REVISTA DE BIOLOGIA E CIÊNCIAS DA TERRA ISSN 1519-5228 - Artigo_Bioterra_V24_...
Processo de refino do óleo de polpa de macaúba
1. 1
PROCESSO DE REFINO DO ÓLEO DE POLPA DE MACAÚBA: PROPRIEDADES DE 1 IDENTIDADE E QUALIDADE 2 3
ÂNGELA ALVES NUNES1; SIMONE PALMA FAVARO2; SIMONE MENDONÇA2 4
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INTRODUÇÃO 6
A demanda por óleos vegetais é crescente, alavancada, sobretudo, pelo consumo no 7 mercado de alimentos. A principal fonte de óleo vegetal atualmente é a palma de óleo, a qual 8 fornece em torno de 33% do total consumido no mundo (USDA, 2012). Outras fontes oleaginosas, 9 que conciliem altos rendimentos e características nutricionais e industriais desejáveis, tem sido 10 objeto de investigação. Dentre as alternativas para produção de óleo, a macaúba (Acrocomia 11 aculeata (Jacq) Lood. ex Mart.) tem sido considerada uma espécie com grande potencial para 12 exploração racional (PIRES et al, 2013). Os frutos desta palmeira podem produzir quantidades de 13 óleo similares à palma de óleo, o que significa dez vezes mais óleo que a soja por área (ROSCOE et 14 al, 2007). 15
Embora haja o consumo de óleos brutos, como azeite de oliva e azeite de dendê, a maior 16 parte da produção é destinada ao refino, para atender às especificações requeridas pelo mercado 17 consumidor e órgãos regulamentadores. O processo de refino se dá em várias etapas que visam 18 eliminar, completamente ou parcialmente estas substâncias que afetam a cor, estabilidade, aroma e 19 sabor dos óleos. Usualmente são realizadas em sequência: degomagem, neutralização, 20 branqueamento e desodorização (GUNSTONE et al, 1994). 21
No Brasil a regulamentação e fiscalização dos óleos vegetais refinados de soja, algodão, 22 milho, canola e girassol, destinados ao consumo humano, esta a cargo do Ministério da Agricultura 23 Pecuária e Abastecimento (MAPA, 2006). Não existe regulamentação para óleo de polpa de 24 macaúba até o momento. Portanto, os padrões de identidade e qualidade deverão ser estabelecidos à 25 medida que ocorra a disponibilização deste produto em larga escala no mercado. Desta forma, 26 objetivou-se extrair, caracterizar, refinar em escala de bancada e avaliar o óleo de polpa de 27 macaúba, considerando os padrões de qualidade e identidade estabelecidos para outras fontes de 28 óleo. 29
MATERIAL E MÉTODOS 30
Coleta dos frutos, despolpamento e extração lipídica 31
Frutos maduros de macaúba foram coletados diretamente do cacho no município de 32 Dourados, estado de Mato Grosso do Sul, região centro oeste do Brasil, no mês de dezembro de 33 2011. Os frutos foram selecionados, secos em secador por convecção a 80 ºC ± 10 ºC por 7 horas e 34 despolpados realizado em equipamento piloto desenvolvido para frutos de macaúba com 35 1Universidade Católica Dom Bosco – email: nunysnutri@yahoo.com.br
2 Embrapa Agroenergia – emails: simone.favaro@embrapa.br; simone.mendonça@embrapa.br
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mecanismo de martelos. O óleo foi extraído em prensa tipo Expeller (Marca Ecirtec, modelo MPE-36 40), seguido à centrifugação a 3900 rpm/10 min, obtendo-se óleo bruto. Para o seu armazenamento 37 fez-se borbulhamento com N
2, acondicionado em vidro âmbar e mantido a -20 ºC. 38
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Processo de refino do óleo bruto 40
A partir do óleo bruto efetuaram-se as etapas de refino (degomagem, neutralização, 41 branqueamento e desodorização) estabelecidas em condições de laboratório. A primeira etapa 42 constituiu-se na degomagem do óleo por meio da adição de água destilada na proporção (1:2) 43 água:óleo. A neutralização dos ácidos graxos livres foi por meio da adição de solução aquosa de 44 hidróxido de sódio equivalente a 6 ºBaumé. O branqueamento foi realizado com tratamento de 10% 45 terra ativada (Marca Oil:dri, modelo Supreme Pro-Active) (m/m). O processo para a desodorização 46 do óleo branqueado foi arraste a vapor sob vácuo. Obtendo-se, desta maneira, o óleo refinado da 47 polpa de macaúba. As amostras do óleo bruto e das etapas do refino foram caracterizadas conforme 48 metodologias da (AOCS, 2004). Teor de ácidos graxos livres em ácido oleico, índice de peróxidos, 49 umidade do óleo por titulação em Karl Fischer, índice de refração determinado com refratômetro de 50 ABBÉ termostatizado a 20 ºC, absortividade molar avaliada a 232 nm e 270 nm, realizada em 51 espectrofotômetro (Marca Aquamate, modelo v. 4,55), utilizando isoctano grau UV/HPLC (Tedia), 52 índice de saponificação, matéria insaponificável. 53
