O documento discute o potencial do turismo equestre no Brasil. Apesar de ser uma atividade em crescimento, o turismo equestre ainda é subaproveitado no país. Para se desenvolver de forma sustentável, é necessário melhorar a infraestrutura, a capacitação de guias, e respeitar normas de segurança. Novos negócios poderiam ser gerados para apoiar o turismo equestre se houvesse mais investimento e regulamentação.
Turismo equestre: potencial e desafios para o Brasil
1. Por um turismo Equestre forte e sustentável
Dados atuais (2010) do World Travel & Tourism Rural, que compreende diversas atividades, conforme
Council apontam o turismo no Brasil ocupando a 13ª apresentado na Figura 2. Uma dessas subdivisões, o
posição no ranking dos maiores PIBs do setor do turis- Turismo Rural, apresenta características particulares
mo no mundo. No entanto, em termos relativos, com- que a distinguem de outras atividades turísticas. Há
parando o quanto representa o turismo no PIB total do um intenso contato com a natureza, com atividades
país, o Brasil ocupa posição mais modesta, a 143ª posi- realizadas ao ar livre. Em geral, os empreendimentos
Roberto Arruda de
Souza Lima ção, sendo que só na América Latina, 14 países estão à turísticos rurais surgiram de adaptações de estruturas
Engenheiro agrônomo, nossa frente. Observa-se que apesar de nosso grande que já existiam nas propriedades rurais, o que impli-
Doutor em potencial e vocação, o turismo é uma atividade ainda cou, mesmo para os empreendimentos mais recentes,
Economia Aplicada,
pouco explorada. É verdade que a entrada de turistas no estreito contato com os proprietários e acomoda-
Prof. da ESALQ/USP ,
Pesquisador do CEPEA estrangeiros aumentou significativamente nos últimos ções (hospedagem e restaurantes) de pequeno porte,
raslima@esalq.usp.br anos (Figura 1), atingindo um volume de cerca de 5 preservando a aptidão de cada propriedade e a riqueza
milhões turistas. Em 2009, o Banco Central registrou a do patrimônio cultural.
entrada de U$ 5,3 bilhões de dólares por meio dos gas- A cavalgada destaca-se entre as atividades do Tu-
tos desses turistas estrangeiros no Brasil. Mas muito rismo no Espaço Rural, de acordo com levantamento
ainda pode ser feito. realizado pela OMT (Organização Mundial do Turis-
Um dos segmentos que tem apresentado cresci- mo) na América Latina (Figura 3). A cavalgada é um
mento nas últimas décadas é o Turismo no Espaço passeio a cavalo, ao longo de um trajeto pré-estabele-
cido. Este passeio pode levar algumas horas, dias ou
até semanas, atravessando grandes extensões de ter-
6.000.000
ra e parando para um descanso de forma rústica em um
5.000.000 estilo de acampamento. O sub-aproveitamento do tu-
4.000.000 rismo rural, em especial o equestre, fica evidenciado
3.000.000 quando se observa que, somente na França, a Associ-
2.000.000 ação Nacional de Turismo Eqüestre conta com mais de
1.000.000
200 mil associados. No chamado Turismo Equestre,
FONTE: MINISTÉRIO DO TURISMO
no qual o Brasil tem dado seus primeiros galopes, mais
0
1970
1972
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2000
2002
2004
2006
2008
de 50 paises atuam firmemente, dentre os quais cinco
países da América do Sul organizam cavalgadas de
Figura 1: Brasil - evolução do número de turistas estrangeiros forma profissional. No Brasil, somente em novembro
ingressantes anualmente no país, 1970 a 2008 de 2004 entrou em operação a primeira operadora tu-
rística especializada em cavalgadas. Até então o Bra-
sil, ao contrário de Argentina, Chile e Uruguai, não
constava nos roteiros equestres das agências interna-
cionais. O Estudo do Agronegócio do Cavalo, da CNA
e CEPEA/ESALQ, estima que em 2006 existiam 100 mil
usuários das atividades de cavalgadas, utilizando cer-
ca 500 empreendimentos, a maior parte sem a estrutura
adequada. Os turistas rurais em suas atividades relaci-
onadas ao cavalo, proporcionavam, na época, R$ 21
Fonte: Roque (2001)
milhões de movimentação econômica e 1.500 postos
de trabalho no segmento.
Figura 2: Modalidades das atividades de turismo no espaço rural É interessante observar como a caracterização des-
sa atividade apresentada recentemente pela Turismo
de Portugal (a entidade similar à EMBRATUR do Go-
verno de Portugal), no Congresso Internacional de Tu-
rismo Equestre em 2008, são perfeitamente válidos para
o Brasil de hoje, como se pode verificar nas observa-
ções a seguir:
• O Turisno Equestre registra uma tendência de cresci-
mento;
• Atrai turistas de praticamente todos os grupos etári-
os;
• A exemplo do golfe, é um produto off-season, com
Fonte: Santo (2004)
procura durante todo o ano, podendo funcionar como
Figura 3: América Latina - atividades mais requisitadas
um complemento muito importante na oferta de outras
pelos turistas em espaço rural
opções turísticas;
2. • Capta um tipo de turista que estabelece dos. Em todos eles, há amplo campo para política. É importante destacar que o Turis-
uma relação particular com a natureza, pelo atuação de veterinários e outros profissio- mo Equestre enquadra-se no Turismo de
que está sensibilizado para desenvolver nais especializados, de modo a assegurar o Aventura – definido como aquele que “com-
uma postura ambientalmente responsável; desenvolvimento sustentável desta moda- preende os movimentos turísticos decorren-
• É um segmento em que a demanda pode lidade turística. Estudo elaborado para o tes da prática de atividades de aventura de
derivar para outros tipos de atividades (não SEBRAE Paraná pela Diferencial (2006) apon- caráter recreativo e não competitivo” (Mi-
eqüestres), relacionadas com o patrimônio tou importantes novos negócios gerados nistério do Turismo, 2008) – e, como tal,
cultural e paisagístico dos destinos, o que pelo Turismo Equestre: apresenta riscos controláveis. Desta forma,
permite articular o turismo equestre com - Curso de Instrução de Guias de Montaria é essencial ocorra o respeito às normas da
outros tipos de produtos turísticos. - Empresa de Guias de Montaria ABNT; tanto com referência à habilidade do
Para o bom desempenho do Turismo - Profissionais da Área Clínica Veterinária turista ao cavalgar (quadro 2) quanto em rela-
Equestre no Brasil há necessidade de am- - Comércio de Equipamentos para Montaria ção à classificação do percurso (quadro 3).
