Especialista em Mercado Privado de Capitais
pela DePaul University em Chicago, IL e M.Sc. em Finanças
Corporativas pela University of Liverpool. AVN@OPPBRASIL.COM
19. 19
Atualmente, no Brasil, mais pessoas abrem negócios por vislumbrarem uma oportunidade do que pela necessidade de obtenção de
renda.
Segundo relatório divulgado pela Global Entrepreneurship Monitor em julho de 2014 sobre a atividade empreendedora no Brasil, em
2013, 71,3% dos “empreendedores iniciais” foram motivados a abrir um negócio próprio porque identificaram uma oportunidade,
mesmo com uma possibilidade alternativa de geração de renda. Quando comparado com o ano de 2002, esse percentual era apenas
de 42,4%.
Evolução da Oportunidade como % dos Empreendimentos Iniciais
42,4
Embora as pessoas tenham passado a empreender pela
visualização de oportunidades, e não mais por necessidade,
em 98,8% dos empreendimentos iniciais ninguém considera o
produto como novo. Em relação à existência da tecnologia, em
99,5% desses empreendimentos a tecnologia existe há mais
de 5 anos. A inovação relacionada a esses empreendimentos é
extremamente baixa.
Em comparação a outros países em desenvolvimento,
o Brasil mantém uma posição relativamente inferior de
inovação em empreendimentos iniciais. Na China, 16,6% dos
empreendimentos iniciais apresentam produtos que são novos
para todos. Já na Índia, esse mesmo indicador é de 17%. As
tecnologias com menos de um ano nos empreendimentos
iniciais representam 5,7% na China e 23,1% na Índia.
Joseph Schumpeter, em sua teoria do desenvolvimento
econômico, afirma que a economia se desenvolve somente
a partir de inovações. Não se considera, nessa teoria, que o
desenvolvimento seja gerado por fatores exógenos como
guerras, mudanças de políticas econômicas, sociais ou
comerciais ou até mesmo o próprio crescimento da economia
pela expansão da população ou da riqueza. São as inovações o
motor do desenvolvimento econômico.
Segundo Schumpeter, as inovações ocorrem quando:
(1) há a introdução de um novo produto no mercado que os
consumidores não conheçam;
(2) ocorre a utilização de um novo método de produção;
(3) há a exploração de um novo mercado;
(4) uma nova fonte de matéria-prima ou de bens semi-manufaturados
passa a ser explorado; e
(5) a criação de nova ou a quebra dessa estrutura de mercado
(monopólio, oligopólio, etc.).
BRASIL OUTLOOK 2015
O responsável por realizar essas mudanças é o empreendedor e
sua principal característica - a de introduzir inovações - o difere
dos demais homens e mulheres de negócios.
Ao analisar os dados mencionados acima percebe-se que
,embora as empresa criadas recentemente tenham surgido
pelo vislumbre de uma oportunidade, poucos são os negócios
que foram fundados por empreendedores, segundo o conceito
de Schumpeter. As empresas criadas não estão contribuindo
para o desenvolvimento econômico, mas apenas contribuindo
para o crescimento da economia. Obviamente deve-se levar em
consideração outros aspectos sociais do desenvolvimento como
saúde, educação e segurança, mas no contexto econômico
de Schumpeter, as novas empresas estão muito aquém da
contribuição para a criação de desenvolvimento. Vale ressaltar
que as inovações contribuem diretamente para a geração
de vantagens competitivas que podem, inclusive, auxiliar no
processo de introdução de novos produtos em outros países.
Ambiente econômico ou políticas de fomento à criação de
empresas que tenham condições de introduzir inovações ou,
ainda, educação que desenvolva mais pessoas com criatividade
para gerar inovações são questões que podem ser trabalhadas
para melhorar a capacidade do país para criação de inovações.
Setores como educação, infraestrutura e um trabalho mais
eficiente quanto à formulação e execução de políticas
econômicas e fiscais, entre outros fatores, podem ser a base
inicial de trabalho para fomentar a inovação.
Marcus Vinicius Tsukuda é Gerente de MA e Novos Negócios
na OPP Brasil. Administrador e Economista. Marcus liderou
equipes de alta performance em inovação e especializou-se em
desenvolvimento de negócios e planejamento. MVT@OPPBRASIL.COM
80
60
40
20
0
2002
53,3 52,3 52,3 50,9
56,1
66,7
60,0
67,3 67,5 69,2 71,3
2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Fonte: GEM Brasil 2013
20. 20
Real EState
A construção de um novo
Brasil precisa de iniciativa
privada.