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RESULTADOS E DISCUSSÃO 55
As características observadas no óleo bruto indicam que o processo para sua obtenção foi 56 bem sucedido, ressaltando-se a baixa acidez e ausência de peróxidos (Tabela 1). Tanto o óleo bruto, 57 degomado e neutralizado atenderam a regulamentação de acordo com os padrões estabelecidos para 58 esta classe de produto pela Legislação Brasileira (ANVISA, 1999). Para o óleo desodorizado 59 (refinado) a acidez reduziu para 0,14% (Tabela 1), este valor está acima do limite de 0,1% 60 estabelecido para os óleos comestíveis padronizados pelo MAPA. No entanto, está abaixo do limite 61 máximo fixado em 0,3% para os óleos refinados de oliva (MAPA, 2012) e palma (ANVISA, 1999). 62 O índice de peróxidos para o óleo refinado da polpa de macaúba apresentou-se inferior aos limites 63 estabelecidos para óleos refinados. 64
A regulamentação existente para absortividade é para o azeite de oliva virgem extra 65 (MAPA, 2012), tomando o azeite de oliva apenas como comparativo, o óleo bruto da polpa de 66 macaúba e as respectivas etapas de refino apresentou valor de absortividade a 232 nm abaixo do 67 permitido pela legislação brasileira (Tabela 1). O óleo bruto da polpa de macaúba apresentou 68 absortividade a 270 nm acima do 0,22, máximo permitido para o azeite de oliva virgem extra 69 (Tabela 1). Entretanto, durante as etapas do refino estes compostos foram parcialmente removidos, 70 1Universidade Católica Dom Bosco – email: nunysnutri@yahoo.com.br
2 Embrapa Agroenergia – emails: simone.favaro@embrapa.br; simone.mendonça@embrapa.br
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reduzindo para 0,35 (Tabela 1). Este valor está abaixo da absortividade a 270 nm de 1,1, fixada para 71 azeite de oliva refinado (MAPA, 2012). A umidade do óleo bruto e do refinado ficou dentro do 72 limite estabelecido pela legislação. (Tabela 1). 73
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Tabela 1. Parâmetros de qualidade do óleo bruto da polpa de macaúba e das etapas do processo do 75 refino. 76
Etapas do refino
Índice de
Acidez
(% acido oleico)
Índice de
Peróxidos
(meqO2/kg)
Absortividade molar
Umidade
(%)
232 nm
270 nm
Óleo bruto
1,06a±0,011
0,00e±0,00
2,04NS±0,05
0,56a±0,02
0,14b±0,01
Degomagem
0,77b±0,05
4,62b±0,10
2,09NS ±0,07
0,46bc±0,05
0,25a±0,03
Neutralização
0,11ed±0,06
5,60a±0,10
2,09NS ±0,11
0,45c±0,04
0,14b±0,02
Branqueamento
0,20c±0,04
1,04d±0,14
1,90NS ±0,13
0,33e±0,02
0,08d±0,01
Desodorização
0,14d±0,05
1,94c±0,07
1,92NS ±0,12
0,35de±0,03
0,09cd±0,01
Leg. óleo bruto2
≤ 5,0
≤ 10,0
ND
ND
≤ 0,2
Leg. óleo Ref.3
≤ 0,1
≤ 2,5
ND
ND
≤ 0,1
Leg. AOVE4
≤ 0,8
≤ 20,0
≤ 2,50
≤ 0,22
≤ 0,2
1média±desvio padrão. Letras diferentes na coluna diferem entre si pelo teste de Tukey (P<0,05). 2Legislação óleo 77 bruto (ANVISA, 1999). 3Legislação óleo refinado. Valor adaptado da legislação (MAPA, 2006). Valor originalmente 78 dado em mgKOH/g. 4Legislação do azeite de oliva (MAPA, 2012). NS – não significativo. ND – não determinado. 79
80
Não foram observadas diferenças com o processo de refino para o índice de refração do 81 óleo de macaúba (Tabela 2), indicando que não ocorreram alterações profundas nas características 82 de qualidade. Os valores para matéria insaponificável no óleo bruto de macaúba e os óleos obtidos 83 nas etapas do refino, apresentaram valores dentro do recomendado para óleos refinados (Tabela 2). 84