pliação na disponibilidade e acesso à infor- - Pousada Rural para Turismo Equestre O futuro do Turismo Equestre no Brasil
mação, facilidade de acesso, preços e ambi- - Restaurante voltado para o Turista Eques- é muito promissor, mas para que se traduza
entes agradáveis aos turistas. Para tanto, tre em realidade, em geração de renda e empre-
convém relembrar algumas observações de A Organização Mundial do Turismo, go, é importante que haja forte comprometi-
Hofstee (2008), apresentadas no Quadro 1. conforme destacado por Lombello Jr (2007), mento e seriedade de todos interessados,
Para aproveitar os pontos fortes e opor- ressalta que o desenvolvimento do turismo não só com o respeito às normas e demais
tunidades existentes no Turismo Equestre, sustentável só é possível se houver sus- aspectos anteriormente citados. É necessá-
diversos novos negócios deverão ser gera- tentabilidade econômica, social, cultural e rio ir mais além, com forte engajamento polí-
tico, seja para que efetivamente haja uma
política de sanidade animal (com dotação
Quadro 1: Pontos Fortes e Fracos, Ameaças e Oportunidades ao Turismo Equestre
orçamentária e execução efetiva de despe-
Pontos Fortes e Oportunidades Pontos Fracos e Ameaças sas compatível com a dimensão da equino-
cultura nacional) e debate técnico com au-
• Os benefícios de saúde • A falta de acesso à escolas de equitação
• Incrementa o turismo internacional e interno • Concorrência de outras formas de lazer
toridades para que sejam removidos obstá-
• Aumento da renda para as zonas rurais • Acesso nem sempre fácil às culos desnecessários ao desenvolvimento
• Baixa barreira de entrada fazendo propriedades rurais da atividade. Neste sentido, é urgente a ade-
equitação acessível a um maior setor • Percepção de que equitação requer quação e modernização de normas, como
da sociedade grandes orçamentos e despesas
• Maior conhecimento da realidade das • Ocorrências de problemas sanitários.
no caso da legislação fiscal tributária da pres-
áreas rurais tação de serviços em propriedades rurais e
• Eleva as ligações sociais (capital social) no uso de Parques Nacionais para roteiros
regionais e locais de cavalgadas. A proibição no Brasil des-
• Turismo responsável é cada vez mais
importante
toa, sem argumentos tecnicamente susten-
• As pessoas querem sentir-se envolvidas táveis, do que ocorre na Europa e Estados
com outras pessoas e o ambiente Unidos e outros lugares do mundo, onde o
• Bem-estar dos animais é uma preocupação Turismo Equestre ocorre normalmente em
essencial na atualidade.
Parques Nacionais.
Quadro 2: Habilidades do cliente de turismo equestre ao cavalgar Quadro 3: Referência de classificação de percursos
Classificação Características Grau de severidade do meio 1 ) Pouco severo
2 ) Moderadamente severo
Principiante Cliente com limitada ou nenhuma experiência, ainda não capaz de manter 3 ) Severo
o cavalo no andamento escolhido e que apresenta acentuado estresse 4 ) Bastante severo
decorrente de medo e ansiedade.
5 ) Muito severo
Iniciado Cliente capaz de montar e desmontar sem assistência, capaz de se manter
com pouco ou nenhum estresse durante a atividade, com bom controle Orientação no percurso 1 ) Caminhos e cruzamentos bem
sobre o cavalo, familiarizado com arreios e a amarração do animal ao parar, definidos
com capacidade para mantê-lo na marcha e no trote, apto a experimentar 2 ) Caminho ou sinalização que indica
e se manter em equilíbrio no galope curto ou controlado. a continuidade
3 ) Exige a identificação de acidentes
Mediano Cliente com controle em todos os andamentos, inclusive marcha rápida, geográficos e de pontos cardeais
trote e galope curto ou controlado, completamente familiarizado com o 4 ) Exige navegação fora do traçado
arreamento e com noções sobre embocaduras, capaz de abrir porteiras 5 ) Exige navegação para utilizar
sem que seja necessário desmontar, confiante e firme no assento em trajetos alternativos e não
situações de algum estresse, mas que não cavalga com regularidade.
conhecidos previamente
Mediano forte Cliente mediano que cavalga com regularidade, em qualquer terreno,
FONTE: ABNT NBR 15507-2 (2008)
FONTE: ABNT NBR 15507-1 (2008)
sentindo-se confortável na sela por longos períodos (várias horas) durante Grau técnico do percurso 1) Percursos com piso regular
o percurso. 2) Percursos com piso irregular
3) Percursos com obstáculos
Avançado Cliente com independência na condução, maior sensibilidade ao manejar 4) Percursos com transposição de
as rédeas, capacidade de cavalgar animal fogoso em campo aberto ou em cursos ou espelhos d’água
áreas com obstáculos de maior complexidade. 5) Percursos com superfície lisa