Por RODRIGO CORRÊA DE BARROS
21. 21
O mercado brasileiro de incorporações imobiliárias se elevou a
um novo patamar na última década. Nas metrópoles, em quase
toda esquina onde antes havia uma casa simples ou antiga
agora surgem lojas destinadas à farmácias, brand stores e
pequenos condomínios de sobrados. O investidor descobriu que
fragmentar investimentos é uma alternativa que independe do
seu poder de fogo.
Terrenos com vocação para edificações verticais adensadas,
localizados em regiões centrais de cidades como Belo Horizonte,
Rio de Janeiro, Porto Alegre, Curitiba e São Paulo se tornaram
raros e os negócios envolvendo tais propriedades não param,
não importa o nível da euforia desse segmento. Terrenos bons
nas grandes cidades estão lastreados em ouro.
O interior dos estados de São Paulo, Paraná, Rio Grande do
Sul e Rio de Janeiro foi redescoberto pelos empreendedores
varejistas que, em busca da diversificação e da expansão dos
negócios em cidades médias e com alta renda per capita,
investem na execução de shoppings e stripmalls. Seus primos
em primeiro grau, os verdadeiros outlets, já fazem ensaios nas
rodovias de Santa Catarina.
A região Norte aponta para o caminho da urbanização e
infraestrutura urbana, necessárias em uma região que tem
sido o centro das atenções dos governos recentes e cujo
desenvolvimento ajudará a manter equilibrado o centro de
custos da nação.
No Nordeste a teoria de que construir uma pousada ou resort
cinco estrelas perto das areias paradisíacas pode se converter
em sucesso imobiliário foi comprovada desde que os números
projetados em 1994 para o crescimento do turismo internacional
no estado se superam ano após ano. Há sentido na teoria de
que a rota mais curta para a Europa é também a mais atraente.
E há marinas, estaleiros, shoppings, presídios, hospitais,
centros médicos, escolas, lofts, cemitérios, condomínios
logísticos, condomínios off shore, portos, bairros inteiros... Cada
novo negócio aberto em nosso país obrigatoriamente sofre a
intervenção direta da construção civil. Do jovem médico que
inicia consultório em sala alugada ao industrial que implanta a
manufatura, a construção tem operado a mudança física do país
e sua presença no ambiente de negócios encontra espaço para
se multiplicar inúmeras vezes.
O cenário econômico interno, no entanto, cria obstáculos para o
desenvolvimento de projetos de envergadura nesse segmento.
No entanto, ao mesmo tempo em que as oportunidades
brotam, fomentadas pela necessidade de se empreender, o
desempenho das construtoras e incorporadoras é ameaçado
pelo peso excessivo dos tributos e pelos equívocos de uma
política trabalhista paternalista, getulista e ultrapassada.
O horizonte revela que no próximo quinquênio o Brasil será
obrigado a assumir uma postura corporativa pós-moderna. Se
desejar prosseguir no jogo do comércio mundial, o investimento
em capital tecnológico construtivo nos conduzirá à inevitável
revolução da infraestrutura.
Há de se ponderar que a ideia de ser o celeiro do mundo parece
tentadora, mas ela corrompe o desenvolvimento tecnológico,
corrói a matriz industrial e causa impactos profundos na
construção civil. O Estado, entulhado de atribuições, não terá
outra escolha senão ajustar sua política de desenvolvimento
para se debruçar sobre a produção.
Muito mais do que um segmento que assegura a geração de
empregos em escala, a construção civil mantém, em moto
contínuo, uma área da economia capaz de incorporar, caso
preciso, os desafios do crescimento da infraestrutura do Estado.
Embora travado e economicamente cambaleante, o Brasil oferta
oportunidades futuras sólidas e em todos os níveis do segmento
produtivo. A próxima década nos reserva um quadro desafiador,
propenso a premiar a engenharia como liderança na fabricação
de novas riquezas.