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Tabela 2. Parâmetros de identidade do óleo bruto da polpa de macaúba e das etapas do processo de 86 refino. 87
Etapas do refino
Índice de Saponificação
mg KOH/g
Índice Refração
a 20 °C
Matéria
Insaponificável
g/100 g
Óleo bruto
197,05NS±2,24
1,4665NS±0,01
0,76ab±0,06
Degomado
204,56NS±6,83
1,4667NS±0,0
0,79a±0,06
Neutralizado
201,66NS±8,67
1,4667NS±0,0
0,70bc±0,05
Branqueado
205,40NS±8,90
1,4667NS±0,0
0,77ab±0,03
Desodorizado (OR)
204,15NS±7,81
1,4667NS±0,0
0,69c±0,03
1médias±desvio padrão. Letras diferentes na coluna diferem entre si pelo teste de Tukey (P<0,05). NS - não 88 significativo. (OR) – óleo refinado. 89
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92 1Universidade Católica Dom Bosco – email: nunysnutri@yahoo.com.br
2 Embrapa Agroenergia – emails: simone.favaro@embrapa.br; simone.mendonça@embrapa.br
4. 4
CONCLUSÕES 93
O sistema de colheita, pós-colheita, secagem e extração mecânica resultaram em óleo bruto 94 com alta qualidade. O protocolo de refino em escala de bancada, aplicado ao óleo bruto da polpa de 95 macaúba foi eficiente na obtenção com características adequadas aos padrões estabelecidos para 96 outras fontes oleaginosas. Os tratamentos realizados em cada uma das etapas do refino do óleo 97 bruto da polpa de macaúba foram eficientes em não favorecer reações de hidrólise. Ocorreram 98 reações de oxidação durante o refino, mas o processo, ao final, foi eficiente para manter o nível de 99 peróxidos dentro do estabelecido pela legislação. O óleo refinado apresentou características 100 desejáveis, conforme a legislação determina para óleos vegetais refinados, podendo ser uma nova 101 fonte de óleo para o consumo humano. 102
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AGRADECIMENTOS 104
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela bolsa de 105 estudo concedida e pelo suporte financeiro por meio do programa Procad/NF 2008 – projeto 109. A 106 empresa Petrobras S. A, pela bolsa de estudo concedida. Ao Sr. Ernest Ferter, pela disponibilização 107 da área da fazenda Paraíso, para coleta e secagem dos frutos. A empresa Biocom S. A. pelo auxílio 108 dos recursos financeiros. 109
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REFERÊNCIAS 111
ANVISA. (1999). Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. 112 Resolução nº 482, de 23 de Setembro de 1999. Regulamento técnico para fixação de identidade e 113 qualidade de óleos e gorduras vegetais. Disponível em: http://www/anvisa.gov.br. 114
AOCS. (2004). Official methods and recommended practices of the American Oil 115 Chemists’ Society. (4 th ed.). USA: Champaign. 116
GUNSTONE, F. D., HARWOOD, J. L., & PADLEY, F. B. (1994). The Lipid Handbook, 117 2nd edn., Chapman & Hall, London. 118
MAPA. (2006). Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Instrução 119 identidade e qualidade de óleos vegetais refinados. Publicado no Diário Oficial da União de 120 26/12/2006, Seção 1, 140p. Disponível em:http://www.azeiteonline.com.br/wp-121 content/uploads/2011/04/anvisa-instrucao-normativa-49-de-22-12-2006-oleos-vegetais.pdf. 122
MAPA. (2012). Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. “Instrução 123 Normativa Nº 1, de 30 de janeiro de 2012″ – “Regulamento técnico do azeite de oliva e do óleo de 124 bagaço de oliva”. Disponível em: http://www.azeiteonline.com.br/wp-125 content/uploads/2012/02/instru%c3%87%c3%83o-normativa-n%c2%ba-1-de-30-de-janeiro-de-126 2012_mapa.pdf. 127
PIRES, T. P., SOUZA, E. D. S., KUKI, K. N., & MOTOIKE, S. Y. (2013). 128 Ecophysiological traitsofthemacaw palm: A contribution towards the domestication of a novel oil 129 crop. Industrial Crops and Products, 44, 200-210. 130
USDA. (2012). United States Department of Agriculture. Disponível em: 131 http://www.pecad.fas.usda.gov/ogamaps/default.cfm?cmdty=Oilseed&attribute=Production. Acesso 132 em: agosto de 2012. 133 1Universidade Católica Dom Bosco – email: nunysnutri@yahoo.com.br
2 Embrapa Agroenergia – emails: simone.favaro@embrapa.br; simone.mendonça@embrapa.br