Para os governos que vierem está claro que a trilha para o
desenvolvimento está intimamente ligada aos processos de
construção. Estradas, ferrovias, portos, aeroportos, centros de
controle logísticos, quartéis, hidrelétricas, sítios eólicos, escolas,
universidades e até cidades inteiras. O Brasil irá descobrir na
engenharia e na arquitetura um raro potencial para fomentar
projetos fundamentais. Costuma-se dizer que em nosso país há
tudo por fazer, e de fato, a remodelação nacional precisa estar
amparada em bases que suportem o futuro.
A ponte para esse momento começa a ser desenhada agora,
enquanto estamos por definir quais serão os limites que
podemos ampliar nesse segmento. A indústria da construção
civil serve tanto à construção de uma unidade do projeto Minha
Casa Minha Vida, quanto pode definir uma nova Itaipu e esse
espectro tão amplo revela que todo investimento futuro nessa
área, seja formando profissionais, seja executando obras de
relevância, serão reverenciados pelas próximas gerações.
Rodrigo Corrêa de Barros é publicitário e planejador
do mercado imobiliário, diretor da Cross Marketing.
RODRIGO@EQUIPECROSS.COM.BR
BRASIL OUTLOOK 2015
22. 22
Talento x Custo
Como Gerir este conflito
no mercado altamente
competitivo.
Por Eliane Trinca
Teoricamente uma definição simples para uma situação que
representa um dos aspectos mais complexos dentro das
organizações modernas. O talento é tratado como uma aptidão
natural, limitando o entendimento e confundindo sua definição
com a de competência.
Dentro do escopo da área de Recursos Humanos, uma das
maiores responsabilidades é identificar talentos e desenvolver
competências, sendo esta uma das ações estratégicas esperadas
no mundo corporativo. O altíssimo grau de competitividade dos
mais diversos setores, somados a movimentos intermináveis,
tanto de processos de terceirização ou a redução de custos,
TALENTO
CUSTO
Substantivo masculino que significa aptidão invulgar, natural ou
adquirida.
Medida monetária dos sacrifícios financeiros que uma
organização deve fazer para alcançar seus objetivos
vêm naturalmente transformando a tarefa dos gestores de RH
em uma árdua tarefa. Na mais pura definição de economia, ela é
a ciência que permite administrar necessidades ilimitadas com
recursos escassos. Outsourcing, downsizing, headcount... são
palavras e ações capazes de confundir a cabeça de qualquer
empresário ou gestor de organizações.
Como fato, o processo empírico demonstra que quanto maior a
capacidade de uma empresa de engajar seus funcionários na busca
de seus reais objetivos, tanto maior será sua relação de transparência
com as pessoas. Assim, maior será a doação de todos na busca por
superar metas gerando resultados e retorno para todos.
23. 23
BRASIL OUTLOOK 2015
Como realizar investimentos reais nas pessoas, sendo
estratégico e respeitando as diretrizes corporativas de controle
de custos? Efetivamente estamos diante de um dos maiores
desafios de Recursos Humanos.
Enganam-se aqueles que entendem que quantidade e
qualidade estão amarradas quando a questão é a administração
dos recursos humanos. Uma empresa pode tranquilamente
terceirizar serviços, reduzir seu quadro, aumentando
sensivelmente seus compromissos com todos aqueles que
dedicam seus esforços diariamente para que a empresa
alcance seus objetivos.
Times menores tendem a ser mais comprometidos. A dispersão
das tarefas, a obscuridade de planos de carreira confusos e a
incapacidade de perceber real valor em seu trabalho e posição
são fatores determinantes para o processo de insatisfação
e, por consequência, acréscimo dos índices de rotatividade
(turnover) nas organizações.
Adicionalmente e, segundo a pesquisa realizada pelo Manpower
Group, 77% das empresas nas Américas apontam algum grau
de deficiência na formação dos profissionais. Interessante
como, ainda que uma parcela absolutamente substancial do
mercado reconheça que a falta de condições nos mais diversos
aspectos do capital humano impactam diretamente em suas
operações, muito poucas são aquelas realmente dispostas a
investir seriamente no desenvolvimento, formação e retenção
de profissionais.
Razões da dificuldade para encontrar talentos
AMÉRICAS
Qualificação
formal
Candidatos
Habilidades
técnicas
Experiência
21%
23%
24%
32%
0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35%
t 77% das respostas apontam deficiência na formação dos
profissionais, podendo ser técnica, formal ou de experiência.
t 23% das respostas aponta a falta de candidatos disponíveis.
Empresários ou gestores de corporações deveriam observar
de maneira recorrente uma das mais perenes teorias da
administração, a Hierarquia das Necessidades, de Abraham
Maslow. Filho de judeus nascido nos Estados Unidos em 1908,
ele revolucionou a maneira com que a psicologia organizacional
tratava a relação interpessoal. Com uma forma diferente de
perceber e analisar as necessidades humanas, daquelas trazidas
por Freud ou pelo “Behaviorismo” ou Teoria Comportamental de
Watson oportunizou reflexões novas sobre práticas vigentes.
Maslow ilustrou sua teoria com a chamada pirâmide. Com uma
abordagem absolutamente objetiva, criou uma figura que era
capaz de tangibilizar estágios da vida de cada uma das pessoas
e que eram, por consequência, naturalmente correlacionáveis à
vida dentro das organizações.
Necessidades de Auto Realização
Necessidades de Auto Estima
Necessidades Sociais
Necessidade de Segurança
Necessidades Fisiológicas
Fundamental é ser capaz de suportar as equipes internas a
partir da percepção e análise dos diferentes estágios de cada
uma das pessoas, transportando e respeitando seus momentos
de vida com consequência do desenvolvimento pessoal. A
identificação do estágio dessas vidas, seguindo o racional da
pirâmide de Maslow, traria às organizações a clara condição
de um melhor engajamento e consequentes condições de
aperfeiçoar o gerenciamento de projetos de desenvolvimento
de talentos e competências.
A multidisciplinaridade obriga os profissionais de Recursos
Humanos a transpor as barreiras naturais da subjetividade
representada pela complexidade das relações humanas e
unir-se a modelos de observação e medição pragmáticos e
cartesianos. É fato inequívoco que não conseguimos medir
aquilo que não controlamos.
O resultado disso tudo é a obrigatoriedade de alinhamento
entre as áreas de gestão estratégica, financeira e de
recursos humanos. Esses três pilares são absolutamente
e necessáriamente interdependentes. O equilíbrio entre as
mesmas é condição mandatória para obtenção e manutenção
de uma linha bem sucedida de performance no mercado tão
competitivo quanto o atual.
Indo mais além, e aproximando-se do mercado de capitais, seja
ele público ou privado, é cada vez mais clara a receptividade
dos agentes financeiros às companhias que têm práticas
efetivamente responsáveis e sustentáveis nas suas relações
pessoais e sociais.
Recursos Humanos definitivamente não é mais uma área na
qual conjecturam-se movimentos de indução. O capital humano
não pode mais limitar-se às sugestões de direcionamento. Esse
recurso inestimável nas organizações deve necessariamente
ser conduzido na mesma direção de toda a cadeia que cerca a
empresa e seus chamados “Stakeholders”.
No mercado globalizado do século XXI a diferença entre a
crise, o desenvolvimento, o fracasso ou o sucesso, certamente
pode estar na capacidade de cada companhia de engajar
seus profissionais, desenvolvendo talentos, aprimorando as
competências e aprendendo a fazer além do que seria suficiente.
E fundamental a percepção de que esforços ordinários jamais
serão geradores de resultados extraordinários.
Eliane Trinca é Diretora de RH e Responsabilidade Social da
Volvo Cars do Brasil. É graduada em Psicologia e Pós-Graduada
em Administração de empresas e gestão de pessoas. Tem
especialização em Gestão do Conhecimento. Combina os
skills de responsabilidade social, desenvolvimento e retenção
de talentos. Reconhecida por sua capacidade de extrair
grandes performances das equipes, integrando o respeito
individual com os objetivos corporativos.
24. 24
O novo relato
corporativo
integrando informações
financeiras e não-financeiras
para gerar valor.
Por Fabiane Goldstein
A função de elaboração de relatórios é uma atividade intrínseca
ao capitalismo. Os participantes do mercado precisam de
informação para suas tomadas de decisão. Mas as críticas à
forma como os relatórios financeiros têm desempenhado sua
função de informação tem se tornado cada vez mais frequentes,
e se intensificaram nos últimos 20 anos.
Com a economia cada vez mais baseada em conhecimento
e informação, e menos em máquinas e propriedades físicas,
muitos dos ativos de uma empresa hoje não são capturados
no balanço. A crescente base de ativos intangíveis que não
são medidos no balanço é citada como uma das falhas dos
relatórios financeiros em exercer sua função de informação.
Isso pode ser verificado pela análise do valor de mercado das
empresas que compõem o Índice SP 500 nos últimos 35 anos:
seu valor de mercado desviou-se muito do seu valor contábil, e
isso está diretamente ligado aos valores intangíveis.
25. 25
BRASIL OUTLOOK 2015
83% 68% 32% 20% 20%
Mas a questão dos intangíveis começou a ser discutida bem
antes disso. Acredita-se que o termo Responsabilidade Social
Empresarial (RSE), ou Corporate Social Responsibility (CSR)
foi cunhado pela primeira vez em 1953, com a publicação do
livro “Social Responsibilities of the Businessman“ de Howard R.
Bowen , que fez a pergunta “Quais responsabilidades perante
a sociedade os empresários devem assumir, de maneira
razoável?”. Mais de 60 anos depois, será que já temos uma
resposta ampla e correta para essa pergunta? Os relatórios
não financeiros, ou de dados ESG (Environmental, Social
Governance, ou Ambiental, Social e Governança) podem ser
considerados uma dessas respostas.
Os primeiros exercícios de relatórios não financeiros – os
chamados Balanços Sociais - se deram na década de 60, nos
EUA e na Europa. A época foi marcada pela guerra do Vietnã, que
incitou o repúdio da população e deu início a um movimento de
boicote à aquisição de produtos e ações de algumas empresas
diretamente ligadas ao conflito. Naquele momento a sociedade
passou a exigir uma nova postura ética das empresas e, como
resultado, diversas delas passaram a prestar contas de suas
ações e objetivos sociais.
Ao mesmo tempo, a preocupação com o meio-ambiente
também entrava na agenda das nações, justamente após um
período de grande crescimento e estabelecimento de grandes
corporações. Os Estados Unidos foram o primeiro país a
perceber a necessidade e urgência da intervenção do poder
público sobre as questões ambientais. Em 1969 formalizaram
o instrumento de Avaliação dos Impactos Ambientais (AIA) e
lançaram a National Environmental Policy Act (NEPA). Em 1970,
estabeleceram a Agência de Proteção Ambiental dos Estados
Unidos, encarregada de proteger a saúde humana e o meio
ambiente: ar, água e terra.
Ao longo dos anos 70 e 80, a discussão acadêmica do conceito
de RSE cresceu, mas a primeira empresa reconhecida por
realmente publicar um relatório social foi a Ben Jerry’s, em
1989, e a primeira grande corporação foi a Shell, quase dez
anos depois, em 1998. (1)
Outras iniciativas relevantes a serem citadas como referência
são o Pacto Global da ONU (UN Global Compact) e o CDP –
Carbon Disclosure Project, ambos lançados no ano 2000,
voltados ao envolvimento do mundo corporativo nas questões
relevantes de responsabilidade corporativa e direitos humanos
e da emissão de gases de efeito estufa.
Número de relatório registrados na GRI que
abordam Sustentabilidade - Brasil
Atualmente, já são milhares de empresas ao redor do mundo,
sejam elas públicas, privadas, de grande ou de médio porte, que
emitem relatórios de sustentabilidade. Enquanto os relatórios
financeiros são moldados por normas de contabilidade e
auditoria, os relatórios de sustentabilidade seguem normas
voluntárias, como as criadas pela GRI – Global Reporting
Initiative e pelo SASB – Sustainability Accounting Standards
Board, e mais recentemente, pelo IIRC - International Integrated
Reporting Council, responsável pelo Modelo do Relato Integrado.
Existe uma visão de que os relatórios financeiros são voltados
para investidores, enquanto os relatórios de sustentabilidade
são voltados para todos os stakeholders, incluindo funcionários,
clientes, fornecedores, mídia, comunidades locais e ONGs. Mas
essa parece estar deixando de ser uma verdade absoluta.
(1) http://www.mallenbaker.net/csr/nl/51.html
100%
80%
60%
40%
20%
0%
17%
32%
68%
80% 80%
1975 1985 1995
Ativos Tangíveis
Ativos Intangíveis
2005 2010
Valor de mercado das empresas que compõem o SP 500
Fonte: Ocean Torno
250
200
150
100
50
0
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Fonte: GRI - Global Reporting Initiative
26. 26
Nota-se, recentemente, um número crescente de investidores
interessados em informações sobre sustentabilidade na forma
de dados ESG. Esse interesse é impulsionado por alguns
investidores por motivos éticos ou morais; para outros, por
motivos economicos, uma vez que esses dados podem aprimorar
o perfil de risco-retorno de uma carteira. Seja qual for a razão, o
investidor está interessado em dados, e fato é que os balanços,
na forma como são divulgados hoje, não fornecem informações
sobre o desempenho ambiental, social e de governança.
Embora os relatórios de sustentabilidade visem preencher
essa lacuna, os críticos destacam que eles o fazem de forma
incompleta. Os dados que estão incluídos em um relatório de
sustentabilidade freqüentemente não são auditados e, mesmo
quando o são, o processo de asseguração ainda não se equipara
ao de uma auditoria. Uma das principais razões para isso é que não
existem normas de medição e relatórios rigorosos semelhantes
ao existentes para relatórios financeiros. Organizações como a
GRI e o SASB já estão trabalhando para mudar isso, assim como
as grandes empresas de auditoria. Mas ainda há resistência, por
parte das empresas, em contratar esse serviço.
O maior questionamento dos investidores tem sido de que
a informação contida nos relatórios de sustentabilidade
raramente é apresentada no contexto do modelo de negócios
e da estratégia de uma organização, fato esse que torna
difícil a compreensão de como o desempenho ESG relaciona-se
com o desempenho financeiro e como as questões de
sustentabilidade afetam o processo de criação de valor de
uma organização. Felizmente, os investidores já compreendem
que esses dados precisam ser monitorados, e que existe uma
relação risco-retorno envolvida. A tendência de maior pressão
de operadores de mercado para que as empresas divulguem
essas informações de maneira clara, transparente e totalmente
integrada ao modelo de negócios só tende a crescer. Fundos
de pensão de todo o mundo já têm incluído o assunto em
seus manuais de Governança Corporativa, e têm incentivado
fortemente suas investidas a se posicionarem favoravelmente
à publicação de relatórios de sustentabilidade. Podemos citar
TIAA-CREF nos Estados Unidos, e PREVI aqui no Brasil como
exemplos nessa linha.
Pensamento e comunicação integrada para mudar o descasamento que há hoje
entre o relatado e o real
Conteúdo dos relatórios Geradores de valor do negócio
Temas estratégicos
Planos e objetivos
Performance passada
Estratégia de governança
Capacidade de implementação
das metas e objetivos
Operações
Nessa linha, o movimento do Relato Integrado IR tem crescido globalmente, e nos parece uma tendência que precisa ser
acompanhada com bastante cuidado pelas organizações. A visão de longo prazo das organizações participantes do IIRC é um mundo
em que o pensamento integrado (integrated thinking) é incorporado dentro da prática das empresas dos setores público e privado,
facilitado pelo Relato Integrado como orientador de relatórios corporativos. O objetivo é alcançar o ciclo de pensar, gerir e relatar
de maneira integrada, resultando na alocação de capital eficiente e produtiva e, assim, agindo para a estabilidade financeira e a
sustentabilidade do negócio.
PENSAMENTO INTEGRADO
A consideração proativa por parte da
companhia das relações entre vários
capitais que a organização usa ou afeta.
O pensamento integrado leva à tomada de
decisões e ações que contemplem a criação
de valor a curto, médio e longo prazo.
REPORTE INTEGRADO
Um processo fundado no pensamento
integrado, que resulta em um reporte
integrado periódico por uma organização
sobre a criação de valor ao longo do tempo,
linkado com as comunicações relacionadas
relativas aos diversos aspectos de criação
de valor.
RELATO INTEGRADO
Uma comunicação concisa sobre como
a estratégia, governança, desempenho
e perspectivas de uma organização, no
contexto de seu ambiente externo, levam
à criação de valor no curto, médio e longo
prazo.
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O RI é necessário para empresas e investidores. As empresas
precisam de um ambiente de elaboração de relatórios que seja
propício para a compreensão e articulação de sua estratégia, o
que ajuda a impulsionar o desempenho internamente e atrair
capital financeiro. Os investidores precisam entender como a
estratégia que está sendo perseguida cria valor ao longo do
tempo. Na visão do IIRC, essa é a evolução do processo de
elaboração de relatórios corporativos.
No modelo do IR divulgado globalmente em dezembro de
2013(2), a empresa deve organizar seu modelo de negócios
baseando-se nos Seis Capitais (Financeiro, Manufaturado,
Intelectual, Humano, Social de Relacionamento, Natural).
A motivação é uma melhor compreensão do modelo de
negócios da companhia e dos capitais relevantes – como
eles são transformados ao longo do processo de operação da
companhia, tendo como características básicas a concisão e a
conectividade.
INTEGRATED REPORTING IR
Comunicação concisa sobre geração de valor
Reporte
Financeiro
Outros
reportes
Estratégia,
governança,
desempenho
Países como África do Sul e Austrália já estão tornando o RI
obrigatório, dentro do modelo Relate ou Explique. No Reino
Unido, berço do IIRC, essa é uma forte tendência. O Japão é
outro importante signatário – o Relato Integrado faz parte do
Abenomics (nova estratégia de política monetária, fiscal e de
crescimento econômico para incentivar o crescimento do país).
Mais de 100 empresas no mundo todo fizeram parte do Projeto
Piloto, que se encerrou agora em setembro de 2014, 12 delas
brasileiras.
Cada vez mais, os líderes empresariais estão compreendendo
que o sucesso e a rentabilidade sustentável dos negócios
são fortemente dependentes da manutenção de uma boa
reputação corporativa, o que inclui a compreensão dos riscos de
reputação estratégica, incluindo riscos ESG. Para estarem bem
posicionadas nessa área, as empresas devem adotar medidas
robustas para construir resiliência organizacional, tanto em sua
próprias operações como em sua cadeia de negócios.
Impacto sobre os fornecedores de capital financeiro
Aqueles que publicaram pelo menos um relatório constataram
que a comunicação integrada ajuda a construir relacionamentos
mais fortes e melhor entendimento pelos provedores de capital
financeiro.
56%
87%
Relataram um benefício
positivo nas relações com
investidores institucionais
Acreditam que fornecedores de
capital financeiro entenderam
melhor a estratégia da
organização
52%
79%
Relataram um benefício
positivo nas relações com
analistas
Acreditam que fornecedores
de capital financeiro têm
mais confiança na viabilidade
a longo prazo do modelo de
negócio
Organizações que já produziram um relatório integrado
Verificaram um benefício
para seu conselho de melhor
compreensão de como a
organização criar valor. 79%
Fizeram de moderadas a
significativas mudanças na
estratégia e alocação de
recursos. 67%
Experimentaram de moderadas
a significativas mudanças na
forma de pensar sobre o seu
modelo de negócio 64%
Fabiane Goldstein é sócia-fundadora da Ricca RI. Publicitária com MBA em Administração, especialista em Mercado de Capitais,
entrega sua multidisciplinaridade à criação de um modelo diferenciado de gerenciamento das relações de companhias com
stakeholders, projetos, processos e relatórios de sustentabilidade. FABIANE.GOLD@RICCARI.COM.BR
(2) http://www.theiirc.org/international-ir-framework/
28. Reunimos um time de especialistas para oferecer ao mercado, parceiros e stakeholders uma visão multisetorial e dinâmica da
realidade e das perspectivas para o Brasil em 2015.
A intenção é aproveitar o momento de um nível de discussões sem precedentes sobre os mais diversos aspectos do futuro nacional
em função das eleições majoritárias e colaborar com estatística e opinião.
Destacamos uma equipe de pesquisa para definir os temas a serem abordados a partir das mais relevantes questões levantadas por
executivos e empresários de diversas partes do país e de diferentes indústrias.
Agradecemos o apoio da Volvo Cars do Brasil, por reconhecer o valor do conhecimento e da aproximação da marca com o mercado,
fundamentada mais uma vez pelo alto grau de humanização de suas ações.
As equipes da OPP Brasil, Ricca RI e Cross Marketing, trabalharam extremamente focadas na elaboração de um material que agregue
valor a todos aqueles que buscarem no Brasil Outlook uma fonte adicional de informação e opinião.
Especial agradecimento à jornalista Thais Heredia, colunista do G1 e da GloboNews pela dedicação e crença na qualidade da equipe
e relevância da iniciativa.
Esperamos ter contribuído para sua percepção do contexto nacional e nos orgulhamos de dividir um olhar que mescla a tecnicidade
da realidade com a motivação e o otimismo daqueles que acreditam no país.
Muito obrigado
Equipe Brasil Outlook
São Paulo, outubro de 2014.
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